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Casério, um bauruense da gema

Da Redação
| Tempo de leitura: 9 min

A história de uma cidade é feita por personagens históricos (desbravadores, fundadores, etc.), pessoas do povo e cidadãos especiais. Paulo Casério se encaixa neste último grupo. Quem vive Bauru, sua gente, seu cotidiano, suas alegrias e tristezas, no mínimo já ouviu falar nesse bauruense de nascimento, filho de pai carioca e mãe nascida aqui, neto de Constante Perroca, um dos pioneiros do comércio e da própria história da cidade.

Dono de um carisma singular, encantador e de uma generosidade e sensibilidade contagiantes, Casério se auto-intitula “bauruense da gema”. O “da gema” é uma adaptação da expressão “carioca da gema”, usada para designar o autêntico carioca, aquele que tem a alma da cidade do Rio de Janeiro. Portanto, totalmente apropriada a adaptação.

Casério tem a alma bauruense. Viveu aqui os anos dourados como ninguém. Quando jovem, curtiu o romântico footing na rua Batista de Carvalho, o Restaurante da Lalai, o Café Juca Pato, o Bar Cristal, os grandes Carnavais do Bauru Tênis Clube e o esporte, que foi a ligação umbilical com o lazer e sua vida profissional, através da famosa Casa Maracanã, ponto de encontro de esportistas e políticos nos anos 60, 70 e 80.

Casério foi um dos proprietários desse estabelecimento que marcou época na quadra 2 da Batista. A seguir, conheça um pouco do perfil, dos pontos de vista e das lembranças desse bauruense da gema, que concedeu entrevista no dia de seu 64.º aniversário, na última quinta-feira.

Jornal daCidade – Que lembranças você guarda com carinho dos tempos de sua infância e juventude?

Paulo Casério – Bauru era uma cidade pequena, a vida social girava em torno do Bauru Tênis Clube (BTC) e do Automóvel Club, isso nos anos 50 e 60. Havia também o Clube Paulista, na baixada da rua Araújo Leite, e a Panela de Pressão (ginásio de esportes do Noroeste), onde aconteciam grandes Carnavais. A Luso ainda não existia. A Bauru que nós vivíamos ia do BTC até a Batista e Primeiro de Agosto, era a cidade que o Nicolinha (Nicola Avallone Júnior, ex-prefeito) chamava de Capital da Terra, a cidade marcada pela Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (NOB). Éramos, de fato, o Centro do Estado de São Paulo e Bauru iria deslanchar mesmo, como deslanchou por um bom período.

JC – Mas parou um pouco em determinado momento, nas últimas décadas, não?

Casério – Um dos problemas foi o fim da estrada de ferro. Me lembro que, quando saia o pagamento deles (funcionários da NOB), a cidade fervia, era outro movimento no comércio.

JC – Você diz que é um bauruense da gema.

Casério – Isso mesmo, tenho orgulho de ser bauruense, vivi e vivo intensamente esta cidade. Desde sua vida noturna na minha época, as lanchonetes, os clubes, a Casa da Eny, peguei bem os anos boêmios em Bauru, nos anos 60, principalmente. Era um tempo muito bom, mais tranqüilo, mais romântico, menos agressivo.

JC – Você sempre gostou de esportes e aí, me parece, começa uma longa história de amor...

Casério – Gosto muito. Joguei tênis e futebol por recreação. Depois fui trabalhar com material esportivo até me integrar às atividades esportivas do BTC. Em 1967, fui substituir meu pai, Guilherme Casério, na Casa Maracanã, fundada por ele e por meu tio Ivan Perroca em 1955. Dirigi a Casa Maracanã com meu tio até 1992, quando a vendemos.

JC – Fale um pouco desta loja que marcou época no comércio central de Bauru.

Casério – A Casa Maracanã começou lá em frente à Praça Machado de Mello. Depois foi para a quadra 2 da Batista. Na época, só existia a nossa loja e a Casa do Esporte, duas apenas. Convivíamos muito bem, não éramos concorrentes. Quando um precisava, emprestava mercadoria do outro e assim por diante. A Casa Maracanã era um grande ponto de encontro, desde o pessoal profissional do Noroeste ao pessoal do futebol amador. A gente vendia uniformes, chuteiras, para o Amador inteiro, o Ordem e Progresso, o Fortaleza e muitos outros. E nós ajudávamos muito os times. Nunca pusemos obstáculos. Se estava atrasado no pagamento, a gente vendia assim mesmo, não tinha problema, podia confiar, era no fio do bigode. Nós fornecemos também material para times como o XV de Jaú e o Marília por muito tempo, principalmente o XV, nos anos 70.

JC – E como era esse ponto de encontro?

Casério – Segunda-feira, depois das rodadas do futebol amador e do profissional, que eram no domingo, ali se reunia todo mundo, diretoria, jogadores, imprensa, era o tempo do Bolão (treinador em vários clubes, inclusive o Noroeste), que ia muito lá, fazia ponto. O Medina (Inocêncio), Cláudio Amantini, enfim, toda a velha guarda do Noroeste. Ali se decidia muita coisa também. Quantos presidentes do Noroeste não caíram lá... (risos)

JC- E técnico do time, nenhum caiu ali?

Casério - Se caiu. O Norberto Lopes caiu ali depois de uma derrota desastrosa do Noroeste. Naquele dia, a loja ficou cheia de gente querendo a saída dele do clube, foi um vaivém o dia inteiro e, naquela noite, ele caiu. A loja era um serpentário do futebol (risos). O próprio Norberto ia muito lá, o pessoal do Noroeste todo freqüentava, inclusive os jogadores, que iam buscar material.

