Apontada por muitos como o principal fator responsável pela má qualidade do ensino na rede estadual, a progressão continuada está sendo reformulada pela Secretaria Estadual de Educação para entrar em vigor com mudanças a partir do próximo ano, focando principalmente nas atividades de recuperação para os alunos que não conseguem acompanhar o patamar de aprendizagem mínimo exigido de suas turmas.
Apesar das críticas de professores e do assunto ter ocupado o centro das discussões durante a disputa eleitoral para o governo de São Paulo em 2010, o secretário de Educação, Herman Voorwald - que esteve em Bauru ontem para reuniões de trabalho com professores -, diz que a situação do setor no Estado não está entre as piores do País e aponta que o problema é de abrangência nacional.
"São Paulo está bem posicionado e tem os melhores educadores, mas isso não adianta se o conjunto não é bom. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) tem destacado a educação como prioridade na sua administração", afirma.
Quanto ao sistema de ciclos e de progressão continuada nas escolas, Herman afirma que ele é adotado nos Estados mais bem avaliados e é recomendado, inclusive, pelo Ministério da Educação (MEC).
Em relação às críticas feitas pelo candidato derrotado ao governo no ano passado, Aloísio Mercadante (PT), o secretário adjunto da Educação, João Cardoso Palma Filho, lembra que o sistema foi implantado plenamente pela primeira vez na administração petista da ex-prefeita de São Paulo, Luiza Erundina.
O secretário de Educação, porém, reconhece que existem falhas no sistema de progressão continuada vigente na rede estadual. "Não podemos dizer que ele foi mal implantado, mas as atividades de recuperação para os alunos não são feitas de forma imediata. A partir do ano que vem, algumas mudanças vão ocorrer e estamos discutindo o assunto com os profissionais de educação da nossa rede", garante Herman.
Aperfeiçoamento
O objetivo da secretaria é aperfeiçoar o sistema existente para que os alunos aprendam e o ensino não seja defasado. Já em 2012, o Ensino Fundamental será reorganizado em quatro ciclos, sendo o primeiro com duração de três anos (para alunos com 6, 7 e 8 anos de idade); o segundo com duração de dois anos (9 e 10 anos de idade) e o terceiro com quatro anos de duração (11 aos 14 anos de idade).
Além disso, Herman explica que avaliações de aprendizado serão aplicadas e conduzidas pela própria escola, com orientação da equipe de supervisão da Diretoria Regional de Ensino ao final de cada bimestre. Aos alunos com defasagem no aprendizado serão obrigatoriamente oferecidos estudos de recuperação, a serem estruturados de acordo com as condições de cada escola.
"Vamos garantir que a recuperação se dê no momento certo. Em algumas unidades, essas atividades vão ser realizadas no período em que os estudantes não estiverem em aulas", aponta o secretário.
De acordo com a Secretaria, ao final de cada ciclo, caso o aluno ainda apresente defasagem no aprendizado, será submetido ao reforço intensivo, em salas especiais. Ao final dos esforço, a escola poderá entender que o estudante com defasagem pode ser matriculado no ciclo seguinte, desde que no contraturno para que curse obrigatoriamente os conteúdos necessários.
Aprovação automática
O acompanhamento constante e a implementação de atividades diversificadas, com número reduzido de alunos em sala, é o modelo que deve ser adotado nas atividades de recuperação paralela para que o sistema de progressão continuada dê certo, na avaliação da professora Suzi da Silva, diretora estadual do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp).
"Não adianta o professor apenas repetir o conteúdo para 35 alunos com dificuldade, nos moldes de sala de aula tradicional. A avaliação bimestral já acontece, mas a estrutura de acompanhamento dos alunos é que deve ser revista e isso demanda investimentos que não foram feitos para que o sistema funcionasse", aponta Suzi.
A diretora do sindicato afirma que se antes existia a exclusão de crianças e adolescentes da escola, hoje muitos continuam excluídos dentro das salas de aula. "A progressão continuada se tornou aprovação automática e o aluno com dificuldades não consegue acompanhar o conteúdo em sala de aula, fica desmotivado e opta pela indisciplina", acredita.
Segundo o professor do Departamento de Educação da Faculdade de Ciências, da Unesp-Bauru Antonio Francisco Marques, os profissionais não foram preparados para uma nova proposta no processo ensino-aprendizagem.
