Na última quarta-feira, Ney Matogrosso completou dois anos de “Inclassificáveis”. Marcada pelo figurino extravagante e comportamento atrevido do cantor, além da priorização do pop rock, a turnê está em sua reta final com a chegada de “Beijo Bandido”, novo trabalho do intérprete. Hoje à noite, os fãs de Bauru terão a oportunidade de ver uma das últimas apresentações de “Inclassificáveis” que deve passar, durante o mês de outubro, por suas últimas seis cidades. O show será na Sagae Eventos, a partir das 23h.
Prova de que é possível se reinventar aos 68 anos e 35 de carreira, “Inclassificáveis”, além de sucesso entre os fãs e aclamado pela crítica, representa,, para o próprio Ney, um dos pontos altos de sua carreira artística. “Eu tive outros bons momentos na minha carreira, mas esse é um dos que eu daria destaque”, avaliou o cantor, em entrevista ao JC Cultura. Em Bauru desde ontem, Ney recebeu a reportagem do JC e, por quase uma hora, falou sobre a turnê e o show desta noite, além de dar detalhes sobre o novo disco, sua carreira e a relação com a música.
“Inclassificáveis” trouxe de volta aos palcos um Ney extrovertido, performático e que, desde 1999, com “Olhos de Farol”, não promovia tantas “estrepolias” no palco. “Todos estavam saudosos dessa coisa mais extravagante e extrovertida, que não pensavam que uma pessoa com a minha idade ainda fosse capaz de fazer”, considera. “Muitos, certamente, pensavam que eu fosse pendurar as minhas chuteiras e ficar de pijaminha dentro de casa”, completa.
Ele ainda avisa. “Quem pensa isso de mim perde seu tempo, porque eu só vou parar a hora que eu for impossibilitado pelo tempo. Enquanto isso não acontecer esperem loucuras, porque eu as farei.”
Muito crítico consigo mesmo, Ney - que inclusive dirige o show e assina a iluminação, com Juarez Farinon - diz não esperar que os outros apontem seus pontos fracos. “Se fiz o show dessa maneira é porque ainda me garanto e vejo que ainda posso botar uma roupa daquelas. Se não pudesse, eu não poria, não ia esperar que ninguém me dissesse isso”, comenta sobre o figurino, que inclui um macacão dourado de tule elástico - com mais de 40 mil micropaetês - e outra roupa cor de pele e “tatuada” com pinturas corporais de índios amazônicos, que dá a impressão de Ney estar nu. O responsável é, mais um vez, Ocimar Versolato, que também assina a direção artística do novo CD do cantor.
Apesar do espetáculo que promove no palco, o artista contesta aos desavisados. “Não sou só performance. Sou uma pessoa que oferece mais do que isso; sou cantor e, apesar de já ter tido dúvidas quanto a isso um dia, hoje em dia, eu acredito”, afirma. “As pessoas falavam que eu fazia sucesso porque ficava nu. Um dia, eu vesti um terno e fui cantar, então me convenci de que sou cantor”, atesta.
Roteiro
O show “Inclassificáveis” está materializado em um DVD, registrado ao vivo no Rio de Janeiro, e no CD, de mesmo nome, no qual o cantor gravou, em estúdio, as canções mais representativas do repertório selecionado para a turnê. São trabalhos de uma nova safra de compositores, incluindo Dan Nakagawa (“Um Pouco de Calor”), Pedro Luís (“Fraterno”), Mauro Kwitko (“Mal Necessário”), Marcelo Camelo (“Veja Bem, Meu Bem”), Iara Rennó e Alice Ruiz (“Leve”).
Há também composições de nomes consagrados, como Cazuza (“O Tempo Não Pára” e Por que a Gente é Assim”, com Frejat e Ezequiel Neves), Arnaldo Antunes (a faixa-título), o uruguaio Jorge Drexler (“Sea”), Itamar Assumpção (“Ouça-me”, com Alice Ruiz), Chico Buarque e Edu Lobo (“Ode aos Ratos”), Caetano Veloso e Gilberto Gil (“Divino Maravilhoso”), entre outros. No palco, Ney é acompanhado por Carlinhos Noronha (baixo), Júnior Meirelles (guitarra e violão), Sérgio Machado (bateria), DJ Tubarão (percussão e pick-up), Felipe Roseno (percussão).
