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Mulheres assumem chefia indígena

Sabrina Magalhães
| Tempo de leitura: 4 min

Em pelo menos três aldeias do País, o posto de cacique pertence a mulheres. Elas exercem a mesma função de um cacique

A figura do cacique na tribo indígena sempre lembra um índio forte e destemido, ostentando os mais belos adereços e uma pintura de traços marcantes. No entanto, em algumas tribos brasileiras, este posto foi designado a mulheres, que garantem ser tão respeitadas quanto o cacique homem. Atualmente, há pelo menos três mulheres caciques no País. Uma delas esteve em Bauru esta semana participando da manifestação que pede a exoneração do administrador local da Fundação Nacional do Índio (Funai).

Pequena e simpática, a cacique Jandira Augusta Venício, 66 anos, da aldeia guarani de Tanque de Ouro, em Jaraguá-SP, disse ter assumido o cargo há dez anos, quando da morte do marido. Ela explicou que, quando o cacique morre, geralmente é seu filho mais velho quem assume - a menos que o cacique tenha designado outro membro da aldeia.

Antes de morrer, meu marido chamou o filho mais velho dele, que mora e trabalha em Ubatuba, para ser cacique, mas ele não veio. Os outros filhos eram pequenos, não tinha nenhum para assumir o lugar dele. Aí eu fiquei como cacique. Agora, depois de muito tempo, o Ari (filho mais velho) veio e quer ser cacique. Mas eu não deixo, porque ele chegou querendo mandar muito e até já bateu no irmão dele. Quando eu morrer, assume o filho mais velho, mas o Ari não vai assumir, porque eu não deixo. Eu não quero e a tribo respeita.

De acordo com a cacique Jandira, as funções dela na tribo são as mesmas de um cacique homem. São tarefas de liderança e comando. A aldeia tem cerca de 80 índios, sendo 26 famílias. Ela garante que todos a obedecem como se fosse homem, sem diferenças. Na aldeia, ela é respeitada como a grande mãe da tribo.

Segundo a presidente da Associação das Mulheres Indígenas do Centro-Oeste, Jupira Manoel Sobrinho, Jandira foi a segunda mulher a assumir o posto de cacique. A primeira foi Sababá Xavante, há uns 25 anos, no Mato Grosso, também desde que morreu o marido. Depois foi Jandira. E tem outra cacique em Minas Gerais, da tribo Maxacali. Dona Jandira é uma relíquia para nós. É humilde e só usa a autoridade dela na hora certa. Na hora de ser mãe, ela é mãe. Numa reunião, quando ela percebe que não tem condição de falar sozinha, ela se preserva. Ela só fala quando toda a comunidade dá autonomia para ela.

Hierarquia

O cacique é o membro responsável pela aldeia. É ele quem dá as ordens e zela por toda a tribo. Abaixo dele, segundo a cacique Jandira, vem o vice-cacique, que é escolhido pelo grande chefe, sendo, geralmente, um de seus filhos.

Em seguida, vêm os membros da Liderança, que se assemelham aos ministros de um regime presidencial, são porta-vozes dentro da comunidade, atuando como intermediários entre o cacique e a comunidade. Quando tem um caso para a cacique resolver, ela faz uma reunião reservada com a Liderança, um grupo de até 11 membros. Eles conversam, resolvem o que fazer e só depois chamam a comunidade e passam o problema e como ele está sendo resolvido, conta o liderança terena Antônio Lulu (Aldeia de Araribá).

A Liderança também faz o caminho inverso, levando ao cacique os pedidos e opiniões da comunidade, decidindo em conjunto se as propostas serão aceitas ou não. Segundo o terena Albino Sebastião, os membros da Liderança têm poder, inclusive, de destituir o cacique.

Logo abaixo, vem o Conselho, que decide, também juntamente com o cacique, sobre a venda de produtos, como gado, produção agrícola ou outros bens. Cabe aos conselheiros fazer vistorias e fiscalizar o andamento dos negócios e trabalhos do cacique. Para todos estes membros, há suplentes e, por fim, vem a comunidade. A palavra maior geralmente é da comunidade, que é o povo. O que o povo disse para a Liderança ou para o Conselho, o cacique vai dizer sim ou não, diz Jupira.

A mulher funciona que nem os homens como cacique. Respeitamos a mesma coisa. Ela dá autoridade para todos. A primeira todo mundo ficou meio assim..., mas é direito, como homem tem direito, a mulher também tem. E dá certo, só depende do trabalho. Tendo a cabeça boa para trabalhar para a comunidade, é o que basta. Tem que saber lutar pelo povo, comentou Antônio Lulu.

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