O que deveria ser um debate técnico sobre transparência na aplicação de recursos públicos se transformou em um debate político e jurídico nesta terça-feira (19) de manhã, na Câmara Municipal de Bauru. A Reunião Pública convocada pelo vereador Arnaldo Ribeiro (Avante) para discutir seu Projeto de Lei que obriga entidades subvencionadas pela Prefeitura a divulgarem suas movimentações financeiras e patrimoniais no Diário Oficial e no Portal da Transparência escancarou divergências profundas entre vereadores, representantes de entidades e integrantes da Administração Municipal.
Arnaldinho Ribeiro defende a medida como um avanço no controle social. Mas encontra resistência de um representante das entidades, que classifica a iniciativa como "tímida, ineficaz ou até mesmo inconstitucional".
A resistência mais contundente foi da Associação das Entidades Assistenciais e de Promoção Social de Bauru e Região (Aeaps). Representando a entidade, Anderson Mariano leu um parecer que desqualifica a proposta, chamando-a de "inconstitucional, ilegal e inconveniente". A justificativa: o projeto extrapolaria a competência do Legislativo e imporia novas obrigações às instituições sem respaldo legal.
O contra-ataque não tardou. O vereador lembrou que a Procuradoria Jurídica da Câmara chegou a um parecer oposto. Já a vereadora Estela Almagro (PT) foi mais incisiva: disse que o texto da Aeaps "não é jurídico, é político" — deixando claro que há muito mais em jogo do que tecnicalidades legais.
PORTAL DA TRANSPARÊNCIA
Outro ponto de discórdia foi o alvo do projeto. O presidente do Ceac, Uriel de Almeida, questionou a obrigatoriedade de publicação em Diário Oficial e defendeu foco na melhoria do próprio Portal da Transparência, considerado pouco acessível e insuficiente. Ele mostrou exemplos concretos: notas fiscais sem detalhamento, ausência de fornecedores e itens adquiridos — falhas que tornam o controle social praticamente inviável.
Estela Almagro concordou com Uriel, chamando o PL de "tímido" e cobrando medidas mais profundas. Junior Rodrigues (PSD), por sua vez, alertou ainda para os riscos de descumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o que poderia expor entidades e cidadãos a inseguranças jurídicas, o que prontamente foi apontado pelo autor do PL como uma preocupação considerada na elaboração do projeto. Estela, porém, reconheceu a importância da matéria que tramita no Legislativo e do debate aberto por Arnaldinho.
ADMINISTRAÇÃO ADMITE FALHAS, MAS ADOTA CAUTELA
Os secretários municipais presentes reconheceram que o sistema atual de transparência tem brechas. O titular da Saúde, Márcio Cidade Gomes, ressaltou a necessidade de aprimoramento constante e disse que o tema não pode ser engavetado. Já a secretária de Assistência Social, Lúcia Rosim, admitiu a necessidade de ajustes, mas fez questão de lembrar que a Prefeitura segue normativas do Tribunal de Contas do Estado — um recado direto às críticas mais duras contra a gestão.
ENTRE A TRANSPARÊNCIA E A RESISTÊNCIA
O Projeto de Lei, que já foi retirado da pauta em julho a pedido do próprio Arnaldinho, volta a se cercar de incertezas. O parlamentar promete avaliar as contribuições e até convocar novos encontros, mas sai do debate com arestas a aparar: de um lado, entidades que veem na proposta uma ameaça à autonomia e aos limites legais; de outro, parlamentares e representantes da sociedade que cobram medidas mais firmes de fiscalização e o consequente aprimoramento do Projeto.
No fim, a pergunta que paira sobre o Legislativo e o Executivo bauruenses é direta: o discurso em favor da transparência se sustenta diante da pressão política e dos interesses das entidades subvencionadas, ou a proposta não passa de mais um capítulo de embate retórico que pouco mudará a realidade do controle social?