COLUNISTA

Por onde vem e passa nosso cheiro?

Por |
| Tempo de leitura: 3 min
Comunicação da boca e nariz pelos ductos nasopalatinos indicados pelas setas vermelhas
Comunicação da boca e nariz pelos ductos nasopalatinos indicados pelas setas vermelhas

Paladar e olfato estão quase sempre interligados! Se chegou a pensar que o gosto era captado no palato, mas depois viram que era na língua, mas aí não dava mais para mudar o nome do palato e ficou assim mesmo. Mas o certo era a língua chamar palato!

O palato talvez se chamaria domo ou abóbada bucal, afinal é o “céu da boca”, e estas duas formas estão muito presentes nas igrejas e planetários! A boca é um verdadeiro templo de sabor e cheiros! Não dá para acreditar, mas ainda tem gente que fala “pálato”. São pessoas que calçam os “sápatos”.

Se pudéssemos captar o cheiro pelas telas, ou o sabor, se passássemos o dedo na imagem levando-o para na boca, a venda de alimentos, perfumes e sexo explodiria. Poderíamos sentir o odor corporal de artistas, os perfumes que usam, o cheiro do ambiente onde as cenas acontecem. Mudaria o mundo! E a ciência avança para isto.

Em pesquisas, pessoas foram capazes de identificar a idade pelo odor das axilas, o conhecido “cêce” ou cheiro de corpo. Uma das conclusões foi que odor dos mais novos e os de idade média, é muito mais forte, intenso e desagradável, do que o de pessoas mais velhas. Os avaliadores foram 41 pessoas entre 20 e 30 anos que cheiravam fragmentos de almofadas usadas durante a cinco noites para dormir. Pode ser que o cheiro das outras partes não permita isto, ou se permitir, talvez facilite ou dificulte as coisas!

Em 2024, Helene Loos e esquipe da Universidade Friedrich-Alexander na Alemanha, detetaram diferenças entre adolescentes (14-18 anos) e crianças pequenas (0-3 anos). Na adolescência surgem os hormônios androstenona e androstenol que são feromônios que aumentam o cheiro forte e desagradável. Eles também têm mais alguns ácidos que cheiram cera, sabão, violeta e até odores nauseantes de bodes. Já os bebês tem mais vanilina com cheiro de baunilha. As mães conseguem identificar os bebês, mas não fazem isto com adolescentes. Talvez seja para ficarem independentes.

FEROMÔNIOS

Feromônios são substâncias, voláteis ou não, liberadas por um indivíduo, e que se recebido por outro, provoca alterações no seu comportamento. Os animais usam para marcar territórios, atrair sexualmente, sinalizar perigo e transmitir outras mensagens. A partir do cheiro de corpo, parceiros identificam, a fase da fertilidade, menstruação e os filhos no bando. Os feromônios do libido masculino são chamados de “vômero-ferinas”, um nome erótico!

No septo nasal há um tubo ascendente debaixo da mucosa, que se inicia como um discreto orifício no soalho do nariz que capta e leva os feromônios para cima, contatando-os com os neurônios cerebrais nas partes sensoriais superiores. Este tubo é o Órgão Vômero-nasal de Jacobson.

Além disto, a maioria dos animais tem dois orifícios na linha média do palato, atrás dos incisivos centrais, onde capta-se os feromônios da saliva e leva-os rapidamente ao septo nasal, via dois tubos comunicantes boca-nariz. Chamam-se ductos nasopalatinos e o canal ósseo é o canal incisivo. Junto com Dr. Cássio R. R. dos Santos, da Universidade Federal em Diamantina, analisamos estes ductos em seis fetos e 36 casos de cistos nesta estrutura em adultos. O cisto nasopalatino é o mais comum nos maxilares entre os que não tem origem nos dentes.

Já detectamos 3 casos de adultos com orifícios abertos e duplos atrás dos incisivos centrais, ao lado da protuberância chamada de papila incisiva. Na grande maioria dos humanos, estes ductos não se abrem na boca. A capacidade olfatória ou gustativa aumentada não foi descrita pelos pacientes. Quem sabe seriam privilegiados e mais sensíveis, mas não aprenderam a aproveitar!

REFLEXÃO FINAL

O cheiro é essencial para a plenitude de viver, ele marca situações e fases. No livro “O Perfume”, na primeira metade, Patrick Süskind descreve o sentido do olfato de forma inigualável, uma verdadeira viagem lúdica por este sentimento tão refinado. Confesso que, ao ler pela primeira vez, foi uma viagem pelas letras, quase a sentir o cheiro no livro! 
Eu acho que fui parente de Sócrates, pois a minha vontade é sempre questionar. Gosto de repetir a sua frase mais famosa que é “posso perguntar?”. Você já organizou seus cheiros como uma biblioteca fazendo uma memória olfativa de sua trajetória de vida?

Alberto Consolaro – Professor Titular da USP e Colunista de Ciências do JC.

Comentários

Comentários