Pois é, faz dez anos que o velho nos deixou. Parece que foi ontem, mas eu não quero que esta seja uma data de tristeza, quero a comemoração de uma vida bem vivida, carpe diem, meu velho viveu cada momento com a intensidade do último e com aquele brilho de menino nos olhos.
Posso afirmar nestes dez anos, que o luto passa por várias fases na vida das pessoas, a primeira é a incredulidade, nunca acreditamos que aquela pessoa presente na nossa rotina possa desaparecer de um dia pro outro, segundo é o desespero, nos conscientizamos da perda e nos questionamos como vamos conseguir seguir em frente, o terceiro é a saudade doída, a ausência se torna intensa, mas sabemos que vamos sobreviver. A quarta é o costume, começamos a nos acostumar com a ausência e vemos que podemos ser até felizes, a última é a memória, as lembranças aparecem nas conversas, nas festas e lembrar-se daquela pessoa nos diverte e nos conforta. Então para aqueles que estão nas fases anteriores eu posso afirmar, calma, vai passar. Sem querer dar uma de carola,. São Paulo (o apóstolo) tem razão quando diz que tudo o que sobra das relações mais intensas é o Amor. Em família, não podemos fingir, aprendemos a conviver, brigar, amar, odiar, rebelar. E entre erros e acertos, sempre prevalece o Amor, e isto é divino e maravilhoso.
Vamos então comemorar a existência deste homem, que desde criança quis ser jornalista quando os pais queriam que ele fosse comerciante e achavam que jornalismo era profissão para boêmios e vagabundos. Ele então se enfiou em bibliotecas pra ler, pra escrever, pra desenhar, se alistou no exército e, no Rio de Janeiro, onde conheceu minha mãe Victória, foi ser compositor de trilhas sonoras das novelas da Rádio Nacional, além de escrever pro jornal do exército. Casou, veio morar em Bauru, teve três meninas, Laura, Josiane e eu. Nunca conseguiu ter o Luiz Antonio. Teve que enfrentar a convivência com calcinhas, soutiens, absorventes, cólicas de menstruação e TPMs. Muitas vezes, em seus arroubos de autoridade jogava as calcinhas que deixávamos lavadas e penduradas no banheiro pela janela, eu e minhas irmãs tínhamos que pescar as calcinhas e dava uma raiva danada, mas esta vontade de ter filho homem, contou a nosso favor, ele nos levava a partidas de futebol, pra pescar, acampar, nadar, furar ondas, andar de bicicleta, e comprou um jogo de pebolim que era um sucesso. Havia os jogos de botão, e coleção de figurinhas, soltar pipa e bolinha de gude, pra ser bem sincera, Luiz Antonio não fez a mínima falta, éramos bem melhores. Ele uma vez confessou que sempre adorou ter só meninas, que homem era sempre muito machista e previsível. Nos ensinou a nunca depender de homens, queria nosso sucesso na carreira que fôssemos escolher, queria filhas inde-pendentes , honestas e felizes.
Ser filha do Broncolino não era tarefa muito fácil, as pessoas te amariam ou odiariam. Ele como jornalista crítico não poupava ninguém, havia sempre um processo, ou uma queixa, uma mágoa. Ao relermos sua coluna no jornal, nos deparamos com 40 anos da História da nossa cidade, e isto com um estilo único, criativo e genial.. Ele era genial. Não digo isto por ele ter morrido. Escrever humor, com a ironia e trocadilhos que ele fazia diariamente, muitas vezes me fazia perguntar como ele conseguia. E foi assim até a dia de sua morte, em 20 de julho de 2000, sendo enterrado, e sua coluna saindo no jornal.
Fechou a vida com chave de ouro!!!
Modéstia nunca foi seu forte, ele sabia que era competente e único no que fazia. Dizia que não sabia o porquê, mas Deus o amava, pois ele fez tudo o que quis na vida. Me lembro ele brincando de Zorro com minha filha Gabi, os dois de máscara, capa e os talheres da mamãe de espada, a Gabi quis o cavalo do Zorro, o Tornado, papai ficou no chão e ela em cima, perguntei o que diriam aqueles que não gostavam dele, de vê-lo de cavalo, ele riu, e com aquele brilho nos olhos, disse que morreriam de inveja pois era um avô adorado pelos netos.
Adorava ser paparicado, e nos mimou bastante. Era briguento, bravo, muitas vezes rabugento e também, carinhoso, engraçado e justo. Ele tinha a virtude de perdoar e não guardar mágoa das pessoas, era na verdade um coração mole. Continuará pra sempre vivo na memória de Bauru e no coração daqueles que o amavam. Se puder me ouvir, e sei que me ouve, quero declarar, meu orgulho, meu amor, minha saudade e pedir perdão por algumas lágrimas que teimam em cair. Segue em paz velho menino dos olhos azuis.
Valéria Cristina Santos Garbelotti, professora, dramaturga e atriz.