Proposta dos países latino-americanos é abater parte de débito internacional em troca da preservação do meio ambiente
O Brasil vai encabeçar um grupo de países em desenvolvimento que vai propor uma moratória verde, isto é, a troca de uma parte de suas dívidas externas em investimentos que serão aplicados na preservação do meio ambiente. A proposta fez parte da agenda de discussões da XIII Reunião do Foro de Ministros de Meio Ambiente da América Latina e Caribe, encerrada na última quarta-feira, no Rio de Janeiro.
O evento, realizado simultaneamente com a Conferência Regional Preparatória para a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+10), foi prestigiada por representantes da Organização das Nações Unidas (ONU) e por membros da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), além de observadores da Europa e da América do Norte. O encontro foi presidido pelo ministro brasileiro do Meio Ambiente, José Sarney Filho.
A Rio+10 está agendada para setembro do ano que vem e será realizada em Johannesburgo, África do Sul. A conferência vai avaliar o cumprimento dos acordos ambientais assinados na ECO 92, realizada há dez anos, no Rio. A organização do evento espera o comparecimento de cerca de 150 mil pessoas.
O abatimento da dívida externa direcionado para investimentos na preservação do meio ambiente começa a ganhar força política na América Latina e Caribe, com o apoio de outros países, dentre os quais China e Índia. Os ministros do setor reunidos no Rio foram unânimes no assunto: não há como investir em questões ambientais com uma alta dependência financeira junto a organismos internacionais.
Fundos de concessão
A dívida externa dos países da América Latina e Caribe saltou de US$ 500 bilhões em 1992 - ano em que foi realizada a ECO 92 - para US$ 800 bilhões, dados deste ano. Só o Brasil acumula, atualmente, um montante de US$ 210 bilhões. Os ministros, apoiados por Organizações Não Governamentais (ONGs), pleiteiam uma mudança na relação Norte-Sul da América.
Na avaliação de especialistas, as tensões aumentaram entre o Norte e o Sul na última década, principalmente nos assuntos de interesses ambientais e sociais. A situação se agravou ainda mais neste ano com a posse do presidente do Estados Unidos, George W. Bush, que tem dado sinais de regressão no cumprimento de acordos para a preservação do meio ambiente.
Segundo dados levantados por ONGs, 50% da massa ativa de trabalhadores da América Latina estão no setor da economia informal, o que mostra a fragilidade dos países em atender a demanda social existente. No Brasil, 50 milhões de trabalhadores vivem de bicos e perambulam pelas ruas dos grandes centros urbanos. Na China, são 180 milhões na mesma situação.
Para ministros e especialistas em meio ambiente reunidos no Rio, os países do Norte vão ter que ceder e os países do Sul vão ter que dar respostas. Apesar do cenário negativo, não se pode deixar de mencionar os avanços. Hoje, as grandes corporações não conseguem viabilizar empréstimos financeiros se tiverem passivos ambientais e sociais. As empresas que investem em sustentabilidade têm suas ações mais valorizadas na bolsa.
Gasto público
Os gastos públicos dos países da América Latina e Caribe para a preservação do meio ambiente são irrisórios: cerca de 0,1% do PIB na média. Em alguns casos, pode atingir 3%. Os ministérios do Meio Ambiente são as pastas mais instáveis dos governos.
Especificamente no Brasil, há um desequilíbrio geográfico na aplicação de recursos destinados ao meio ambiente. Cerca de 40% das verbas do Ministério do Meio Ambiente são destinadas a programas na região amazônica; 12% seguem para a região Nordeste, que acumula graves problemas sociais.
Em março do ano que vem, o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) realiza em Monterrey, México, mais uma conferência mundial para discutir a forma de como financiar o desenvolvimento sustentável. Esse encontro deverá constituir, juntamente com a Declaração do Milênio adotada em setembro do ano passado, um novo incentivo para implantar um desenvolvimento focalizado no ser humano, permitindo aproveitar os recursos naturais sem comprometer o futuro e levar os efeitos positivos da globalização para todos os habitantes do planeta.
(*)Enviado especial ao Rio