JC – Políticos da época também faziam um parada na Casa Maracanã?

Casério – Isso. No sábado de manhã, o trio de ferro - Alcides Franciscato, Osvaldo Sbeghen e o doutor Abrahim Dabus - mais Edmundo Coube - saiam da Casa Maracanã para subir a Batista para cumprimentar e conversar com os bauruenses. Iam até o Raduan (Raduan Trabulsi, bauruense proprietário da Márcia Jóias, na quadra 7 da Batista).

JC – Como nasceu sua ligação com o BTC?

Casério – Ah, minha ligação com o BTC vem desde quando eu nasci. São 64 anos lá dentro. Fui levado por meu pai, que foi diretor do pólo aquático, das piscinas, e eu fui por várias anos diretor do clube também, nos anos 70 principalmente, na época do Blair (Martini, empresário). E foi quando nós compramos a primeira área do clube de campo do BTC, onde ele está até hoje. A primeira área foi a do bosque e do campo de futebol e uma parte onde estão hoje as piscinas.

JC – Você participou diretamente?

Casério – Sim, fui eu que comprei, fui ver o terreno, falei com a proprietária. Aqui embaixo (sede da rua Gustavo Maciel) estava estrangulado. Então nossa turma, mais jovem, o Tidei de Lima, o Pinga (Luiz Carlos Gomes Duarte Neto) e outros que faziam parte do conselho fomos em frente. Com apoio do Blair, nós compramos primeiro 3,5 alqueires e hoje já tem 12,5 alqueires. Depois, quem começou a construir foi o doutor Nilton Silveira, na presidência dele, por volta de 1975, 76. Ele contou com a orientação do Jurandyr Bueno, que foi quem praticamente decidiu a área. Ele olhou e falou: “É essa área que nós queremos”. O Tidei estava junto.

JC – E o setor de futebol? Você recebeu uma homenagem recentemente por sua atuação no futebol do clube.

Casério – O campo foi a primeira coisa que inauguramos, junto com o bosque. Me lembro que a Brahma deu 2 mil litros de chopp, ganhamos meia dúzia de bois, fizemos um churrasco o dia inteiro, em 1977 ou 78. De lá para cá, o futebol não parou mais. O BTC é uma das paixões da minha vida. Hoje sou conselheiro vitalício. Já tenho 40 anos de conselho.

JC – E a paixão por uma professora chamada Vera Regino Casério?

Casério – É a maior paixão da minha vida ao lado de meus filhos, Guilherme, Paula e Priscila. Conheci a Vera faz tempo...(risos), quando ela tinha 14 anos e eu tinha 19. Uma vida inteira juntos. Ela é uma grande mãe, mulher maravilhosa e uma profissional de mão cheia.

JC – E o lado cozinheiro de Paulo Casério, que também é muito conhecido?

Casério – Eu fui um filho arredio nessa parte, não gostava de comer isso, não gostava de comer aquilo, deixava minha mãe louca. Depois estudei três anos em colégio interno e tive de aprender a comer de tudo. Mas foi no Tênis (BTC) que eu dei os primeiros passos na cozinha. Era muita gente que cozinhava bem, quando a gente fazia as dupladas (de tênis), e fui aprendendo. A paella, que é um dos meus pratos favoritos, aprendi no Don Curro (famoso restaurante de comida espanhola), em São Paulo. O espanhol de lá me deu a receita. E tem também o carneiro cheio à moda árabe, que é outra especialidade minha e que aprendi com a dona Mariazinha Nasralla.

JC – O que marcou m ais em Bauru na sua época?

Casério – A vida noturna, a Casa da Eny, a Casa Rosada, a Lalai, o Bar Crystal, Lenços Fátima, o footing na Batista, as meninas de um lado e os rapazes do outro. Naquele tempo, mulher não entrava nos bares. Então elas iam para a Lalai. Aí, lá pelo meio dos anos 60 é que abriu a lanchonete Capristor e as meninas começaram a freqüentar. Para ficar perto das meninas, tínhamos que ir ao Tênis. Aliás, no BTC também marcou muito o Cassino. Lá a gente comia o sanduíche do Carlinhos, antes de sair para a noite. O Cassino era freqüentado por grandes jogadores de baralho. Tinha também o Lanches Fátima, da família Pieroni, do meu grande e inesquecível amigo Flamarion, o Fla. Era na quadra 7 da Batista, um lugar maravilhoso, onde havia o melhor chopp de Bauru. Outro charme da época era ir na sessão das 2 (14h) no Cine São Paulo e depois ir até a Americanas (Lojas) comer lanche. O Café Juca Pato... Era uma festa... Ah, e os grandes Carnavais da época, com marchinhas, o lança-perfume liberado, mas depois o Jânio (Quadros) proibiu.

JC – Fale de uma grande tristeza.

Casério – O fechamento da ferrovia, foi um crime!

JC- E de pescaria, você gosta?

Casério – Não, não, não! Pára com isso! Chegar cheirando peixe em casa, barbudo, a mulher não gosta. Mulher gosta de homem cheiroso... (risos)

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Perfil

Nome: Paulo Inri Casério

Idade: 64 anos

Nascimento: Bauru

Esposa: Vera Regino Casério

Filhos: Guilherme, Paula e Priscila

Hobby: Academia de ginástica

Músico preferido: Maria Bethânia

Filme: “Bonequinha de Luxo”

Time do Coração: São Paulo

Para quem daria Nota 10: Alcides Franciscato

Para quem daria Nota 0: George W. Bush

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