É, com certeza, o controle remoto é uma estrutura de poder. Quem afirma é a professora de jornalismo da Universidade do Sagrado Coração (USC), Roseane Andrelo, que em sua dissertação de mestrado “TV a cabo: estudo qualitativo da audiência†entrevistou dois grupos focais de telespectadores e ficou surpresa com o resultado da pesquisa.
A jornalista detectou que, na maioria dos casos, quem “manda†no controle é o pai, em segundo lugar vem os filhos. Ela aponta que muitos dos pais entrevistados disseram não ter o menor poder sobre a televisão, que está sob o comando dos filhos.
A situação em alguns casos chega a ser tão extrema, que o detentor do controle é capaz de levar o aparelho para a cozinha, quando precisa tomar água, outros o guardam dentro do bolso para que ninguém tenha acesso.
“Geralmente, a mãe ou a filha mais nova são as excluídas e não têm poder nenhum sobre o controle e é obrigada a assistir a programação que outra pessoa escolheuâ€, comenta.
Roseane argumenta que essa pratica do zapping foi intensificada com as novas tecnologias de televisão, como o cabo e as tevês via satélite. Em grande parte dos casos, as brigas pelo controle remoto ocorrem em residências com apenas um ponto de TV por assinatura.
“Quem tinha sete canais abertos em VHS, com o cabo passou a ter mais de 50 e intesificou a prática de zapear os canais e até a própria segmentação.†A professora explica que antes a TV aglutinava as pessoas, que ficavam na sala em torno do aparelho. Mas hoje, com um estilo de vida mais individualista, as pessoas que têm condições de adquirir mais de um ponto de TV a cabo, acabam se separando e indo cada uma para seu quarto, ser dona do seu controle remoto.
Ela também notou que os motivos das discussões mudam. Anteriormente, se brigava apenas pelo jogo futebol ou pela novela, oferecidos nos pacotes de grandes emissoras, única opção para muita gente até os dias atuais. Com o advento da tevê paga, a busca é por uma maior segmentação de conteúdo e a briga é pelos canais de esporte, de notícia e de entretenimento.
Nesse sentido, pesquisas recentes do Ibope indicam os canais de desenho animado como os mais assistidos. “Isso se dá porque são apenas cinco ou seis canais e as crianças se prendem a eles. O que já não ocorre com os canais de programação adulta, em que as programações e os espectadores se pulverizamâ€, analisa Roseane. Mesmo assim, os canais de filmes lideram a preferência do público mais velho.
Tudo ao mesmo tempo
Os comportamentos diante do controle remoto são os mais diversos possíveis. Tem gente que quer ver tudo ao mesmo tempo e admite conseguir assistir a três programas juntos.
Segundo Roseane, até pouco tempo se mudava de canal nos intervalos de publicidade, ou quando a programação estava chata. Hoje se muda de canal por lazer. “Já existem pessoas que admitem que mesmo quando estão gostando de um determinado programa, mudam de canal. A resposta para isso está na ânsia pelo volume de informação disponível. As pessoas ficam com aquela inquietação: mas e o outro, se tiver uma coisa melhor?â€
Esses telespectadores apresentam uma conduta segmentária, que a própria indústria da televisão está trabalhando para conseguir manter fiéis e menos ansiosos. Até a publicidade já trabalha com isso. Produtores de programa e publicitários estão desenvolvendo a cada dia mais uma série de táticas para tentar segurar o espectador, inserindo chamadas de outros programas, desenvolvendo jogos e gincanas nos intervalos de blocos e jogos e até fazendo anúncios em capítulos para prender o receptor.
“Hoje além da programação pronta, o próprio receptor está editando o que ele assiste. Não é só uma escolha de canais, cada um faz o seu leque com jogos, filmes, desenhos, notícias, séries. A gente passa a ser editor da nossa programação. Recebemos algo pronto, mas não está acabado, nós mesmos fazemos essa alteraçãoâ€, explica a jornalista. Ela diz que não sabe ainda até que ponto. O telespectador sabe que essa busca pode significar uma rejeição à programação. “Isso mostra que o receptor nem sempre é um ser passivo. Ele não tem o poder de fazer na TV a sua programação, mas já tem o poder de fazer com ela o que bem entende.â€