Ser

Sexo sem limites

Daiana Dalfito
| Tempo de leitura: 6 min

Quais os limites do prazer? Até que ponto fantasias e o desejo sexual podem ser considerados saudáveis e benéficos e quando as pessoas deixam de ser felizes para se tornar viciadas? Para muitos essa linha entre o prazer e a dor é tênue. Na sociedade ocidental é quase que necessário que se alardeie: “Sou bom de cama”. Mas taí outro ponto: O que é ser bom de cama? É estar realizado à sua maneira, seja ela diária ou mensal, progressiva ou conservadora? É ter múltiplos parceiros e praticar compulsivamente?

Segundo o psicólogo e mestre em sexologia Charles Rojtenberg, o destaque dado ao sexo é algo a ser pensado. “As pessoas estão ‘fingindo’ serem boas de cama ao dizer que têm vários parceiros, mas se não conseguem manter uma relação estável, isso, na verdade, esconde um problema emocional muito grande. Ter varias mulheres e homens na cama por mês é fácil, difícil é manter uma pessoa satisfeita com você por um tempo maior”, sentencia.

No site de relacionamentos Orkut, uma série de comunidades de discussão se voltam para os temas ninfomania e compulsão sexual. Todos partem da premissa: gostamos de sexo, somos viciados e “ninfomaníacos”, como diz uma das descrições: “Pra vc q curte emoções fortes e uma pegação bem gostosa e balanceada. Sem contar q seus desejos mais profundos estão guardados, nós do Ninfomaníacos, ficaremos felizes em compartilhar com vc e e ... (sic)”.

Por sua vez, a TV e uma parte da mídia vendem a idéia de que o vício sexual é positivo. Atores como o americano Michael Douglas muitas vezes apareceram estampados em tablóides não pelo trabalho, mas por problemas pessoais. Douglas, que estrelou o filme “Instinto Selvagem” com Sharon Stone no início dos anos 90, teria, após o lançamento, se internado em uma clínica para o tratamento do vício por sexo, segundo o site “E-Pipoca” (epipoca.uol.com.br). Ao problema somou-se a fama de “garanhão” e o estrago estava feito.

Mas, afinal, o que é compulsão sexual? A palavra “compulsão” deriva do verbo “compelir”, ou seja, obrigar, forçar, coagir, constranger – a si ou a outros. Vendo por esse ângulo, ser compulsivo sexual não parece tão glamouroso.

Para presidente da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana (Sbrash), o psicólogo Oswaldo Rodrigues Jr., essa profusão de sites e grupos de discussão que enfocam a valorização do sexo é um reflexo do perceber-se masculino. “Os homens se sentem mais homens usando este esquema cognitivo, mas também temos mulheres que consideram que ser ‘sexualmente compulsivas’ é bonito, positivo. Por exemplo, no Orkut, muitas garotas de programa se apresentam assim, pois assim é que os homens as valorizam e as procuram”, esclarece.

Para o pesquisador, alguém com 20 anos de idade somente será um “compulsivo sexual” se a doença psicológica de base estiver muito desenvolvida, o que não é comum para este tipo de problema psiquiátrico. Os compulsivos sexuais, pasmem, estão quase sempre na casa dos 40 anos e o problema atinge quatro vezes mais homens que mulheres, indica Rodrigues.

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Para entender as coisas

Sexo é normal. Gostar de sexo é normal e adequado. Gostar muito de sexo, também. Porém, algumas pessoas têm características de personalidade que promovem o usufruto “inadequado” do sexo. Como explica o presidente da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana (Sbrash), o psicólogo Oswaldo Rodrigues Jr., a compulsão sexual é a expressão de uma psicopatologia semelhante à drogadição ou ao abuso do álcool ou jogos.

“A associação de alivio de tensões ou ansiedades à expressão de atividades sexuais torna a pessoa presa a este mecanismo. O ato sexual passa a ser uma válvula para quando se está tenso ou ansioso” aponta o psicólogo.

