Após a aprovação pelo Parlamento Português do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, há cerca de uma semana, caiu a última barreira para a adoção de uma só grafia para as palavras em língua portuguesa em todos os países que utilizam o idioma. No entanto, outros obstáculos podem estar surgindo. São os impactos sociais e econômicos que a mudança provocará. De um lado, estão as editoras que terão um custo extra para adequar às novas regras da língua todos os títulos lançados. De outro, estudantes e brasileiros em geral que terão de aprender as novas regras para o uso de hífens e acentos.
Além disso, o alfabeto passará a incorporar as letras “k”, “w” e “y”. Outra mudança será a eliminação do trema, aqueles dois pontos que ficam em cima da letra “u”.
Na opinião de Léa Silvia Braga de Castro Sá, 63 anos, professora de português do curso de letras da Universidade do Sagrado Coração (USC), essa mudança, especificamente, deverá dificultar a alfabetização.
O fim do trema, segundo ela, vai confundir as crianças. “A não ser que se elimine também o som do ‘u’ das palavras”, pondera. De acordo com a professora, vai ficar difícil explicar para os alunos porque palavras como “freqüentar” e “lingüiça”, tem som de “u” e outras, como “fraquejar” e “malagueta”, não tem.
Outras mudanças, como o fim do acento diferencial de palavras como “pára”, do verbo “parar”, não devem causar tantas confusões como aparenta em um primeiro momento. “Acredito que o aluno vai conseguir identificar dentro do texto quando a palavra é um verbo ou uma preposição. São funções diferentes”, diz Léa.
Na opinião dela, a revisão deveria ficar restrita apenas ao Brasil, ou seja, adequar a gramática à língua portuguesa falada e escrita no Brasil. Segundo ela, o português do Brasil está muito diferente do português de Portugal e as diferenças deveriam ser mantidas para se criar uma identidade própria.
Na Academia Bauruense de Letras (ABL), o Acordo Ortográfico divide opiniões. A escritora Isolina Bresolin Vianna, 80 anos, que ocupa a cadeira de número 12, é mais contra do que a favor das mudanças. Na avaliação dela, a revisão vai jogar fora toda a cultura milenar que gira em torno de algumas das palavras da língua portuguesa.
Ela acredita que as mudanças irão facilitar o aprendizado das novas gerações, mas o aspecto cultural das palavras não deveria ser desprezado. “Tem mudanças que não podem ser feitas sem empobrecer a língua. E essa revisão vai empobrecer nossa língua”, afirma.
“A diminuição das regras gramaticais é positiva, mas não podemos acabar com a riqueza da língua portuguesa. Ela é maravilhosa e muito flexível”, diz.
Já o presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL), Cícero Sandroni, considerou um “marco histórico” a aprovação do acordo que unifica a forma como o português é escrito nos países que falam a língua portuguesa. Para o ex-presidente da ABL Marcos Vilaça, a simplificação e unificação ortográfica trarão inúmeros benefícios para a comunidade lusófona. Na opinião dele, a simplificação do emprego do idioma vai possibilitar o incremento das relações culturais entre esses países.
A proposta prevê, além do fim do trema, novas regras para o uso de hífens e acentos e o aumento do alfabeto de 23 para 26 letras, com a inclusão oficial do “k”, do “w” e do “y”.
O português é a língua oficial de 230 milhões de pessoas em todo mundo. Só no Brasil são 190 milhões. Além de Brasil e Portugal, o acordo inclui ainda outros cino países lusófonos: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor Leste.
No Brasil, a mudança entra em vigor em janeiro de 2009. Mas, por causa do período de adaptação, a regra passará a valer para os livros didáticos comprados pelo MEC para as escolas públicas a partir de 2010.