OPINIÃO

O mito da beleza foi longe demais

Por Zarcillo Barbosa | 27/01/2024 | Tempo de leitura: 3 min
O autor é jornalista e articulista do JC

A ditadura da beleza feminina é uma forma de controlar e domesticar as mulheres. A sentença foi dada há mais de 40 anos por Naomi Wolf, a psicoterapeuta norte-americana, autora do livro "O Mito da Beleza". Dizia Wolf que cada período histórico julga desejável um tipo de beleza, e as mulheres correm atrás.

Quem vê "As banhistas", quadro de Renoir do acervo do MASP, nota que as suas modelos eram bem rechonchudas. No surgimento do impressionismo, no século 19, a preferência era por mulheres volumosas. Hoje, as dietas de emagrecer são um tormento.

Em "Guerra dos Sexos", o sociólogo Pierre Bordieu ironizava os homens insatisfeitos com partes de seus corpos que julgam "pequenos demais", e as mulheres preocupadas com partes que julgam "demasiado grandes". Observou que a ditadura da beleza se expandiu dos corpos femininos para os masculinos, estes desejosos de adquirir "barrigas de tanquinho", às vezes para compensar a "torneirinha".

Michel Foucault, filósofo conhecido por suas ideias sobre a evolução da sexualidade, era mais radical: "Os corpos são manipulados e trabalhados para seguir interesses de poderosos".

Beleza e feiura dependem dos olhos de quem vê. A primeira Miss Brasil Martha Rocha (1954), favorita para ganhar o título mundial e beleza, ficou em segundo lugar por causa de duas polegadas a mais... nos quadris.

No BBB, o pagodeiro Rodriguinho desdenhou as formas da modelo Yasmin Brunet. Provocou discursos de ódio na mídia. Disse que a menina tinha "um rosto bonito, mas um corpo estranho". Delatou que a viu comendo dois pacotes inteiros de bolacha com requeijão. Mandaram a beleza padrão para o paredão.

Largar de comer não é como largar de beber ou de fumar. Essas garotas não podem deixar de se alimentar, como aconteceu com a Princesa Diana. Sofria de bulimia por não se sentir suficientemente magra para se encaixar nos padrões impostos pelos tabloides britânicos. Nos jantares reais, abandonava a mesa para ir ao banheiro pôr para fora o que havia comido. O então marido, hoje rei Charles, não se conformava com o "desperdício". - Vomitar caviar beluga importado da Sibéria a 26 mil euros o quilo!

A atriz global Paolla Oliveira, foi alvo de crítica por não ter um corpo magro. Coitada, confessou no Fantástico que desde a sua adolescência trava batalhas com dietas e tentativas de emagrecer. Não pode ter rugas, flacidez, unha curtas, cílios ralos ou sorriso natural. Os dentes têm que ser branquíssimos. Beiços são preenchidos com silicone para ficarem com aquele biquinho sensual.

Sem perder a elegância, Carlos Drummond de Andrade contou que deu de frente, na Rua do Ouvidor, com uma "aurora boreal" encarnada em mulher. Quem começou a partir para o jogo bruto foi Vinicius de Morais com sua "Receita de Mulher" (1959).

Exigia saboneteiras, cintura semovente, seios com expressão greco-romana e só uma hipótese de barriguinha. E cruel, sentenciou: "As muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental".

A psicóloga Susie Orbach ("Ser gorda é uma questão feminista"), prega que a luta das mulheres modernas deve ser contra a homogeneidade do que representaria o belo, ditada pela indústria de venda de corpos ideais. Essa indústria da beleza se alimenta da insegurança que as pessoas têm com os seus corpos. As redes sociais e os influencers são apenas resultado desse movimento.

A oferta de discursos que envolvem dieta, cirurgias plásticas, moda, alimentos, exercícios físicos, é camuflada pela justificativa da saúde, quando na verdade dão causas a doenças.

Montagem e desmontagem de corpos por meio de cirurgias, chegam a ser criminosos. Relação doente com a comida, é uma forma de loucura. A pressão da mídia para as pessoas se sentirem insatisfeitas com a própria aparência é, no mínimo, um desserviço.

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