COLUNISTA

'Encontrou-se a mísera com a misericórdia divina'

Por Dom Caetano Ferrari |
| Tempo de leitura: 4 min
Bispo Emérito de Bauru

No Evangelho da santa Missa deste quinto domingo da Quaresma - Jo 8,1-11 - Jesus encontrou-se com a mulher pecadora, a que foi surpreendida em adultério. Os mestres da lei e os fariseus lembraram a Jesus que segundo a lei de Moisés tais mulheres deveriam ser apedrejadas. E lhe perguntaram: "Que dizes Tu? Perguntavam isso para experimentar Jesus e terem motivo de O acusar". A resposta de Jesus permanece na história como antológica e paradigmática: "Quem dentre vós não tiver pecado seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra". Todos se retiraram um atrás do outro a começar pelos mais velhos, escreveu o evangelista. E Jesus perguntou à mulher: "Ninguém te condenou? Ela respondeu: Ninguém, Senhor. Então Jesus lhe disse: Eu também não te condeno. Podes ir e, de agora em diante, não peques mais". Com razão alguém, hoje, poderia questionar a lei de Moisés, essa do apedrejamento de adúlteras, chamá-la de injusta, machista. Jesus não entrou nesse mérito. Jesus poderia reconhecer que essa lei de fato não constava da lista dos Dez Mandamentos e, talvez, exagerando, justificar que Moisés a teria decretado para resolver alguma questão pontual daquele tempo. Assim como dissera em outra oportunidade que Moisés autorizou a concessão do certificado de divórcio "por causa da dureza do coração das pessoas daquele tempo", como quando falou sobre a união matrimonial noutra polêmica com seus opositores. No entanto, nesse momento, Jesus deixou evidente que ninguém escapava de ser tido como pecador. Também quanto ao adultério disse que pecam tanto a mulher quanto o homem. Por isso, Jesus disse-lhes que quem não tiver nenhum pecado, seja desse tipo ou de outro, que atire a primeira pedra. Mas todos se retiraram de cabeça baixa, com o rabo entre as pernas, na comparação feita pelo caboclo, a começar pelos marmanjos, os mais velhos. E Jesus falou à mulher adúltera: Eu também não te condeno, vá em paz, mas não peques mais. Jesus não disse que ela não pecou. Não há dúvida de que Ele deixou claro que todos somos pecadores. Se é verdade que dentre todas as criaturas o homem é a principal, nem por isso deixa de cometer pecados, pois é a única criatura que tem o livre arbítrio. E para apagar o pecado Jesus veio trazer o perdão de Deus aos arrependidos e lhes conceder uma nova oportunidade. Um paradoxo que só o cristianismo explica, porque por esse meio Deus manifesta o seu grande amor. Santo Agostinho, contemplando em êxtase esse mistério da misericórdia de Deus, assim se expressou: "Ó feliz culpa, que nos trouxe tão grande Salvador!" Da alegria do homem redimido o deus falido por seu pecado, mas salvo, e não o super-homem que diz não ter pecado, todas as demais criaturas participam. Comentando a passagem da mulher adúltera, Santo Agostinho, lembrando que Jesus, a misericórdia divina encarnada (cf. Filipenses 2,5-11), veio ao encontro da mísera adúltera pecadora para devolver-lhe a dignidade de filha de Deus perdoou-a e fez dela uma nova criatura. Jesus ensina-nos a pedir perdão, pois como aquela mulher somos todos míseros pecadores necessitados da misericórdia de Deus, mediante a qual ele sempre nos perdoa e nos concede a oportunidade de recomeçar, e, se formos misericordiosos para com os outros, seremos felizes (cf. Mt 5,7).

A primeira leitura da santa Missa é de Isaias 43,16-21 que fala de outras maravilhas para além das realizadas no passado, a travessia do mar impetuoso e a entrada na terra prometida, as novidades de vida que virão através de Jesus Cristo: "Deixai de recordar os acontecimentos do passado. Pois eu vou realizar uma coisa nova, que já está começando a aparecer: traçarei uma estrada no deserto e rios na terra árida". Na segunda leitura - Filipenses 3,8-14 - São Paulo diz que todo batizado deve conformar sua vida com a vida de Cristo. Isto exige crescer no conhecimento de Jesus Cristo, participar de seu sofrimento carregando cada um a sua cruz, esforçar-se para manter-se em forma a fim de esquecer do que fica para trás e avançar para o que está adiante, rumo à meta, para o prêmio da vocação do alto, que vem de Deus em Jesus Cristo. Assim Deus diz para nós e faz com toda a humanidade: "Não quero a morte do pecador, mas que ele se converta e viva".

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