OPINIÃO

O bom ladrão


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Padre Antônio Vieira, considerado um dos maiores oradores em língua portuguesa, em um de seus discursos -O bom ladrão- narra a seguinte história:

"Navegava Alexandre em uma poderosa armada pelo Mar Eritreu a conquistar a Índia, e como fosse trazido à sua presença um pirata que por ali andava roubando os pescadores, repreendeu-o muito Alexandre de andar em tão mau ofício; porém, ele, que não era medroso nem lerdo, respondeu assim: - Basta, senhor, que eu, porque roubo em uma barca, sou ladrão, e vós, porque roubais em uma armada, sois imperador? - Assim é. O roubar pouco é culpa, o roubar muito é grandeza; o roubar com pouco poder faz os piratas, o roubar com muito, os Alexandres.

Mas Sêneca, que sabia bem distinguir as qualidades e interpretar as significações, a uns e outros definiu com o mesmo nome: "Eodem loco pone latronem et piratam, quo regem animum latronis et piratae habentem". Se o Rei de Macedônia, ou qualquer outro, fizer o que faz o ladrão e o pirata, o ladrão, o pirata e o rei, todos têm o mesmo lugar, e merecem o mesmo nome."

Alexandre Magno viveu no século IV, Padre Antônio Vieira, no século XVII, mas o caso em questão, com toda a "evolução" da civilização, infelizmente se estende até os nossos dias.

O presidente dos EUA, Donald Trump, enviou uma armada de poderosos navios de guerra, submarinos nucleares e todo um aparato militar para o mar do Caribe, em uma manobra que sugere o preparo para uma invasão à Venezuela. O Motivo? A atuação do governo do país, liderado por Nicolás Maduro, nas operações de uma rede de narcotráfico que estaria ameaçando os Estados Unidos.

Uma acusação sem qualquer fundamento. A ONU tem um programa antidrogas, e um ex-diretor desse programa - Pino Arlachi - declarou que "A Venezuela é um dos países na região que mais colaborou na luta contra o narcotráfico." Tanto a ONU quanto a DEA (Administração de Repressão às Drogas) elaboraram relatórios sobre o crime organizado relacionado a Drogas na América do Sul, e a Venezuela sequer é mencionada e nenhum desses relatórios.

Deixando o horror de lado, soa bizarro o líder de um país que apoia o extermínio de um povo, inclusive fornecendo armas e bombas para serem jogadas sobre mulheres e crianças famintas, se dizer preocupado com a "deterioração dos direitos humanos" em um país que detém uma das maiores concentrações de recursos naturais do mundo (incluindo petróleo), ou com o "narcotráfico" em um país com uma das maiores reservas de petróleo do planeta. Vale lembrar que em 2003 houve uma manobra praticamente idêntica.

Os EUA lançaram a acusação de que o Iraque (também, entre as maiores reservas de petróleo do mundo) estava desenvolvendo "armas de destruição em massa". Mesma coisa: uma acusação sem qualquer fundamento, A invasão pelos EUA e o Reino Unido devastou o Iraque e matou mais de meio milhão de iraquianos.

Como já era sabido, nunca foi encontrado qualquer vestígio de armas de destruição em massa.. Derrubaram e indiretamente levaram à morte um ditador, mas deixaram uma terra arrasada, administrada por políticos corruptos, onde se espalhou a violência e não há mais estabilidade social ou política.

Empresas americanas e outros grupos econômicos agora administram e engrossam suas fortunas com o petróleo de lá. Sobre esses aspectos, a grande mídia se calou, como o faz agora, o que talvez explique em parte o fato de algumas pessoas acharem tudo isso uma coisa normal, como nos filmes americanos, alguns chegando ao extremo de se declararem "apaixonados" por Trump e pela política dos EUA.

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