OPINIÃO

Não se perca de vista

Por Claudia Zogheib | 05/01/2024 | Tempo de leitura: 2 min

A autora é psicóloga clínica pela USC, psicanalista, especialista pela USP

Num ano que já acabou e foi tão conturbado, seguimos otimistas desejantes que este ano seja melhor.

Para muitos as demandas não conseguiram se cumprir, e no balanço interno sempre difícil de escapar, nos deparamos com metas não cumpridas e desejos que ficaram frustrados: é o nosso superego cheio de listas exigentes e que se perde as vezes por não considerar o quão valoroso pode ser o inesperado, o imprevisto, o espaço das perdas.

Além de ter que conviver com tantas exigências internas, lidar com o sucesso e o fracasso diz muito de quem somos, e se colocar no planejamento dos nossos desejos e de onde queremos estar diz muito do quanto nos respeitamos e olhamos para nossa saúde mental.

Fazemos listas, trabalhamos, corremos, e para iniciar a próxima agenda desconsideramos ou não nos levamos tão a sério a ponto de considerar quem vai estar conosco, ou seja, nós mesmos.

Nas festas de fim do ano me lembro com saudade de uma querida amiga bem mais velha que tive por muitos anos e que nos visitávamos sempre (ano todo). Perto do fim do ano quando ela ainda dirigia, vinha à minha casa me trazer algo, as vezes um panettone como desculpa para demonstrar sua amizade, enfim, longas conversas, muitos aprendizados e trocas, difícil de traduzir em palavras o que experimentamos, amizade pura e sincera que vale ouro.

Das muitas conversas que tivemos sempre tocávamos em assuntos como pensar nos mais necessitados, não se perder de vista e tantas confidencias que tivemos numa amizade que foi ela quem mais contribuiu porque era uma pessoa imensa internamente falando, que soube aproveitar as oportunidades da vida para pinçar o essencial, que viveu intensamente as verdades que acreditava.

Pensando em nossa amizade refleti sobre uma página do meu diário onde escrevo depois de um destes ricos encontros com ela: "...para sabermos de nós mesmos importa que não nos percamos de vista e que possamos ao menos conjecturar onde queremos estar, deixando espaço para aquilo que nem sabemos de nós mesmos, nos levando em conta quando as coisas ainda podem ser e acontecer".

Minha amiga se foi a alguns anos, mas em meu coração existe um lugar para ela, e muitas vezes me pego dando risada quando penso o que ela diria de alguns fatos meus e do mundo com está.

Quando alguém se vai, a primeira coisa que passa na mente é o quão tristes ficamos pela dor da separação, enfim...

Mas se a pessoa viveu intensamente, olhou para dentro de si, se deu importância e viveu coisas profundas e intensas, penso que não temos o direito de ficarmos tristes porque quando penso nela, reconheço o quanto dela ficou em mim e em todos que tiveram o privilégio de sua amizade, afinal, o amor distribuído nunca morre.

Portanto, meu único desejo para este ano é que eu não me perca de vista, e que vocês também não se percam de vista, porque todo o resto, sempre pode ficar para depois. A saúde mental agradece!

Feliz 2024!

Música "La Vie e rose", com Louis Armstrong.

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1 COMENTÁRIOS

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  • Rosângela Tavares
    13/01/2024
    Q lindo texto , parabéns Cláudia . Eu estava lendo e me vendo ma mesma situação, de quando encontrava uma velha amiga ,nossas conversas enfim , texto me remeteu há um tempo incrível da minha vida . Q possamos ter outros e outros textos maravilhosos da Claudia .