HOMENAGEM

Tricô de ideias: professora fez do diálogo e reflexão seu legado

Por Priscila Medeiros | da Redação
| Tempo de leitura: 4 min
Priscila Medeiros
Salete em sua biblioteca
Salete em sua biblioteca

Prestes a completar 89 anos no próximo dia 25, Salete da Silva Alberti ainda conserva a paixão pelo conhecimento e a alegria em ensinar. Não mais em salas de aulas, mas nas conversas com qualquer pessoa que a procure, afinal "todo encontro é um grande tricô: o que sai é nosso".

Saletinha, como é conhecida, colecionou vínculos ao apostar no diálogo como método para incentivar reflexões. Arrebatou o carinho de alunos, que agora terão a chance de homenageá-la no dia 16 de dezembro, às 14h, na Unesp. Aberta ao público, a solenidade está prevista para acontecer na chamada Sala da Congregação da universidade.

Nascida em 1937, em Gália, Interior paulista, primogênita de três filhas, veio para Bauru ainda jovem com os pais, Francisco e Janet, para ficarem perto do restante da família, que já morava por aqui. A mudança, aparentemente simples, acabou definindo todo o rumo de sua vida: neste solo se descobriu professora e nunca mais deixou de ser.

A educação já fazia parte do ambiente familiar. A mãe lecionava corte e costura no Sesi; o pai, ligado à música, também contribuía com aulas quando surgiam oportunidades. Mesmo com o contato diário com esse universo, a docência não foi exatamente escolhida de imediato. "Era o que tinha para fazer", lembra. O que começou como circunstância virou paixão e daquelas que moldam uma vida inteira.

Seguindo os passos dos pais, começou sua trajetória profissional aos 18 anos dando aulas no Sesi, para crianças. Assim conseguia pagar a faculdade de história e geografia da Universidade do Sagrado Coração (USC). "Trabalhava no Sesi para poder pagar a faculdade e depois eu comecei a lecionar na USC. Dei aula no Estado, como substituta na Instituição Toledo de Ensino (ITE) e depois fui para a Universidade de Bauru, posteriormente incorporada pela Unesp", conta a doutora em sociologia pela universidade estadual.

Salete enfatiza que nunca quis um cargo de deliberação, porque a paixão é sala de aula. "Gostava e gosto de ensinar", reitera. E esse entusiasmo era e ainda é explícito. "Eu tinha uma alegria de entrar na sala de aula e isso deixava os alunos mais relaxados. Eu rejuvenescia quando passava pelo portão da Unesp. Era uma delícia. Quando eu terminava a aula, me dava uma tristeza", relata.

Também professora de antropologia, nunca perdia uma oportunidade de questionar e fazer pensar, levando também a filosofia e sociologia para a sala de aula. "A vida exige reflexão. Eu não perdia a oportunidade de fazer os alunos refletir, do primário à universidade, eu acho que isso é o fundamental. Eu não abro mão de pensar, nunca", frisa.

E isso Salete aplica em todos os campos de sua vida. Ela vive o que ensina. Curiosa e questionadora, a ponto de "encher o saco", como ela mesma cita. "Quando chegava a um ponto de reflexão e não encontrava resposta, ia atrás de alguém que me ajudaria, como o caso o Clodoaldo (Cardoso). E não saía sem a resposta, não importa o tempo que levasse", informa sorrindo.

E, assim, ela colecionou encontros, formou vínculos, despertou reflexões e ganhou o carinho dos alunos por apostar no diálogo como método. "Depois de tantos anos vivendo na eternidade da sala de aula, a cronologia reencontrou seu corpo, mas não a conteve. Porque há quem exista no tempo; há quem o atravesse; e há quem, como ela, permaneça nos outros, na vida daqueles que a encontravam pelas ruas e lugares por onde ela passava", destaca o amigo Adalberto Retto.

"Onde quer que ela vá, seja no supermercado, por exemplo, alguém vem falar com ela e dizer 'professora, a senhora mudou a minha vida'. Até brinco que se ela sair e se perder, não tem problema. Alguém vai achar e trazer. Ela tem esse reconhecimento", destaca. Questionada sobre como se sente ao ouvir isso, foi sucinta: celebração.

A paixão pelo ensino era tão intensa que a aposentadoria compulsória, exigida pela idade, foi um dos episódios mais dolorosos de sua carreira. "Eu chorava, chorava… não queria deixar", recorda. Para Adalberto, o reconhecimento e carinho dos ex-alunos a fez superar a aposentadoria.

A aposentadoria não a fez deixar os questionamentos da vida para trás e nem perder o prazer pela leitura, afinal, para ela, ler é refletir. "Se não refletir, perde tempo", afirma. Essa busca constante pelo conhecimento era a mesma que levava para a sala de aula, onde insistia para que os alunos pensassem e questionassem.

Nessa nova fase, embarcou na leitura de biografias de mulheres como Cleópatra, Frida Khalo, Clarice Lispector, entre outras. Atualmente, ela está lendo Metáfora, de Tony Berber Sardinha.

Informações sobre a homenagem podem ser obtidas pelo email: a.retto@unesp.br

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