OPINIÃO

Decisão do STF põe em xeque o jornalismo

Por Zarcillo Barbosa | 09/12/2023 | Tempo de leitura: 3 min

O autor é jornalista e articulista do JC

O Brasil ocupa o 111º lugar no ranking Mundial da Liberdade de Imprensa, elaborado pela ong Repórteres Sem Fronteira, que observa 180 países.

A posição é vergonhosa e vem piorando a cada ano, não só por cerceamentos praticados nos tribunais, como também pela violência inibitória praticada contra jornalistas por pessoas sensíveis a críticas e verdades.

A Constituição de 1988 reconhece a liberdade de imprensa como base para todo Estado Democrático. Garante que jornalistas possam investigar e publicar livremente, possibilitando o acesso do povo à informação. Através do livre exercício profissional dos comunicadores, as pessoas exercem seu direito de ser informado e participar da cidadania com consciência sobre a realidade pública.

Dispõe, textualmente a CF, no seu artigo 220, que "A lei não pode estabelecer qualquer embaraço à plena liberdade de informação jornalística". Estranha-se que todo um aparato de defesa do direito de informar e de ser informado tenha sido varrido para o lixo da história, pelo Supremo Tribunal Federal. Defende-se, na Corte, a tese sobre a responsabilização de veículos jornalísticos por falas de entrevistados. Prende-se o carteiro, e não o remetente.

A decisão do Supremo foi tomada depois do caso em que o Diário de Pernambuco foi condenado a pagar indenização por ter publicado entrevista com uma acusação falsa sobre um militante político na ditadura militar.

É possível presumir que outra regra de direito tenha sido atropelada pelos ministros do STF - o princípio da transcendência. Dispõe a Constituição, que nenhuma pena passará da pessoa do apenado para terceiros. Se o entrevistado calunia, e é condenado, no caso o veículo também é responsabilizado na esfera civil.

Pior que a censura, que também foi banida pela Constituição, é a autocensura. Com receio de ter que pagar pelo crime de quem disse, a empresa se vê obrigada a restringir a publicação de denúncias de interesse público. No caso do jornalista, por medo de perder o emprego passa a evitar assuntos polêmicos.

A jurisprudência que vai se firmando na Corte tem suas ressalvas, é verdade. No caso de um entrevistado atribuir falsamente crime a terceiros, o veículo de comunicação só poderá ser considerado responsável se duas condições forem localizadas. Primeiro, se na época da publicação havia "indícios concretos" de que a acusação era falsa. Segundo, se ele tiver deixado de "observar o dever de cuidado" ao verificar os fatos.

Fica a dúvida sobre como os tribunais interpretarão as condições impostas para configurar a responsabilidade dos veículos. As expressões "indícios concretos de falsidade" e "dever de cuidado" abrem margem a interpretações subjetivas. Imagine na Comarca de Grotão City, onde magistrados corporativistas e autoritários é que vão decidir esse tipo de coisa.

A Constituição também protege o direito das pessoas e instituições. Os próprios ministros do STF já defenderam que a liberdade de expressão tem "posição preferencial" em relação a outros direitos. Nem sempre é o que acontece, principalmente depois que o STF passou a ser alvo de criticas e a se preocupar com a reputação de seus ministros.

A maneira mais eficiente das pessoas se defenderem de declarações ou artigos difamatórios, caluniosos ou com informações falsas, seria pelo exercício do Direito de Resposta. Sempre tive a impressão de que o STF, ao banir a Lei de Imprensa como entulho autoritário dos tempos da ditadura, fez o mesmo que jogar o bebê com a água do banho. A Lei de Imprensa tinha todo um capítulo garantidor do Direito de Resposta, que poderia ser exercido com celeridade, a tempo, lugar e hora. Infelizmente não existe mais e nada se fez para regulamentar esse que também é um direito constitucional.

Receba as notícias mais relevantes de Bauru e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.