Articulistas

O Sufismo e a Cabala


| Tempo de leitura: 4 min

A primeira notícia que se tem a respeito de árabes e judeus é apresentada no Antigo Testamento (Capítulo 10 de Gênesis). O povoamento da terra ocorre pela descendência de Noé a partir de seus filhos: Sem, Cam e Jafé. Os árabes e judeus fazem parte dos povos que se formaram a partir da descendência de Sem; se fixaram na região da Mesopotâmia (ou Al Jazirah) e deram origem às civilizações que ocuparam essas terras. Babilônios, caldeus, fenícios, hebreus, sírios, assírios e árabes são, portanto, todos “primos”. Por volta de 850 a.C. já era possível encontrar em inscrições assírias e babilônicas termos equivalentes ao vocábulo “árabe”. A literatura grega clássica, através de Heródoto, também menciona não só os árabes como também a região da Arábia.

Em princípio, o termo “árabe” (aqueles que “passam” ou “atravessam”) se aplicou aos beduínos e à população nômade do deserto da Arábia, em oposição à população sedentária das cidades. A partir do século VII d.C., com o surgimento do Islã (que significa confiança e submissão ao Criador), a aplicação do termo “árabe” ganha novas variantes. Hoje é usado genericamente, designando não somente árabes que habitam a Arábia, mas também, os que habitam outros países como o Egito, Marrocos, Síria, Líbano, Iraque. Por outro lado, os países árabes não designam a totalidade dos países islâmicos. Isto quer dizer que “árabe” e “islâmico” não são sinônimos, assim como “árabe” e aquele que pratica os ideais do Islã, o “muçulmano”, também não o são: há muçulmanos que não são árabes e árabes que não são muçulmanos. Os árabes vêem a si mesmos como uma grande nação nos limites daqueles que falam a língua árabe e daqueles sensíveis à memória do passado de glória desse povo. Possuem uma divisão apenas geográfica e política que teve, entre outras causas, o próprio colonialismo europeu.

Nesta história, depois de Sem, torna-se obrigatório citar Abraão ou Ibrahim. Originário de Ur no Iraque, filho de Terach e que viveu em Haran (Sanliurfa na Turquia) até ouvir o chamado do Criador. Foi o pai de Isaque (com Sara) e Ismael (com Agar) e do monoteísmo: Cristianismo, Islamismo e Judaísmo, cujas referências são: a Bíblia, o Alcorão ou Corão (recitar) e a Torá (com os cinco livros do Velho Testamento). Uma das diferenças entre a composição do Alcorão em relação à Torá e à Bíblia foi o fato do primeiro ter sido revelado a um só homem e ter sido registrado poucos anos depois de sua morte. Tanto o Islamismo como o Judaísmo têm sua face mística: o Sufismo e a Cabala.

A palavra Cabala, ou Cabalá, como reprodução fiel do som ligado à grafia hebraica, significa “recebimento”. A Cabalá é um sistema filosófico, teosófico, universal e ecumênico, concebido para responder as eternas perguntas do homem sobre sua origem e o destino final da humanidade. Ela é o único sistema capaz de explicar conceitos ligados ao Criador, ao homem e ao Universo, mística e cientificamente.

Embora muitos digam que a Cabalá é o ensinamento místico do Judaísmo ou sua face esotérica, após muitos anos de estudo, percebi que, pelo contrário, o Judaísmo é quem está fundamentado na Cabalá. Por isto tem, com a Torá, uma relação comparável à existente entre o espírito e o corpo. Quando olhamos para uma pessoa, vemos o seu eu externo, físico. Mas, dentro do corpo se aloja a alma, que contém a essência do que a pessoa é. A Torá é a camada externa ao passo que a Cabalá é a camada interna. A época precisa de seu aparecimento é desconhecida e existem várias opiniões a respeito. Para alguns, a Cabalá preexistiu ao mundo ou remonta ao próprio Adão.

O Sufismo é uma religião quando se quer aprender religião a partir dele; é uma filosofia quando se quer aprender sabedoria a partir dele; é misticismo quando se quer ser guiado por ele no desenvolvimento da alma. No entanto, está além de todas essas coisas. É Luz, é a vida que sustenta toda alma e que eleva um ser mortal a imortalidade. É mensagem de amor, de harmonia e de beleza. O Sufismo é antiga escola de sabedoria, de quietude. Suas raízes podem ser rastreadas na Suméria e no Egito. O Sufismo, como vertente mística daquilo que, depois, foi chamado de Islamismo, adquiriu um sabor oriental por ter sido por muito tempo protegido pelo Islã. O Sufi, no entanto, pode ser tão comum no Ocidente como no Oriente e apresentar-se vestido de comerciante, advogado, professor ou qualquer outra coisa.

Há grandes semelhanças entre o Sufismo e a Cabalá. O Sufi Ibn El-Arabi (1165 – 1240), um de seus expoentes, era conterrâneo e contemporâneo do Rabino Moshe de Leon, historicamente tido como o codificador do Sefer Há Zohar, o Livro do Esplendor, a coletânea enciclopédica de comentários cabalísticos. Quando, em 1516, os turcos tomaram o controle do Egito, Síria, Palestina e Península Arábica e permitiram que os judeus se estabelecessem na Palestina, em uma cidade chamada Safed (hoje em Israel), a Cabalá se difundiu junto aos árabes sufistas.

O Sufismo é misterioso como a Cabalá, carregado de poder como a Cabalá, com o correspondente perigo que todo poder engendra. O Sufismo e a Cabalá são profundos, rigorosos e necessários, hoje, talvez, mais do que nunca.

O autor, Paulo César Razuk, é professor titular do Departamento de Engenharia Mecânica da Faculdade de Engenharia da Unesp-Bauru

Comentários

Comentários