De engraxate a um dos delegados mais respeitados
Do menino que engraxava sapatos a um dos delegados mais respeitados de Bauru, com 32 anos de carreira na Polícia Civil. Uma jornada trilhada com muito esforço e convicção de que somente por meio dos estudos é possível ser um profissional melhor, com ganhos não apenas individuais, mas para toda a sociedade. Agora, aos 58 anos, Kleber de Oliveira Granja abraça um novo desafio: ele acaba de se tornar diretor da Divisão Especializada de Investigações Criminais (Deic) de Ribeirão Preto.
Ingressante na carreira como escrivão, atuou por 25 anos como delegado. Foi, inclusive, titular da Delegacia de Investigações Gerais (DIG) de Bauru por seis anos. Mais recentemente, estava trabalhando como delegado assistente na Deic da cidade, até ser convidado a transferir-se para Ribeirão.
Neste momento, ele diz, o sentimento é de gratidão pelos colegas de trabalho, a quem denomina "família de suor e lágrimas", e por sua "família de sangue". "Principalmente pelo reconhecimento e votos de sucesso que recebi nestes últimos dias, vou com sentimento de paz, cumprindo minha missão de proteger pessoas 24 horas por dia, sete dias por semana".
Nascido e criado em Bauru, é filho do policial militar Walter (in memoriam) e da professora aposentada Célia e o mais velho de três irmãos - Cibele e Rodrigo. Com Marlene Beneditto Granja, sua esposa, teve a única filha, Pietra. Corintiano 'roxo', católico e amante de viagens pelo Brasil, Granja relembra, nesta entrevista, sua trajetória na polícia, ocorrências marcantes, a perda do pai e toda a dedicação que precisou empenhar para alcançar esta mais nova conquista.
Jornal da Cidade - Como surgiu o interesse pela atividade policial?
Kleber Granja - Meu pai foi policial militar, carreira também seguida por minha irmã do meio. Ela passou no concurso público um pouco antes de mim. Sobre meu pai, aliás, gostaria de dizer que ele faz muita falta. Fazia questão que todos almoçassem juntos no domingo. Como tem ascendência espanhola, sempre manteve a gente unido. E, quando ele faleceu, a família ficou meio desaglutinada. Depois, percebemos que precisávamos estar mais juntos.
JC - Sua trajetória profissional começou na polícia mesmo?
Granja - Não. De 1983 a 1990, fui mecânico da rede ferroviária federal. Passei no concurso com 16 anos e, com meu primeiro salário, comprei uma vitrolinha, porque sempre gostei de música. Também trabalhei como engraxate e vendedor de ficha de fliperama. Vim de uma família humilde, que morava na rua Vitória, no Bela Vista. Lá, durante a infância, jogava futebol no time do Vitorinha. Mais maduro, resolvi focar no concurso público. Eu ouvia muito um escrivão em um programa de rádio e ele falava sobre a rotina policial. Decidi, então, que iria ser escrivão. Fui aprovado, cursei a Academia de Polícia, em São Paulo, e passei a trabalhar no 3.º Distrito Policial (DP), em Bauru.
JC - E como chegou até a chefia da DIG (unidade que investiga crimes graves, como homicídios, sequestros e roubos)?
Granja - Em 1994, terminei a faculdade de Direito e, em 1998, passei no concurso para delegado. Assumi em Reginópolis e, em certo momento, passei a acumular as delegacias de Iacanga e Reginópolis. Depois, acumulei Iacanga e Arealva. Em 2006, em meio aos atentados do PCC, fui chamado para vir para a Dise de Bauru, como delegado assistente. Em 2009, sofri uma ameaça de morte e fui para o 2.º DP, quando fiz um curso em São Paulo, para promoção. Quando houve aquela ocorrência do túnel da av. Nações Unidas (em que criminosos visavam subtrair valores da Protege), fomos a primeira equipe a chegar ao local e isso foi o 'start' para eu assumir como titular da DIG, onde fiquei de 2011 a 2016.
JC - Por qual motivo saiu da DIG?
Granja - Um dos motivos foi o diagnóstico de câncer do meu pai, inicialmente na garganta e, depois, no pulmão. Ele sofreu também um processo de isquemia, o que demandou internação. Passou por cirurgia, melhorou, mas teve uma recidiva e ficou internado um ano, até falecer, em 2016. Neste período, minha mãe ficava com ele durante o dia e eu e meus irmãos, além do cunhado e um primo, nos revezávamos à noite. Então, fui trabalhar como delegado assistente na Delegacia Seccional de Bauru, no Setor de Inteligência. Em 2019, fui para São Paulo fazer especialização no Curso Superior de Polícia, pré-requisito para promoção à classe especial, o que me daria condições de assumir um cargo executivo da Polícia Civil. E, em Roma, fiz dez dias de especialização em crime organizado. Neste mesmo ano, passei no concurso para ser professor da Academia de Polícia do Estado, na cadeira de Criminologia e Inteligência Policial. Já em janeiro de 2021, assumi como assistente do delegado divisionário, na Deic, onde criamos um escritório de inteligência e estamos finalizando o laboratório de papiloscopia.
JC - Nestes 32 anos de atuação, teve algum caso mais marcante?
Granja - Muitos. Casos que não conseguimos solucionar, após muito trabalho; ataques a caixas eletrônicos; os homicídios também mexem com o emocional do policial, principalmente quando as vítimas são crianças. O mesmo vale para sequestros. Tivemos um, há alguns anos, em Santa Cruz do Rio Pardo, em que um homem raptou o próprio filho e eu, que era o coordenador da Antissequestro da DIG, consegui convencê-lo a entregar o menino, em uma negociação de quase duas horas. Foi um caso que reforçou a importância da especialização do policial.
JC - O senhor disse que gosta de música. Qual sua relação com ela?
Granja - Foi por meio da música que conheci a Marlene, em 1988, em um barzinho, quando eu me apresentava com a banda de rock que tinha, à época. Eu era vocalista e a gente fazia cover de bandas como Legião Urbana, Capital Inicial, Ira! e um pouco de rock internacional. Cantei muito no Armazén e na região. Minha base foi ter participado de um coral na escola. Quando conheci a Marlene, ela cursava Ciências Contábeis e eu estava na Noroeste. Nos casamos em janeiro de 1991 e, em 2002, nasceu a Pietra.