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Novo trabalho chega em outubro
Oposto de “Inclassificáveis”, “Beijo Bandido”, novo trabalho de Ney Matogrosso, já está pronto e deve ser lançado no próximo mês. Ao invés da banda roqueira, ele é acompanhado de piano, violino e percussão. O novo CD de estúdio é, de acordo com o cantor, um exercício de contenção.
“‘Beijo Bandido’ também vai ter uma performance, mas muita mais contida. O repertório é superdifícil e o disco tem um sonoridade muito atraente”, adianta. “Continua pop no sentido de ter tango, bolero, canção brasileira e um quê jazzístico e rock. Tem também uma canção do Astor Piazzola (‘As Ilhas’), que ele fez para mim em 1975. Gravei no meu primeiro disco solo, mas nunca cantei, por isso regravei”, conta.
O repertório inclui clássicos do cancioneiro popular, caso de “Segredo” (Herivelto Martins/Marino Pinto), “A Bela e a Fera” (Chico Buarque/Edu Lobo), “De Cigarro e Cigarro” (Luiz Bonfá) e “Tango para Tereza” (Evaldo Gouveia/Jair Amorim), e ainda hits do pop e rock também nacionais, como “Nada por mim” (Herbert Vianna/Paula Toller) e “Mulher sem Razão” (Cazuza/Dé/Bebel Gilberto). Destaque ainda para a inédita “A Cor do Desejo” (Junior Almeida/Ricardo Guima).
Sacramentando a parceria de mais de 10 anos, - iniciada com a criação dos figurinos de “Estava Escrito” -, Ocimar Versolato está presente no trabalho, responsável pela direção artística do projeto gráfico. “Temos muitas afinidades, então é fácil realizarmos um trabalho juntos. E quando digo junto é junto mesmo, decidimos e conversamos tudo até chegar a um termo”, comenta Ney.
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‘Tive medo de ser rejeitado’
Em 2001, às vésperas de comemorar 60 anos, Ney Matogrosso conta ter passado por sua primeira e única “crise de idade”. “Eu nunca tive problema com relação à idade, mas quando estava beirando os 60, que era para mim uma idade muito emblemática, não sabia como iria ser. Pensava: ‘vou ter que virar outra pessoa? Será que eu não vou poder mais me vestir como eu me visto?’”, recorda, trajando sua combinação preferida: jeans e camiseta. “Depois, vi que não mudou nada. Na verdade, percebi que a mudança tem que vir de dentro e não de uma preocupação com os outros, do que vão pensar”, completa.
Apesar de despreocupado com críticas e rótulos, o artista confessa já ter sentido medo de seu trabalho não ser compreendido. “Eu tive medo de ser rejeitado, no primeiro momento, embora eu tivesse necessidade de me expressar daquela maneira. Pensava: ‘eu acho que as pessoas vão me rejeitar, vão me achar demais, não vão suportar’. Mas, percebo que as pessoas sempre tiveram e tem até hoje uma enorme abertura para o meu trabalho e para mim”, avalia.
“Não precisamos nos submeter a caminhar sobre trilhos pré-estabelecidos, por quem? Como ninguém tem reposta para isso, não me interessa caminhar sobre eles. Vou viver minha vida experimentando tudo que me interessar”, completa.
Segundo Ney, acima de qualquer coisa, o norte do seu trabalho é fazer aquilo que, de alguma forma, desperte seu interesse. “Eu vou tentando fazer coisas que me mantêm interessado. Em todos os meus trabalhos até hoje o elo foi simples: sempre busquei que fossem diferentes, mas que me mantivessem interessado. A primeira pessoa que eu quero que goste daquilo sou eu. Estando seguro do meu trabalho é que conseguirei agradar o público”, afirma.
“O que me interessa é meu contato com o público. Isso me faz mexer em um trabalho. Sempre testo, e se percebo que alguma coisa tem dificuldade para ser compreendida pelo público, eu tiro. Sou muito objetivo, por mais que eu goste da música”, conclui.
• Serviço
Ney Matogrosso apresenta “Inclassificáveis” hoje, a partir das 23h, na Sagae Eventos. Abertura dos portões marcada para 21h. Mesas e ingressos à venda no Bauru Tênis Clube, Bunny’s, Red Surf, Flipper Lanches e Pret-a-Porter. A Sagae Eventos fica na rua Ignácio Conceição Vieira, às margens da rodovia Bauru-Jaú. Informações: (14) 3104-5655.