
A crise no IBGE não surgiu do nada. Desde que Márcio Pochmann assumiu a presidência do instituto, em agosto de 2023, a combinação de autoritarismo gerencial, falta de transparência e decisões controversas levou a um ambiente de insatisfação crescente entre servidores e à perda de quadros técnicos fundamentais. O cenário era previsível, dado o histórico do economista, mais conhecido por seu alinhamento ideológico do que por experiência na condução de órgãos públicos de alta complexidade. Agora, com o IBGE em turbulência e manchetes diárias escancarando a situação, o governo se vê diante de um problema que precisa resolver rapidamente para evitar danos ainda maiores à credibilidade do instituto.
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Os sinais de que a gestão de Pochmann seria conflituosa apareceram cedo. Inicialmente recebido com entusiasmo pelo sindicato dos servidores, que esperava dele uma postura de diálogo e valorização da carreira, o novo presidente do IBGE rapidamente frustrou essas expectativas. A criação sigilosa da fundação IBGE+, em julho de 2024, foi um dos estopins da crise. O órgão, que deveria ser público e transparente, surgiu como uma entidade de direito privado operando dentro do próprio IBGE, sem que os servidores fossem sequer informados sobre sua existência. A tentativa de esconder os detalhes da fundação gerou desconfiança e um choque direto com a base técnica do instituto.
Além disso, a trajetória política de Pochmann revela a influência direta de Lula em sua nomeação. Quadro de confiança do presidente, ele foi indicado — e na verdade imposto — como candidato à prefeitura de Campinas nas eleições de 2012 e 2016, sendo derrotado em ambas as ocasiões. Sua ligação estreita com Lula, que novamente impôs o nome do economista, e a falta de experiência administrativa em órgãos públicos de grande porte tornam a crise no IBGE uma consequência quase natural de sua gestão.
Se a polêmica do IBGE+ já era suficiente para criar ruídos, a decisão unilateral de acabar com o teletrabalho integral e transferir unidades do Rio de Janeiro para um local remoto apenas agravou a situação. O movimento, visto como desnecessário e punitivo, afetou diretamente a rotina de centenas de funcionários. Para piorar, em setembro, Pochmann sequer compareceu à reunião com o sindicato para tratar dessas mudanças, ampliando o desgaste.
O acirramento da crise não demorou a respingar no cenário político. A oposição ao governo Lula encontrou no caos gerado pela gestão de Pochmann uma oportunidade para questionar a confiabilidade dos dados do IBGE. Em setembro, o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL) abriu espaço para uma narrativa de que o instituto estaria manipulando estatísticas, sem apresentar qualquer fundamento probatório, mas que encontrou eco na disputa política.
O desgaste da presidência do IBGE culminou em um verdadeiro esvaziamento da sua cúpula. Entre dezembro de 2024 e janeiro de 2025, ao menos quatro diretores pediram exoneração, um movimento incomum e sintomático da insatisfação interna. Em 20 de janeiro, uma carta aberta assinada por dezenas de gerentes detalhou os problemas da gestão e tornou pública a deterioração do ambiente interno.
Diante de toda essa balbúrdia, O Ministério do Planejamento e Orçamento divulgou nesta quarta-feira que suspendeu temporariamente a iniciativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de criação da Fundação de Apoio à Inovação Científica e Tecnológica do IBGE (IBGE+).
A insistência de Pochmann em levar adiante um modelo de gestão centralizador e sem diálogo cobra seu preço. O IBGE, um dos institutos mais respeitados do país, enfrenta um momento de fragilidade institucional desnecessária, com impacto direto em sua capacidade de produzir e divulgar dados fundamentais para políticas públicas e investimentos. O Planalto, por sua vez, precisa decidir se está disposto a carregar o peso de uma crise que poderia ser resolvida com uma mudança de comando antes que o desgaste político e institucional se torne irreversível.
A carta dos servidores
Em uma Carta Aberta, servidores do IBGE manifestaram indignação com a condução do instituto sob a presidência de Márcio Pochmann, denunciando uma gestão autoritária, politizada e midiatizada que estaria colocando em risco a missão institucional do órgão. No documento, a categoria expressa solidariedade aos diretores que pediram exoneração recentemente, após divergências com a administração, e também ao sindicato da categoria, que tem sido alvo de ataques da direção.
Os servidores criticam duramente a criação da Fundação IBGE+, conduzida sem ampla discussão interna e com potenciais riscos à autonomia e à confiabilidade dos dados estatísticos e geocientíficos do país. Segundo o texto, a falta de transparência no processo gerou desconfiança entre os técnicos do instituto, que questionam o impacto da nova estrutura sobre a produção de informações públicas.
Outro ponto central da denúncia é o clima organizacional deteriorado, resultado de medidas impostas sem diálogo, como a revogação do teletrabalho e a mudança repentina de instalações para locais de difícil acesso. O sindicato e os servidores classificam essas ações como retaliação contra a categoria e alertam para os impactos na qualidade das pesquisas conduzidas pelo instituto.
A carta reforça que os servidores seguem comprometidos com a missão do IBGE e com a qualidade dos dados produzidos, negando qualquer tentativa de enfraquecer a credibilidade do órgão. No entanto, ressaltam que a crise atual é reflexo direto da postura da gestão Pochmann, que, segundo eles, ameaça o futuro da instituição ao privilegiar interesses políticos em detrimento da excelência técnica.
A mobilização dos servidores reforça a crescente insatisfação interna e amplia a pressão sobre o governo para reavaliar a permanência de Pochmann no comando do IBGE.
Ufa
Diante de todo esse cenário e de posicionamentos estapafúrdios ao longo dos anos, hoje considero que Campinas passou para um livramento com as derrotas de Pochmann em 2012 e 2016.
- Flávio Paradella é jornalista, radialista e podcaster. Sua coluna é publicada no Portal Sampi Campinas aos sábados pela manhã, com atualizações às terças e quintas-feiras. E-mail para contato com o colunista: paradella@sampi.net.br.