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Eleições de 2002: qual é o tom?

José Genoíno
| Tempo de leitura: 3 min

As eleições de 2002 deverão ocorrer num ambiente de crescimento da violência criminal em vários Estados da federação mas principalmente em São Paulo, maior colégio eleitoral do País. Este quadro impõe aos candidatos, aos partidos, aos ativistas das campanhas e aos publicitários a responsabilidade de não deixar que as eleições sejam contaminadas pelo clima de violência. Disputas eleitorais, evidentemente, não são um convite para jantar. Mas é perigoso e inconveniente para a democracia propor, como fazem alguns publicitários e alguns dirigentes partidários, que as eleições sejam encaradas como guerra, onde o ardil, a fraude e o artifício sejam erigidos como meios por excelência da disputa. Num contexto desse tipo estaríamos a um passo da violência política.

Duas atitudes, entre outras, têm grande potencial de estímulo da violência política: a estigmatização e desqualificação dos adversários. Estigmatizar o adversário é aquela atitude que procura apresentá-lo como alguém que precisa ser punido e rejeitado ou como alguém que é portador implícito do mal. Trata-se de demonizar o oponente para exorcizá-lo junto à opinião pública e ao eleitorado. O artifício do estigma já é perceptível nesta fase pré-eleitoral em peças publicitárias de determinados partidos e em entrevistas de alguns publicitários.

A desqualificação do adversário visa imputar-lhe uma imagem negativa, de insuficiência e de incapacidade com o objetivo de interditá-lo como interlocutor legítimo do debate e da disputa. O sucesso da estigmatização e da desqualificação se traduz no isolamento das vítimas destas atitudes. Na história da política brasileira, os grupos e partidos estigmatizados e isolados foram vítimas também da violência de seus algozes e das elites que controlavam o poder político. Isto ocorreu com os setores republicanos que participaram da Independência, com o movimento da Confederação do Equador, com as manifestações autonomistas nas Províncias no período da Regência imperial, com setores oposicionistas no regime de Vargas e com a esquerda no regime militar. Mais recentemente, o PT e outros grupos de esquerda também sofrem tentativas de deslegitimação enquanto agentes e interlocutores do processo democrático.

O sistema político democrático implica que todos os agentes que descartam a violência como método de acesso ao poder e que aceitam as regras das eleições periódicas, da competição eleitoral, do pluralismo político e ideológico e da alternância no poder sejam reconhecidos como agentes e competidores legítimos do debate e da disputa eleitoral. A existência desse jogo, que deve ser institucionalizado por regras e não interditado por atitudes dos competidores, é condição e princípio constitutivo da democracia. Neste sentido, a estigmatização e a desqualificação de adversários não representa apenas uma agressão a eles, mas uma agressão à democracia. A democracia só poderá apresentar resultados aceitáveis na mediação e resolução dos conflitos políticos, sociais e econômicos se os agentes desses conflitos se submeterem não só às regras mas também a uma prática democrática.

Num Brasil em crise e numa América Latina em crise, o que estará em jogo nas eleições de 2002 é a consolidação e o avanço da democracia na região. É com a responsabilidade de superar este quadro adverso que devemos medir o tom com que serão disputadas as eleições de 2002. Não se trata de propor uma campanha fria e sem emoções. Trata-se de qualificar a disputa com programas, projetos e propostas com o objetivo de apontar soluções para os problemas dos Estados e do País. Este deve ser o teatro da disputa, somado com o respeito aos adversários, com a aceitação de sua legitimidade e do pluralismo partidário. Somente assim criaremos um ambiente no qual as diferenças e eventuais semelhanças possam se explicitar, oferecendo alternativas para que o eleitor possa escolher de forma tranqüila e consciente. (José Genoíno - Deputado Federal PT/SP)

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