O pacote econômico do governo Lula, pela repercussão no mercado e nos meios políticos, foi bom para o Bolsonaro. O ex-presidente estava a ponto de pedir asilo na embaixada de algum país, para se livrar de uma factível prisão preventiva, após virem à tona diálogos entre a "rataria" golpista. Os holofotes se voltaram para o teor do decepcionante projeto de arcabouço fiscal. O escândalo da Operação Punhal Verde e Amarelo saiu de foco.
Antes mesmo do ministro da Fazenda Fernando Haddad fazer o seu pronunciamento em rede de rádio e tevê, o dólar já havia alcançado o recorde histórico de valorização desde o Plano Real iniciado em 1994, ao ultrapassar os seis reais. O ministro do Trabalho Luiz Marinho já havia se antecipado ao anúncio de Haddad e queimado a largada. Não só a moeda americana disparou como as cotações da Bolsa desabaram, atingindo, principalmente as ações dos grandes bancos.
Uma lambança. Era esperado que viesse um corte nos gastos para equilibrar as contas do país e apareceu um novo gasto. O impacto na mudança do Imposto de Renda, isentando os que ganham até R$ 5 mil, terá um impacto negativo estimado entre R$ 40 a R$ 50 bilhões. É o preço do cumprimento da promessa de campanha de Lula. Anula-se, em grande parte, a pretensão anunciada pelo governo de economizar R$ 70 bilhões com o pacote, em dois anos.
Lula tem os olhos voltados para a reeleição em 2026. Quer agradar a classe média, que preferiu o adversário na eleição passada. O Brasil, para ele, pode esperar. O problema é que o mercado tem pressa. Com o dólar nas alturas a inflação será mais pressionada do que já está. Até 2026 haverá muito choro e ranger de dentes. O povo vai sentir no bolso a majoração de preços dos alimentos, dos serviços, dos transportes, da habitação, e esquecerá os benefícios do pacote. A pressão do câmbio puxa os juros para cima. A ameaça maior estaria na estagflação, aquele fenômeno macroeconômico da diminuição da atividade empresarial com aumento das taxas de inflação.
E pensar que o Lula, estrategista, atrasou o pacote para procurar introduzir no programa uma boa notícia, capaz de amenizar o desgaste com os cortes. A criatura parida da montanha dá ao Congresso Nacional, a grande chance de consertar a série de equívocos do governo e sair-se heroicamente da missão de pôr ordem no Orçamento da República. Temos que ser otimistas. Pensar positivo. Haverá uma saída técnica e política e os deputados e senadores vão descobri-la. Tudo ficará bem, no ano que vem.
Imagine se estivéssemos, a esta altura, sob a ditadura dos kids pretos. Nos diálogos recuperados da internet entre o general de brigada Mário Fernandes e seus colegas golpistas, o militar fala "porra" 53 vezes. Material genético suficiente para povoar extensas áreas da Amazônia. "Tá na cara que houve fraude, porra. Nosso PR imbrochável já assinou a porra do decreto?". O general estava impaciente com a mania do capitão de "jogar nas quatro linhas". - "Democracia é o cacete". Seguem-se quatro caralhos e três merdas.
Se o governo Lula mistura corte de gastos com reforma sobre renda, pagará o preço de desagradar as duas pontas. Agora, dá-me arrepios pensar que hoje poderia estar dando cartas em setores sensíveis do governo um coronel que se dispôs a sequestrar de táxi o ministro Alexandre de Moraes e envenenar o Jeca e o Joca. O candidato a sequestrador teve que abortar a missão porque não havia táxi no ponto do shopping de Brasília,
O sociólogo Sérgio Buarque de Holanda, que morreu em 1982, chamava à atenção dos vários "ismos" que infelicitam este país: patrimonialismo, nepotismo, mandonismo, personalismo etc.). Acham que o Estado é uma extensão do circulo de amigos. Ou seja, o espaço público é a casa de mãe Joana. Exemplo à nação nos dá o querido e muito nosso bauru (sanduíche), "com seu lúbrico queijo derretido espraiando-se pelas bordas do pão francês", na linda imagem de Antônio Prata. "Este exemplo de solidez institucional o Brasil não tem."