O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) deu ganho de causa à Companhia de Habitação Popular de Bauru (Cohab) e anulou uma decisão de primeiro grau que havia rejeitado um pedido da empresa de economia mista para rediscutir acordo firmado com a construtora Sancarlo Engenharia, para quem deve pouco mais de R$ 11 milhões.
A decisão, que saiu em setembro mas só se tornou pública recentemente - o processo tramita sob segredo de Justiça -, vem no âmbito de uma ação anulatória ajuizada pela Cohab para rediscutir a negociação. A Cohab diz, entre outras coisas, que o cálculo utilizado no acordo embutiu juros moratórios num valor sobre o qual já havia incidência de juro.
A Sancarlo reagiu e afirmou à Justiça que a defesa da companhia é "falaciosa a argumentação de que a transação judicial lesa a devedora pois o sistema adotado amortiza primeiro os juros, o que afasta qualquer risco de capitalização".
Na prática, a decisão do TJ retoma o processo à estaca zero e abre caminho para que a Cohab busque anular o acordo parcial ou completamente.
A Justiça de Bauru rejeitou em janeiro deste ano o pedido e pronunciou a decadência da medida - segundo a sentença, a Cohab perdeu o prazo para contestar o acordo.
A companhia recorreu e conseguiu reverter o entendimento no TJ - em vitória para o presidente da Cohab Everson Demarchi -, que determinou a rediscussão do acordo.
Para o desembargador Sidney Romano dos Reis, relator do pedido, "é preciso ter atenção a eventual prejuízo ao erário, diante do interesse público imanente à hipótese". Segundo ele, o acordo pode ser contestado enquanto estiver vigente.
Este não deixa de ser um novo capítulo na disputa entre a Cohab e empreiteiras que deixaram de receber os valores relacionados à construção de conjuntos habitacionais.
A cobrança judicial da Sancarlo começou em 1999 e tem relação com um loteamento intermediado pela companhia bauruense de 345 residências em Marília. A companhia a princípio pagou sucessivas parcelas sem que houvesse negociação.
Depois, em 2017, formalizou um acordo com o ex-presidente da Cohab Edison Bastos Gasparini Júnior - condenado pelo desvio de R$ 54 milhões da empresa de economia mista.
A companhia afirmou que o acordo onera sobremaneira seu caixa e ressaltou que "há fortes indícios de que o motivo determinante para a homologação do acordo possuía finalidade diversa do pagamento da dívida", sugerindo uma possível ilicitude em torno da negociação.
A maior parte do acordo já foi cumprida e restam pouco mais de R$ 3 milhões a serem pagos. Segundo a Cohab, as cláusulas da negociação tornam a dívida uma espécie de débito eterno, "impossibilitando sua quitação".
"Ainda que se possa, com a devida dilação probatória, comprovar falsa a assertiva, não há como se admitir o risco de condenar a parte a manter-se eternamente em débito com o credor em razão do mero decurso de tempo desde a celebração do ajuste", sustenta o magistrado na decisão.