O Brasil voltou a ser sacudido por mais um episódio que mistura tragédia sanitária, desorganização institucional e sensação coletiva de insegurança. O surto de intoxicações por bebidas adulteradas com metanol coloca o país diante de um problema gravíssimo de saúde pública e, ao mesmo tempo, expõe o impacto econômico sobre dois setores estratégicos: o de bebidas e o de bares e restaurantes, que já convivem com margens apertadas e instabilidade regulatória.
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O metanol é um veneno silencioso, impossível de ser identificado a olho nu em bebidas adulteradas. Isso transforma o episódio em algo ainda mais dramático: não existe prevenção real para o consumidor comum. A única alternativa é confiar nas autoridades, que, como de praxe, anunciam força-tarefas, gabinetes de crise e protocolos de emergência. Mas, na prática, o que se percebe é mais teatralidade do que eficácia.
Até o começo da tarde desta sexta-feira, o Ministério da Saúde tinha confirmado 60 notificações e 11 casos de intoxicação em São Paulo, além de uma morte já comprovada. O dado é suficiente para justificar o alerta, mas, ao mesmo tempo, a resposta institucional soa improvisada, com medidas que não garantem o controle da origem do problema. O envio de antídotos aos hospitais e a aceleração de exames toxicológicos são paliativos. A raiz do crime segue intocada: a produção clandestina de bebidas.
Campinas, por meio da Secretaria de Saúde, emitiu alerta às unidades e reforçou a articulação com o Ciatox da Unicamp, que recebeu doses do antídoto. Até agora, não há registros locais de casos suspeitos, mas o clima de apreensão é inevitável. Para bares, restaurantes e distribuidores sérios, o efeito imediato é a desconfiança generalizada. O medo de beber fora de casa afeta o consumo e gera um prejuízo incalculável para o setor de serviços.
Talvez o ponto mais simbólico seja outro: a naturalização do escândalo. A sociedade brasileira parece viver em estado permanente de sobressaltos. Hoje é o metanol; ontem foi o leite com soda cáustica; antes, as pílulas de farinha. A cada crise, mobiliza-se uma estrutura emergencial, mas sem mudança sistêmica. E o ciclo se repete, sempre acompanhado da sensação de que logo surgirá mais um caso surreal para ocupar as manchetes.
A tragédia do metanol vai muito além de intoxicações pontuais. Ela revela o quanto o Estado brasileiro atua sempre reativo, nunca preventivo. Pior, aceita o enraizamento de organizações criminosas. Enquanto as instituições insistem em respostas de curto prazo e improvisadas, a criminalidade se adapta e ganha cada vez mais fôlego. No meio, ficam os consumidores, desprotegidos, e empresários honestos, penalizados pela desconfiança do público.
O episódio é, em essência, um retrato de como o Brasil convive com o caos: se não é um apagão energético, é uma fraude no transporte; se não é corrupção em licitações, é bebida envenenada nas prateleiras. E, como sempre, a certeza de que o próximo absurdo já está a caminho.
No deserto

Reprodução
A situação da vereadora Mariana Conti (PSOL), de Campinas, ganhou um novo capítulo após sua detenção pelas forças de Israel junto a outros ativistas da Global Sumud Flotilla, que tentava levar ajuda humanitária à Faixa de Gaza.
Segundo a assessoria da parlamentar e o grupo jurídico que acompanha a missão, os integrantes da flotilha foram levados para uma prisão no deserto de Neguev. A informação foi confirmada também por um vídeo do ministro da Defesa de Israel, no qual reconhece que os detidos estão encarcerados na região para serem posteriormente deportados.
A defesa aponta ainda que houve dificuldades no acesso dos advogados aos ativistas, que têm direito a atendimento legal. A denúncia se soma às críticas internacionais à ação israelense de interceptação das embarcações em águas internacionais, classificada pelos organizadores como uma violação dos direitos humanos.
Conti foi detida ao lado de outros parlamentares, ativistas e integrantes de organizações internacionais que compõem a flotilha. O grupo partiu da Espanha com medicamentos e mantimentos destinados à população de Gaza.
- Flávio Paradella é jornalista, radialista e podcaster. Sua coluna é publicada no Portal Sampi Campinas aos sábados pela manhã, com atualizações às terças e quintas-feiras. E-mail para contato com o colunista: paradella@sampi.net.br.