Cultura

Roberto Minczuk: o maestro de US$ 400 mil

Por Célia Villela | Especial para o JC
| Tempo de leitura: 7 min

“Para mim, a família está acima da carreira”. A afirmativa convicta é do maestro de fama internacional Roberto Minczuk, cujo salário de estrela, segundo divulgou a recente matéria de capa da “Veja Rio” é US$ 400 mil. Com apenas 40 anos de idade, ele é dono de um currículo brilhante e, logicamente, possui talento de sobra. Não por acaso é reconhecido como o “maestro número um do Brasil”.

Dinheiro, sucesso e fama não são tudo para Minczuk. “Convivo com vários maestros bem mais velhos do que eu, e sinto neles uma melancolia e arrependimento pelo fato de terem colocado a carreira em primeiro lugar”, diz. Também por isso a família, para ele, está acima de todas as coisas. Menos de Deus.

Se Roberto preserva a família, como maestro ele zela pela precisão e pela expressividade, ao mesmo tempo, comenta o lendário maestro alemão Kurt Masur, que tem verdadeira admiração por Minczuk (pronuncia-se mintchuk).

Pela pouca idade, sua experiência é invejável. Minczuk foi regente associado da Filarmônica de Nova York, eleito por unanimidade pelos próprios integrantes de uma das mais importantes filarmônicas do mundo.

Antes dele, apenas o maestro Eleazar de Carvalho (que morreu em 1996) alcançou tanta projeção no circuito internacional. Conduziu orquestras do porte das filarmônicas de Londres, Israel, Filadélfia e Minnesota; sinfônicas de Atlanta, Baltimore, Detroit, Toronto e Ottawa. Chegou a reger 25 orquestras simultaneamente.

No Brasil, participou da revitalização da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) como assistente de John Neschling, onde ficou durante oito anos. Deixou-a em 2005, depois de ter uma série de atritos com o titular. Minczuk garante que não foi ele quem buscou a incompatibilidade.

Mas, diante de tanta paixão pela música erudita e de sua brilhante carreira, essas picuinhas pouco interessam, se tratando do célebre Roberto Minczuk. A força de sua modéstia é proporcional à sua autoconfiança. O ex-trompetista vem sendo aplaudido pelos próprios colegas. “A melhor coisa é ser reconhecido pelos músicos”, diz.

Embora seja visto como um maestro linha dura, exigente e rigoroso, sua simplicidade é incontestável. Ao conceder esta entrevista não demonstrou estrelismo.

Ele é o quinto dos oito filhos do maestro José Minczuk, descendente de russos, começou a tocar trompa aos 6 anos de idade. Os Minczuk, que são evangélicos, tocavam na orquestra criada por seu pai no Templo da Assembléia de Deus, em São Paulo. Roberto tem muita fé. Freqüenta com a esposa, Valéria, e os quatro filhos a Igreja Pentecostal Nova Vida e chega a recitar salmos de cor.

Atualmente Roberto Minczuk é diretor-artístico da Orquestra Sinfônica Brasileira da Cidade do Rio de Janeiro, da Sinfônica da Calgary (Canadá), e há cinco é diretor-artístico titular do Festival Internacional de Inverno de Campos de Jordão, que termina no próximo domingo com a Orquestra Acadêmica, com regência de Roberto Minczuk e participação da soprano Gabriela Geluda. Confira a entrevista:

Pergunta - Ainda muito jovem, você realizou seus estudos em uma das mais conceituadas escolas de música do mundo, a Julliard, em Nova York. Como foi?

Roberto Minczuk - Eu convivi com colegas que são grandes nomes da música atual. Lá, você acaba sofrendo um choque de alto impacto musical que não há como não ser absorvido. Tive oportunidades e agradeço a Deus pelo talento. A responsabilidade é muito grande, porque cada vez que o maestro se apresenta no palco cria-se uma expectativa enorme. Fazendo uma comparação, é como o goleiro que tem que fazer o gol.

Pergunta - O que você aprendeu no Brasil e ensinou nos países em que passou? E o que você aprendeu lá fora e executa no Brasil?

Roberto Minczuk - No Brasil a criatividade, a espontaneidade, o improviso. Lá fora, disciplina, informação, cultura, bom gosto e estilo.

Pergunta - Qual é a sensação de emocionar seu próprio povo e emocionar platéias estrangeiras?

Roberto Minczuk - No Brasil é sempre melhor porque é a minha casa. Existe um apreço e reconhecimento dos brasileiros. Entretanto, a satisfação maior vem de quando o trabalho é bem realizado. Não importa se for regendo na igreja evangélica ou na Filarmônica de Nova York.

