COLUNISTA

A hora marcada de Jesus

Por Dom Caetano Ferrari | 17/03/2024 | Tempo de leitura: 4 min

Bispo Emérito de Bauru

A hora marcada de Jesus é a sua hora decisiva. No Evangelho da Missa deste quinto domingo da Quaresma, trecho de São João 12,2-33, Jesus faz esta afirmação radical: "Chegou a hora em que o Filho do homem vai ser glorificado". João conta que, perto da Páscoa judaica, alguns gregos que tinham subido a Jerusalém, procuraram Filipe e lhe disseram que gostariam de ver Jesus. Filipe e André, nomes de raiz grega, eram da região de Betsaida da Galiléia, onde morava muita gente de origem grega. Talvez por causa dessa sua origem os dois foram falar com Jesus em nome daqueles gregos. Foi em resposta a eles que Jesus declarou ter chegado a sua hora. Usou a metáfora da semente para expressar o significado do que estava dizendo: "Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas, se morre, então, produz muito fruto. Quem se apega à sua vida perde-a; mas quem faz pouca conta de sua vida neste mundo conservá-la-á para a vida eterna". No Evangelho do domingo passado, segundo João, Jesus declara que a sua hora decisiva estaria próxima. João tomou o conteúdo dessa declaração e o transformou na ideia central do seu Evangelho: "O Filho do homem deve ser elevado na cruz e à ressurreição para que, quem O contemplar, seja salvo" (Jo 3,14s).

Na leitura de hoje, João registra que esta hora decisiva acaba de ser marcada por Jesus mesmo, e é para agora. E, ao mesmo tempo, João reforça o caráter paradoxal do desígnio de Deus pela evidência de que esta hora da exaltação de Jesus e de sua manifestação ao mundo não se dará como algo espetacular, de forma extraordinária, vindo sobre as nuvens do céu, em trono de glória, como acontecerá no fim dos tempos. Contrariamente, esta hora, que ainda não chegara e que Jesus a inaugura agora, se dará como na imagem da semente de trigo que cai na terra e morre para produzir fruto. É, portanto, uma hora dura, de sofrimento, de morte. Por isso, Jesus afirma: "Agora, sinto-me angustiado. E que direi? Pai, livra-me desta hora? Mas foi precisamente para esta hora que Eu vim. Pai, glorifica o teu Filho". João continua a dizer que, naquele momento, ouviu-se uma voz que veio do céu: "Eu o glorifiquei e o glorificarei de novo!" Muitos julgavam ser de um trovão, outros de um anjo que falou com Jesus. Jesus, porém, disse: Essa voz que ouvistes não foi por causa de mim, mas por causa de vós". Certamente neste "vós" deve se incluir também "nós". Isto é, para nos lembrar de que amar em última essência é obedecer ao Pai, fazer a vontade do Pai, e a vontade do Pai é que Cristo, como o Sumo Sacerdote da Nova Aliança, deverá entregar a sua vida para a salvação do homem. E Jesus conclui, dizendo: "É agora o julgamento deste mundo. Agora o chefe deste mundo vai ser expulso, e eu, quando for elevado da terra, atrairei todos a mim". João explicava que Jesus falava assim para indicar de que morte iria morrer. Neste ponto a Liturgia encerra a mensagem evangélica deste quinto domingo da Quaresma.

O próximo é domingo de Ramos, quando começa a Semana Santa. A hora decisiva de Jesus está marcada. É a Páscoa. Hora da revelação do amor maior de Deus, do Pai que por amor envia a este mundo o seu Filho amado, do Filho que por amor entrega a sua vida na cruz para a salvação da humanidade, do Espírito que derrama em nossos corações o dom pascal da graça e do amor divino, da ressurreição e da vida eterna. A Páscoa é esta hora em que o Filho do Homem é glorificado e se manifesta universalmente ao mundo. É o momento em que se revela ao mundo a verdadeira identidade de Jesus, o Servo Sofredor e Redentor da humanidade pecadora. Quem levantar os olhos para o Cristo morto e ressuscitado será salvo, quem dele desviar o rosto e rejeitá-Lo será condenado. Lembremo-nos que o mistério divino é paradoxal também para os discípulos, os cristãos. Estar com Jesus é estar com Ele na sua agonia. Inserido no drama humano está o mistério da cruz. Na simbologia da parábola da semente, o cristão deverá viver e morrer como o grão de trigo que cai na terra e morre para produzir fruto. Para ganhar a vida eterna, plena e feliz é preciso perder esta vida terrena, entregando-a e doando-a a Deus, o bem supremo, e aos irmãos e irmãs no serviço de construção do Reino de Deus. Quem vive para conservar a sua vida como meta última da existência humana, perdê-la-á. Quem, porém, gasta a sua vida na doação à família, aos outros, ao Reino de Deus está com Jesus e participa da sua glorificação. O Senhor, outrora, satisfez-se com a demonstração da fé de Abraão para livrar Isaac da morte. Agora, o Pai não livrará da morte o Filho unigênito. O Filho terá de ser obediente até à morte e morte na cruz. Como expressão máxima do amor, todo aquele que, como Jesus, viver e morrer amando não perderá a vida, a terá exaltada na glória da cruz e ressurreição do Filho do Homem. Uma vida que produzirá abundantes frutos de bem e de paz.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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