Técnicos do Departamento de Água e Esgoto (DAE) apontam irregularidades na fossa do Jardim Paineiras onde, anteontem, um pedreiro e dois bombeiros morreram soterrados. Em nota oficial, a Prefeitura de Bauru informou que está averiguando as condições técnicas para definir as providências a serem tomadas - o bairro não tem rede de esgoto, só fossas. A Polícia Civil também investiga o caso.
De acordo com o diretor de Manutenção e Execução de Redes do DAE, Manuelino Câmara Filho, o local onde a fossa foi instalada, num passeio público, é irregular. Não é permitida a construção de fossas em locais públicos, apenas dentro de terrenos que não apresentam rede coletora de esgoto. “O tanque séptico deve ser construído com tubos de concreto que existem no mercado para poder evitar a tragédia que houve. Não havia tubos de concreto no local”, afirmou Câmara Filho.
Outra irregularidade é a distância de cerca de um metro entre a fossa séptica, o buraco construído para realizar a manutenção dela, e o sumidouro (uma espécie de buraco escavado ao lado da fossa para o esvaziamento de líquido). “A fossa (buraco) estava sendo construída muito próxima uma da outra. Você tem que trabalhar com uma margem de segurança, de cerca de cinco metros”, avaliou Câmara Filho.
Ele explicou que o liíquido armazenado em um dos tanques não foi retirado para que fosse iniciada a obra de abertura do buraco. Com isso, toda pressão contida dentro do tanque fez com que parte da parede rompesse, atingindo o pedreiro que trabalhava no local. “A tragédia poderia ter sido evitada se tivesse sido escoada toda a água dessa primeira fossa”. A autarquia dispõe do serviço de limpeza de fossas por R$ 100,00 mais a via, que custa R$ 3,80. A construção de uma fossa pode custar ao dono do terreno de R$ 1 mil a R$ 1,5 mil.
O desmoronamento da fossa soterrou e matou o pedreiro autônomo Antônio Ferreira dos Santos, 64 anos, e, posteriormente, o tenente Matheus Augusto Bercke, 28 anos, e o sargento Wesley Ferreira, 36 anos, que comandavam a operação de resgate. Quando o corpo do pedreiro foi encontrado na manhã de ontem, não apresentava nenhum tipo de equipamento de segurança. Ele estava vestido com roupas normais e um boné, usado, provavelmente, para se proteger do sol.
Após o primeiro acidente, a Defesa Civil acionou a autarquia para que realizasse o serviço de sucção do líquido da fossa. “O nosso caminhão não deu conta, foi necessário outro caminhão, de Agudos”, relata, frisando que o serviço, no final, teve de ser concluído com bomba pequena, mas que 95% da água da fossa foi retirada.
Segundo Câmara Filho, a Defesa Civil e os bombeiros optaram por fazer uma abertura próxima da fossa para facilitar o resgate. “Foi feita uma escavação, quando a gente notou que estava próximo ao terreno molhado da fossa que estava sendo aberta, os bombeiros desceram para fazer a escavação manual. Foi aí que houve o segundo desmoronamento, que soterrou os oficiais.”
Normas
A diretora de Planejamento do DAE, Nucimar Paes, afirmou que o projeto de construção de uma fossa deve atender as normas 7.229 e 13.969 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). “Como a fossa é muito úmida, ela tem que ser bem construída. De alvenaria, seguindo as regras. Ele (pedreiro) estava cavando um buraco praticamente no meio do tanque e do sumidouro.” A autarquia não aprova projetos de construção de fossa onde tem rede coletora de esgoto. Cabe às autoridades sanitárias fazerem a fiscalização.
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Meio ambiente
A existência de fossa na área urbana, onde é possível instalar rede coletora de esgoto, é irregular na opinião de Álvaro de Brito, coordenador da Defesa Civil de Bauru. Mesmo que o sistema de fossa tenha sido implantado quando não havia canalização dos dejetos, ele chama a atenção para a questão ambiental. “Como não existe direito adquirido quanto ao meio ambiente, acredito que há necessidade de se adequar às novas leis que prevêem a coleta e o tratamento de esgoto”, frisa Brito.
Ele entende que o condomínio está irregular ao despejar o esgoto em fossas. Ele ressalta que o próprio Departamento de Água e Esgoto (DAE) já propôs a coleta dos dejetos das casas do condomínio na rede de esgoto, o que não foi aceito.
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Bauru tem 594 fossas
Em Bauru, a estimativa é que ainda existam 594 fossas sépticas espalhadas pelo Jardim Santos Dumont, Núcleo Quinta da Bela Olinda, Residencial Shangrilá e jardim Paineiras, onde ocorreu o acidente. Cerca de 1,5 mil imóveis possuem esse tipo de sistema de tratamento do esgoto.
A fossa nada mais é do que um tanque enterrado, que recebe os esgotos (dejetos e líquidos), retém a parte sólida e inicia o processo biológico de purificação da parte líquida (efluente), que é mandada para o sumidouro, onde esses efluentes são infiltrados no solo para completar o processo biológico de purificação e eliminar os riscos de contaminação. O tamanho da fossa séptica depende do número de pessoas da moradia. Ela é dimensionada em função de um consumo médio de 200 litros diários de dejetos por pessoa.
De acordo com informações da diretora de Planejamento do DAE, Nucimar Paes, em 1996 a autarquia fez dois projetos de instalação da rede de esgoto, um para o Residencial Paineiras e outro para o Samambaia. “O último fez um acordo com o DAE, pagou e a autarquia executou o serviço. Já o Paineiras, não sei dizer porque, não nos procurou para fazer acordo. Nós já estivemos duas vezes conversando sobre isso, mas não chegamos a um acordo por causa do transtorno que vai causar em função do pavimento. Lá é paralelepípedo e o DAE só pode repor o asfalto. Inclusive até o final do ano passado estávamos tratando com eles. Chegamos a mandar uma correspondência para eles, porque o DAE tem interesse em fazer. Mas não obteve resposta.”