Pergunta - A música sempre fez parte de sua vida; seu pai também é maestro. Você começou tocando aos 7 anos de idade. Fale sobre sua trajetória.

Roberto Minczuk - Comecei tocando vários instrumentos, com 6 anos de idade, e me especializei na trompa. Aos 14 anos, ganhei uma bolsa de estudos e fui pra Nova York, onde fiquei durante seis anos, e, com 15 anos, comecei a reger em uma igreja evangélica. Estudei com o maestro Eleazar de Carvalho. Com 17 anos, estreei como solista no Carnegie Hall. Depois, fui para Alemanha. Retornei ao Brasil com 22 anos porque senti falta da família e do meu país.

Pergunta - Como se sentiu sendo um adolescente chegando em Nova York?

Roberto Minczuk - Foi um sonho!

Pergunta - Como tem sido seu trabalho como diretor-artístico à frente da Orquestra Sinfônica Brasileira?

Roberto Minczuk - A experiência que vivo desde 2005 tem sido fantástica. É um grande desafio, mas o desafio maior é de sempre fazer música bem feita, de fazer jus a este repertório maravilhoso. Evidentemente que precisam ser criadas condições para tornar isto viável, dar uma infra-estrutura para que a orquestra funcione bem, pois orquestra é sinônimo de qualidade.

Pergunta - Pretende fazer turnês com a OSB pelo Interior paulista?

Roberto Minczuk - Com certeza o Interior paulista está em nossos planos. Aproveito pra contar que a Orquestra Sinfônica Brasileira, mantida pela prefeitura do Rio de Janeiro, terá uma sede maravilhosa. A sede estará dentro do maior complexo cultural da América Latina, que será inaugurado em 2008.

Pergunta - É pública a admiração que o maestro Kurt Masur tem por você. Como é sua relação com esse que é um dos grandes gigantes da regência mundial?

Roberto Minczuk - Ele é meu mentor, uma pessoa que admiro e com quem aprendi muito. Todo artista tem uma pessoa que dá parâmetros e modelos. Meu pai também é minha referência, como músico e como ser humano. O Masur, antes de qualquer coisa, é uma pessoa maravilhosa. Uma pessoa que, com todo seu conhecimento e fama, é muito acessível e humana. Aprendi com ele que a música vem em primeiro lugar, que o importante é o compositor, a obra. É uma coisa sobrenatural, religiosa mesmo! E em cada momento que passo com ele estou sempre aprendendo.

Pergunta - Como você se sentiu quando tocou para 90 mil pessoas no Central Park?

Roberto Minczuk - Foi uma bênção. Aquele dia foi um marco para minha carreira internacional.

Pergunta - Como você define um bom maestro?

Roberto Minczuk - Primeiro ele tem que ser um bom maestro e depois ser um bom anfitrião. De nada adianta se comunicar bem com a platéia se ele não reger com maestria.

Pergunta - Qual é a sua sensação ao subir no palco?

Roberto Minczuk - É uma viagem, onde me sinto um guia embarcando com os músicos e com a platéia. É uma sensação maravilhosa comunicar a beleza da música.

Pergunta - Atualmente você dirige a OSB, a Filarmônica de Calgary e coordena o Festival de Campos do Jordão, além de realizar muitos concertos como regente convidado. Como consegue lidar com tantas coisas diferentes?

Roberto Minczuk - Não é fácil, tem que fazer malabarismo, viajar bastante e se privar de muita coisa (a que mais faz falta é a minha família). Mas, por outro lado, é bom, pois, na verdade, é um sonho que se realiza. É uma rotina que um maestro internacional tem e trata-se de uma opção de carreira que fiz e que tenho o privilégio de ter. Mas, ao mesmo tempo que cansa, é também um combustível. O pessoal pergunta no final do concerto se estou cansado e digo que não, digo que faria de novo. Poderia ter duas sessões seguidas que regeria com a mesma energia.

Pergunta - O que você tem a dizer sobre o 38.º Festival de Campos do Jordão?

Roberto Minczuk - Este ano temos o prazer de anunciar um tema inusitado no circuito da música clássica: a homenagem à mulher. Maria João Pires, Marina Piccinini, Alison Balsom, Cristina Ortiz, o Eroica Trio e Jocy de Oliveira - a compositora brasileira de maior expressão no cenário internacional - são alguns dos nomes que estão em Campos do Jordão.

Comentários

1 Comentários

  • Paulo Costa Pacco 25/09/2023
    John Neschling e Roberto Minczuck são dois regentes sudos. Sem musicalidade.