"A escola era seletiva e excludente e a progressão foi criada, a partir de estudos científicos, com o objetivo de universalizar e democratizá-la. No entanto, a estrutura necessária para que isso desse certo não foi oferecida e todos ficaram sem rumo", avalia.
Manter o aluno na escola, mas também garantir seu aprendizado, é o grande desafio para a Educação. "A avaliação constante dos alunos e a mudanças de paradigmas em uma estrutura escolar pensada no final do século XIX são fundamentais", afirma.
Professores reivindicam melhorias
O secretário de Educação do Estado de São Paulo, Herman Voorwald, esteve em Bauru ontem, na sede da Luso Brasileira, para discutir com professores da rede estadual propostas de reestruturação do atual modelo educacional e ouvir as reivindicações da categoria. Cerca de mil participantes estiveram no encontro.
"Estamos promovendo essas reuniões em todos os 15 polos do Estado e o retorno está sendo muito positivo. Os educadores estão nos entregando documentos muito ricos, com análises pedagógicas e administrativas da rede", afirma Herman.
Diretora estadual da Apeoesp, Suzi da Silva classifica o encontro como uma conquista, já que, na última administração estadual, o canal de diálogo entre a Secretaria de Educação e os professores era praticamente nulo.
"O secretário nos animou com a sua postura. Ele está aberto para conversar. Esperamos que nossas reivindicações cheguem ao governador Geraldo Alckmin e sejam atendidas", explica Suzi. Ela entregou um documento ao secretário com sugestões e reivindicações, que vão de encontro à políticas de valorização do professor, incluindo melhorias no plano de carreira e nos salários dos profissionais da educação.
"Temos um plano de carreira que data o ano de 1997. Ou seja, completamente ultrapassado. Desejamos que o professor seja contemplado por uma evolução funcional mais ampla, que ofereça mais chances dele crescer visando o avanço profissional e salarial."
O salário é um ponto central das exigências: o sindicato requer a reposição salarial de 36,74% da categoria. Outro ponto das reivindicações prevê a incorporação das gratificações, inclusive aos aposentados. Atualmente, segundo Suzi, o Estado paga entre R$ 8,00 e R$ 10,00 pela hora-aula. O secretário, porém, não quis comentar sobre propostas de reajustes e afirmou que a questão está sendo discutida com o governador Geraldo Alckmin.
A realização de mais concursos públicos para professores de todas as disciplinas e todos os níveis é outra reivindicação do sindicato. Segundo o governador, 9.304 professores foram contratados em concurso do ano passado e outros 25 mil serão chamados para assumir seus cargos no próximo ano.
A professora Josiane Cristina Tripodi, de 32 anos, ministra aulas para o Ensino Fundamental em uma escola pública estadual no Parque Júlio Nobrega. Ela elogiou o discurso do secretário da Educação e afirmou depositar confiança em seus projetos. O principal empecilho na carreira, para ela, é a falta de retorno por meio de remuneração mais satisfatória.
Secretário se nega a
falar sobre TV Unesp
Ex-reitor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), o atual secretário estadual da Educação Herman Voorwald se esquivou ao ser questionado ontem, em Bauru, a respeito da crise da TV Unesp, que recebeu investimentos, sede própria e contratou funcionários, mas ainda não iniciou suas transmissões.
Herman alega que, como secretário da Educação, não lhe cabe comentar o assunto, que na avaliação dele é de competência apenas do atual reitor, Júlio Ceezar Durigan.
Apesar de não ter sido criada durante a gestão de Herman, a TV Unesp se desenvolveu ao longo dela, mas com a chegada do novo reitor, sofreu mudanças em suas diretrizes e foi vinculada à Faculdade de Arquitetura Artes e Comunicação (FAAC).
"A TV não pode ser isolada do campus. Sempre acreditei que ela deve ser um braço da formação dos estudantes. Posso dizer que essa sempre foi a ideia, mas não sei de mais novidades a respeito", afirmou um embaraçado secretário.
Os problemas envolvendo as atividades da TV Unesp foram revelados com exclusividade pelo Jornal da Cidade em setembro do ano passado. Desde então, o JC vem acompanhando o caso e seus desdobramentos na Justiça.