POLÍTICA

Flávio Paradella: A Política sobre duas rodas

Por Flávio Paradella | Especial para a Sampi Campinas
| Tempo de leitura: 4 min
Reprodução/Vini Oliveira
Protesto de mototaxistas em Campinas foi incorporado por vereadores de direita, mas legislação municipal é clara: serviço segue proibido na cidade.
Protesto de mototaxistas em Campinas foi incorporado por vereadores de direita, mas legislação municipal é clara: serviço segue proibido na cidade.

A motociata desta semana, que terminou nas escadarias do Paço Municipal, mostrou que o debate sobre o mototáxi em Campinas saiu das ruas e ganhou força no plenário. A pressão dos trabalhadores foi rapidamente incorporada por vereadores da Direita, cada qual ajustando o discurso para marcar posição num tema que, embora polêmico, rende barulho e exposição.

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Entre os mais ativos, Vini Oliveira (Cidadania) – sempre ele - se autodeclara independente e foi ao protesto, aparecendo em vídeos ao lado dos manifestantes e gritando palavras de ordem contra o prefeito Dário Saadi (Republicanos) nas escadarias do Palácio dos Jequitibás. Já os vereadores Benê Lima (PL) e Otto Alejandro (PL), ambos da base do governo, abraçaram a pauta e procuram construir espaço político a partir dela. Otto, inclusive, afirmou que vai apresentar a proposta de criação de uma Frente Parlamentar em defesa da regulamentação do motofrete e do mototáxi.

O que diz a lei

Apesar da pressão, a legislação municipal é clara: em Campinas o mototáxi foi proibido desde 2010, quando a Lei 13.927 regulamentou apenas o motofrete. Porém essa proibição, de 2010, está suspensa, por conta de uma decisão do Tribunal de Justiça, com base em uma lei de 2009. De toda forma, o poder público passou a autuar com base no Código de Trânsito Brasileiro, alegando se tratar de transporte clandestino (agradeço a correção neste ponto a um amigo extremamente bem informado e competente do jornalismo campineiro).

Há iniciativas em outras esferas tentando mudar esse cenário. O Projeto de Lei 271/2023, em tramitação no Congresso, pretende incluir a categoria A da CNH para permitir transporte de passageiros em motos. Em nível estadual, a Lei 18.156/2025 abriu caminho para que municípios regulamentem o serviço, mas o texto já foi questionado no Supremo Tribunal Federal. Ou seja, até decisão contrária, mototáxi em Campinas considera a atividade ilegal.

Sem destino

Os vereadores surfam na insatisfação de trabalhadores que reclamam de multas pesadas e alegam perseguição da Prefeitura, mas que encontram clientela por meio de aplicativos, que oferecem o serviço mesmo com a proibição. A narrativa política, portanto, se constrói em cima de um conflito que mistura a necessidade econômica da categoria e o dever do Executivo de aplicar a lei.

O recente acidente fatal na Avenida Ruy Rodrigues, que envolveu um mototaxista por aplicativo, reforça os riscos de uma atividade não regulamentada. Mas no campo político, a pauta rende discurso, holofote e espaço para de palanque.

No fim, o que se tem é mais um tema travado em instâncias superiores, mas transformado em palco local. A pressão deve continuar, a Frente Parlamentar deve manter o assunto na Câmara, mas qualquer mudança real depende de Brasília ou do STF. Até lá, prevalece a lei municipal: mototáxi continua proibido em Campinas.

A projeção de Mariana


Reprodução/Instagram

A confirmação da participação da vereadora Mariana Conti (PSOL) na Flotilha da Liberdade foi recebida em Campinas com surpresa e também com atenção ao impacto político da iniciativa. Não apenas pela missão em si — um gesto ousado de atravessar o bloqueio imposto por Israel à Faixa de Gaza — mas também pela capilaridade alcançada por Mariana na mídia nacional, com reportagens em veículos como O Globo e Folha de S. Paulo.

A vereadora já se encontra em Barcelona, de onde partirá no dia 31 de agosto o primeiro barco da expedição. O comboio, formado por ativistas de mais de 40 países, pretende chegar à região em meados de setembro com medicamentos, alimentos e água, mas sobretudo com o objetivo de chamar atenção da comunidade internacional para o bloqueio à população palestina. Em publicação, Mariana classificou a viagem como “histórica” e afirmou que a missão busca “romper o cerco ilegal de Israel contra Gaza e denunciar o genocídio em curso contra o povo palestino”.

O movimento tem apoio de entidades como a Freedom Flotilla Brasil e o Global Movement to Gaza Brasil e prevê a presença de até 15 brasileiros. De acordo com o mandato, Mariana está licenciada sem remuneração e arca pessoalmente com os custos da viagem.

Um passo além do mandato local

A viagem expõe um ponto central: Mariana Conti se tornou uma das principais apostas do PSOL em São Paulo. A sigla aponta que sua candidatura a deputada em 2026 pode ganhar força a partir dessa visibilidade. A parlamentar já vinha sendo trabalhada internamente como um nome capaz de furar a bolha regional e ampliar seu alcance, algo reforçado pela repercussão nacional dessa missão.

Ainda que haja críticas políticas e ideológicas ao engajamento em uma pauta internacional, o fato é que Mariana conseguiu furar a barreira de um tema restrito às relações exteriores e associar sua imagem a um movimento global de defesa dos direitos humanos. No plano simbólico, isso agrega capital político.

Risco e aposta

A expedição, por óbvio, é arriscada — tanto pela dificuldade de romper o bloqueio israelense quanto pela imprevisibilidade de uma ação desse porte. Mas, politicamente, já produziu efeitos: Mariana se consolida como uma figura de projeção estadual e nacional, capaz de disputar espaço com parlamentares de maior envergadura.

Na prática, a vereadora leva o nome de Campinas para uma agenda internacional e mostra que, em tempos de redes sociais, um gesto com forte carga simbólica pode catapultar carreiras políticas. O PSOL aposta nisso.

  • Flávio Paradella é jornalista, radialista e podcaster. Sua coluna é publicada no Portal Sampi Campinas aos sábados pela manhã, com atualizações às terças e quintas-feiras. E-mail para contato com o colunista: paradella@sampi.net.br.

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