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Todo gago consegue falar fluentemente

Adilson Camargo
| Tempo de leitura: 4 min

Em algumas situações, o gago não parece que é gago. Geralmente, quando ele está relaxado ou quando usa a memória, a fluência beira os 100%.

A explicação para isso, segundo a fonoaudióloga Liliane Campos Stumm, é que existe todo um aspecto emocional associado à gagueira. Embora, ele não seja forte o suficiente para, sozinho, causar o problema, tem seu peso.

"Todo gago tem situações de fala que eles são fluentes. Por exemplo, quando ele fala sozinho, quando fala com um animal, porque existe o aspecto emocional envolvido. Mas só esse aspecto não justificaria toda quebra de fala. Essa quebra acontece porque a pessoa perde o sinergismo necessário para falar bem", explica.

Quando o gago canta ou memoriza a fala de algum personagem, a disfluência praticamente desaparece porque são atividades que estimulam outras áreas cerebrais para a produção da fala, como a memória.

"Quando cantamos, recitamos ou atuamos em alguma peça de teatro ou na novela nossa fala está toda memorizada. Não precisamos programá-la porque ela está pronta", afirma. Liliane cita o ator Murilo Benício e o apresentador Sílvio Santos como dois gagos famosos, cuja deficiência passa despercebida pelo público.

O maestro da Orquestra de Violas de Itapuí, Gilson Sebastião, 36 anos, é gago desde os 12 anos. Há mais de dez anos, ele é o puxador do samba-enredo da escola Unidos da Bica. Quem o ouve cantar não imagina que ali está um gago, tamanha a perfeição da fluência.

Para aqueles que a mesma dificuldade com a fala, Gilson dá uma dica que funcionou com ele. "Eu falo muito olhando para o espelho e com um microfone ligado numa caixa de som. É o melhor remédio", recomenda.

Faz quatro anos que ele pratica dessa forma. Desde então, garante que melhorou bastante. "Eu era muito mais gago. Hoje, estou dez vezes melhor", comemora.

O professor de jiu-jitsu Ricardo Pereira convive com a disfemia desde os 6 anos. Embora tenha aprendido a lidar com o problema, ainda hoje sente dificuldades para se expressar quando está nervoso ou estressado. Segundo ele, as palavras saem todas "atropeladas".

Mas quando ele está calmo, isento de qualquer tipo de pressão, a fala é normal. Ricardo não encontra nenhum problema para dar as aulas de jiu-jitsu. Além disso, está casado há nove anos e tem um filho de 5 anos. "Tenho uma vida normal. A disfluência não me atrapalha em nada", afirma o ex-lutador, cinco vezes campeão paulista de jiu-jitsu e quarto colocado em dois torneios mundiais.

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?Ninguém é 100% fluente?, pondera fonoaudióloga

Todos têm seu momento de gagueira. Ninguém tem fluência normal o tempo todo. Quando expostos a situações inesperadas, estressantes, constrangedoras e de forte ansiedade é normal gaguejar.

A diferença, segundo a fonoaudióloga Simone Herrera, é que em algumas pessoas a disfluência é mais frequente por inúmeras razões.

E o que fazer diante de uma pessoa que está gaguejando? A primeira atitude é manter o olhar fixo nela. Segundo Simone, é importante não dispersar a atenção enquanto conversa com um gago. "Se olhar para o relógio, por exemplo, ele vai pensar que você está ansioso para parar de falar com ele", revela.

De acordo com ela, uma das coisas que os gagos mais reclamam é que quando começam a gaguejar as pessoas deixam de prestar atenção.

Outras práticas que devem ser evitadas a todo custo é falar para a pessoa respirar fundo ou falar devagar. "Seja paciente, dê tempo para a pessoa terminar a fala dela. Jamais complete o que ela quer dizer. Isso deixa o gago muito irritado", orienta.

A fonoaudióloga Liliane Campos Stumm diz que ainda existe muito preconceito contra quem apresenta disfluência. Segundo ela, tudo o que foge ao padrão de normalidade é visto como algo horrível. "O gago não é gago porque ele quer, mas porque existe uma falta de controle na base neuromotora da fala e é isso que determina a disfluência", argumenta.

"Sabemos que quem é gago sofre muito, a família toda sofre. Por isso, queremos que as pessoas sejam melhor informadas", diz Liliane. Por conta do preconceito, a partir do momento que a pessoa começa a apresentar disfluência, ela passa a cobrar a si mesma e isso pode gerar problemas emocionais.

De acordo com a fonoaudióloga, todo mundo quer ser bem visto na sociedade. Por isso, o tratamento é importante para o enfrentamento do problema e para a pessoa acreditar na potencialidade da fala dela.

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