OPINIÃO

Banco Central está dividido?

Por Reinaldo Cafeo |
| Tempo de leitura: 3 min
O autor é diretor regional da Ordem dos Economistas do Brasil

Desde 2021 a diretoria e o presidente do Banco Central (Bacen) possuem mandatos distintos do mandato do presidente da República. Por força de lei, o Bacen tem autonomia e independência, apesar de seus membros ainda serem indicados pelo governo Federal.

O atual comando da autarquia tem uma mescla de indicados pelo ex-presidente Bolsonaro e pelo atual presidente Lula.

Dos nove membros da diretoria do Bacen, atualmente são quatro diretores e o atual presidente, Roberto Campos, indicados por Bolsonaro, e outros quatro diretores indicados por Lula. Em janeiro de 2025 dois diretores serão substituídos e ainda haverá a troca do presidente do Bacen. Assim, a partir de janeiro do ano que vem serão seis diretores e o presidente do Bacen indicados pelo atual governo. Em janeiro de 2026 cem por cento serão indicados pelo governo Lula.

Se fossemos analisar a questão técnica, e tão somente ela, em tese, reafirmo, em tese, não haveria com que nos preocupar, afinal, independentemente de quem indicou, a Ciência Econômica é a mesma e o compromisso do Bacen de controlar a inflação, entre outros atributos, seria inquestionável.

Contudo, há o viés político. Neste aspecto, há economistas e economistas. Há quem entenda que a política monetária (definição dos juros, por exemplo) não é eficaz no combate a inflação, há quem entenda que sim.

Na última reunião do Comitê de Política Monetária que decidiu reduzir a taxa básica em 0,25 ponto percentual (para 10,50% ao ano) ficou evidenciado que há sim algumas divergências, apesar de o colegiado concordar com vários pontos do processo inflacionário atual. Os quatro indicados por Lula queriam reduzir a taxa em 0,5 ponto percentual e os quatro indicados por Bolsonaro, em 0,25 ponto percentual. O presidente, Campos Neto, desempatou optando pela redução do 0,25 ponto percentual. A Ata do Copom atenuou em parte a desconfiança do viés "político" da leitura inicial, mas todos ficam com uma pulga atrás da orelha.

Essa desconfiança tem um motivo: reiteradas críticas as decisões do Copom por parte da equipe econômica, do vice-presidente da República, Geraldo Alckmin e principalmente do presidente Lula.

Assim como a decisão em mudar o comando da Petrobras por alguém "mais intervencionista" como foi o caso recente (sai Jean Paul Prates entra Magda Chambriard), é possível, que a partir do ano que vem, com um presidente do Bacen indicado por Lula, com seis diretores ao seu lado, haja maior interferência do governo federal nas decisões do comitê. Se isso ocorrer, toda segurança de ter um Banco Central autônomo e independente fica comprometida. A ex-presidente Dilma Rousseff do PT fez isso e o país teve dois anos de recessão.

É possível afirmar que o Bacen está dividido, mas que tal divisão, ao menos este ano, não compromete o controle inflacionário, entretanto, a partir do ano que vem, nem tanto.

Sempre é bom lembrar que eventuais deslizes do executivo federal, notadamente na questão fiscal, devem ser atenuados pela atuação técnica do Bacen, garantindo inflação baixa e controle nas oscilações da taxa de câmbio.

O Banco Central é fundamental para estabelecer o contrapeso ao peso do Estado. Não permitamos flexibilizar isso e tampouco que o político prevaleça ao técnico.

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