Ainda de acordo com Rodrigues, mulheres ou homens serão considerados compulsivos sexuais quando não mais conseguirem postergar a satisfação do desejo sexual em prol de atividades necessárias à manutenção de seus cotidianos, como cuidados básicos, vida social e familiar, trabalho, vida religiosa/espiritual e conjugal.

“Deixar o sexo tomar conta, buscá-lo de todas as maneiras, inclusive sem cuidados e correndo riscos sociais e de saúde, é o problema. Não é tão fácil dizer se alguém é compulsivo se apenas olharmos de fora a vida destas pessoas. A condição compulsiva precisa ser determinada pelas características psicológicas e não apenas pelas expressões sexuais de cada um” salienta o pesquisador da Sbrash.

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‘Bem-resolvidos’

O sexólogo Charles Rojtenberg crê que o “bem-resolvido”, um termo muito usado atualmente, é muito complexo. “Quem seria bem resolvido? Não sei se existe. Nossos desejos e fantasias mudam. Hoje você quer uma coisa, amanha outra.. é um processo”, diz.

Não há limites para o desejo, algo que o regule, um mecanismo biológico. Cada um se expressa a sua maneira. As fantasias sexuais são parte importante da expressão sexual e uma combinação de meios psicológicos absolutamente saudável. O problema, esclarece o psicólogo Oswaldo Rodrigues Jr., é quando estas fantasias estão a mando de psicopatologias.

Segundo Rojtenberg, o importante é respeitar a si e ao outro. “É uma questão de acordo entre as partes. Se uma pessoa tem uma relação séria e pratica mènage á trois é porque a vontade é dos três e existe permissão. O importante é que não se obrigue ao que não quer”, pondera.

Quando você ou qualquer um se sente desejoso por sexo, sinta-se mais que feliz. Afinal, sermos desejados é o que queremos, como diz o sexólogo. “Para que vestimos roupas bonitas, cuidamos do corpo e cortamos o cabelo? Para sermos vistos, desejados! Não é porque você faz sexo e gosta, ou melhor, adora, que você é um viciado.”

Algumas maneiras de se expressar sexualmente, como o sadomasoquismo e os fetiches, mexem com a normativa “sexo heterossexual papai-mamãe”. As variações dessa norma não caracterizam compulsão, apenas “parecem mais compulsivas” porque atingem a moral.

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Depoimento

Geovana (nome fictício), na casa dos 30 anos, é bancária e sim, gosta de sexo. Aqui vai um pouco de sua história. Ela não tem problemas em falar sobre o assunto. Teve sua primeira relação sexual com 15 anos e, desde então, sua vida sexual é ativa. Gostava de sair e conhecer as pessoas e era uma garota muito bonita na época.

Depois se casou, mas o relacionamento não passou dos dois anos. Dos relacionamentos que teve, um durou quase uma década e acabou pelo sexo. Sexo, para Geovana, é primordial. Durante o período em que esteve envolvida sabia que seus sentimentos estavam voltados ao homem com quem dividia o teto, mas com o passar do tempo o furor sexual diminuiu.

Segundo ela, além da vida sexual ter esfriado mais do que ela gostaria, não havia problemas no relacionamento. O casal se dava bem. Para aplacar seu desejo, ela chegou a procurar outras pessoas durante o casamento, mas disse que sabia diferenciar sexo e sentimento.

Geovana conta que era fria ao ponto de não querer que os homens com quem se encontrava ligassem no dia seguinte. Eles apenas serviam para suprir seu desejo. Hoje ela está sozinha, mas já teve outros relacionamentos duradouros e o sexo continua a ser importante.

Por ela, o ideal seria duas vezes ao dia, confessa, mas pelo menos uma vez por semana precisa estar com alguém. Geovana deixa claro que seu desejo sexual nunca interferiu em sua vida, família, trabalho e que nunca se arrependeu de seus atos. Ela se respeita e diz ser bem-resolvida sexualmente.

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