Na medicina ouvimos muito sobre enfermidades graves, mas que demoram a se manifestar: a tal doença silenciosa. Ela vai dominando o seu sistema, se instalando, te corroendo, até o momento do colapso repentino. Há muito tempo a pessoa carregava o problema que, mesmo com alguns sintomas de vez em quando, não se vinculava a algo tão terrível.
Pois bem, faço esse preâmbulo para relacionar com o caos que se instalou na área de urgência e emergência em Campinas. Por mais que saibamos que a área de saúde é um dos setores mais desumanos para o contribuinte, ninguém esperava um colapso com números tão assustadores.
Como deixamos que a situação chegasse a 210% de ocupação no Hospital de Clínicas da Unicamp, o primeiro a se manifestar e suspender internações? Na sequência, o Hospital da PUC faz o mesmo e informou que estava com 370% de ocupação. Aí, a própria prefeitura diz que todos os leitos dos prontos-socorros dos seus hospitais também estão lotados.
Mais uma vez, como isso aconteceu em uma das áreas mais importantes e sensíveis para a população? Como chegou a esse ponto? Vivemos um momento de epidemia de dengue e aumento expressivo nos casos de Covid, mas a instituições afirmam que o caos não tem relação com os surtos, que atrapalham, claro, mas não são a causa do problema.
É assustador analisar os números e ainda mais impactante ver e acompanhar os relatos de quem precisa do atendimento e é amontoado em macas e leitos improvisados em corredores precarizados para terem o mínimo acolhimento. Pacientes “estocados” em salas e passagens das unidades a espera de um encaminhamento. Pessoas fragilizadas pela doença e destroçadas pelo poder público obrigadas a aguardar 10, 20 ou 30 horas por serem atendidas.
Insisto, como chegou a esse ponto? Uma parte da cidade parece entorpecida ou anestesiada. O governo do médico Dário Saadi (Republicanos) anunciou esta semana com pompa e circunstância equipamentos para o aumento de cirurgias no Hospital Ouro Verde, unidade superlotada e que uma simples visita no PS mostraria a verdadeira face da saúde pública da cidade. As autoridades que gerem a área e devem conversar com outros entes do sistema falharam. Agora, buscam reuniões para definir ações e publiciza-las com objetivo de estancar o sangue.
A Câmara de Campinas perdeu duas semanas com a inútil discussão sobre homenagens a Bolsonaro e honrarias a amigos. Enquanto a saúde colapsava, os parlamentares debatiam como crianças cada um querendo impor a sua vontade. Enquanto isso, a Saúde definhava.
E o que dizer da imprensa? Temos nossa parcela de grande responsabilidade. Encastelado nas redações, o jornalismo de home-office com mensagens pelo whatsapp caminha cada vez mais para a desconexão com a vida real. Sem relações interpessoais, sem fontes e sem conhecer o tamanho das cidades e suas necessidades. O jornalista vive em bolha e em busca do engajamento, a viralização como prioridade busca assuntos simples, rasos, porém de fácil incorporação do espectador. No caso, o que era papel da imprensa só veio a público após a manifestação e atuação do HC da Unicamp. Não deveria ser assim, pois uma situação tão grave estava debaixo do nosso nariz e simplesmente não sabíamos até sermos “surpreendidos” com a hemorragia incontrolável do sistema.
No início eu falei que “ninguém esperava” o colapso. Corrijo, nós, completamente alienados do mundo real, não esperávamos. Quem vive e necessita dos serviços públicos já sabia que não era uma questão de “se”, mas de “quando” ia acontecer. É hora de reconhecermos a falha coletiva e nos comprometermos a agir de forma eficaz para evitar que essa crise se repita, mais uma vez, no futuro.
Tratamento
A reunião emergencial entre o prefeito de Campinas, Dário Saadi (Republicanos), e representantes dos hospitais e DRS (Divisão Regional de Saúde) VII resultou na definição de sete medidas para aliviar a sobrecarga nas unidades de saúde da metrópole. Dentre essas medidas, destaca-se a transferência de pacientes de baixa complexidade para suas cidades de origem. Além disso, o encontro discutiu a proposta de instalação de novos leitos de baixa e média complexidade na região.
Outra discussão importante foi a ideia de criar uma regulação regional com participação da Unicamp, visando encaminhar pacientes para hospitais da própria região, liberando assim leitos em Campinas. Também está prevista a ampliação de vagas de hemodiálise na região e a adoção da tabela SUS paulista para hospitais públicos.
Essas medidas buscam amenizar a crise na saúde enfrentada por Campinas e tentar garantir um atendimento com um mínimo de dignidade.
Nova Odessa
A Polícia Civil abriu investigação a pedido do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais para apurar uma denúncia envolvendo três servidores comissionados de Nova Odessa, que estariam cometendo o crime de usurpação de função. Segundo a denúncia, esses servidores estariam exercendo responsabilidades técnicas que são atribuídas a concursados.
A administração municipal declarou que está cooperando plenamente e vai a fornecer as informações solicitadas.
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Flávio Paradella é jornalista, radialista e podcaster. Sua coluna é publicada na Sampi Campinas aos sábados pela manhã, com atualizações às terças e quintas-feiras. E-mail para contato com o colunista: paradella@sampi.net.