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A ?nossa China? no coração de Bauru

Vinicius Lousada
| Tempo de leitura: 6 min

Enquanto a presidente Dilma Rousseff finaliza sua visita oficial à China em busca de acordos econômicos, os imigrantes chineses em Bauru já conquistaram seu espaço no comércio da cidade, especialmente no quadrilátero composto pelas ruas Gerson França, Gustavo Maciel, Ezequiel Ramos e avenida Rodrigues Alves. Basta caminhar por poucos minutos pelo Centro da cidade para encontrar chineses ou chinesas trabalhando ou circulando por lá.

Segundo levantamento do Jornal da Cidade, o número de estabelecimentos comerciais de propriedade de imigrantes da China triplicou nos cinco anos no coração do comércio de Bauru. Além disso, os negócios chineses mudaram de perfil: as pastelarias e lanchonetes cedem espaço, cada vez mais, para lojas de bijuterias e de biscoitos e doces. No entanto, não há dados oficiais a respeito de quantos são os chineses que vivem na cidade.

Muito tímidos e reservados, nenhum desses comerciantes concordou em conversar com a equipe de reportagem, mas empresários vizinhos contaram ao JC sobre algumas características desses imigrantes, que parecem estar em todos os cantos da região central de Bauru.

Apenas na quadra 5 da Rodrigues Alves existem três estabelecimentos de proprietários chineses, entre lanchonetes e lojas especializadas em doces e bolachas. Quando abordados com um pedido de entrevista, os comerciantes da China demonstram-se arredios e conversam entrei si em sua língua natal, dando ao repórter apenas uma reposta: ?hoje não?.

Vizinho de comércio de chineses há 13 anos, um cabeleireiro afirma que esse comportamento "fechado" é notado no convívio do dia a dia. "É costume entre os colegas conversar sobre o movimento, sobre amenidades, mas com eles não tem muito papo porque são muitos desconfiados", conta o empresário que prefere não se identificar.


Expansão


Ele destaca o grande salto no número de comércios chineses, especialmente nos últimos cinco anos, e a mudança no ramo de atuação dos imigrantes. "Antes eles tinham alguns pontos na cidade, mas eram poucos e todos eram pastelarias e lanchonetes. Já os novos estabelecimentos são lojas de doces na Rodrigues e de bijuterias no Calçadão", aponta o cabeleireiro.

A mudança deve estar surtindo efeitos positivos para os chineses do ponto de vista financeiro. Enquanto pastelarias e lanchonetes em grande número disputam o grande fluxo de consumidores no Centro, as lojas com todos os tipos de doces estão sempre cheias, bem como os estabelecimentos do segmento de bijuterias e acessórios femininos, quase todos fabricados na própria China, adquiridos por baixos valores e comercializados por valores que garantem lucros que, muitas vezes, ultrapassam a taxa de 100%.

Outra empresária do Centro de Bauru comenta as características dos comerciantes chineses. "Já fiz negócio com um deles, que pagou todo o valor pela aquisição do ponto comercial em dinheiro. Eles têm uma forma muito característica de administrar seus empreendimentos", observa, garantindo que os chineses são bons vizinhos comerciais, que não causam qualquer tipo de transtorno.

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?Jeitinho chinês?


Quando entrar em um estabelecimento comercial atendido por chineses, esqueça o jeito típico de atender dos vendedores brasileiros. Os chineses são práticos e reservados.

"A gente chega, pega algum produto e eles já vão falando os preços. Muitas vezes, começam a falar em chinês entre eles e a gente fica sem entender nada", brinca a dona de casa e universitária Mely Freitas.

A empregada doméstica Rosana dos Santos, porém, afirma que não vê diferenças quando compra em uma loja de chineses ou de brasileiros. "Acho que já me acostumei e não tenho dificuldade de entender o que falam. Não faço grandes compras, mas sempre entro aqui para levar alguma coisinha", diz ao sair de uma das lojas de biscoitos e doces da Rodrigues Alves.

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Parentes


Muito pouco se sabe sobre a vida desses imigrantes, que tomaram conta de parte do comércio de Bauru. No entanto, "vizinhos de ponto" relatam que todos são muito unidos e muitos possuem grau de parentesco entre si.

"É muito comum tio e sobrinho ou até mesmo irmãos abrirem lojas uma do lado da outra ou na mesma quadra. Em alguns casos, são comércios que atuam no mesmo ramo porque os chineses costumam investir no que eles percebem que já está dando certo e é rentável", comenta um comerciante.

Uma funcionária de uma das lojas de bijuterias, de propriedade de família chinesa, conta que seu patrão abriu o estabelecimento devido ao sucesso dos negócios de um amigo que atua no mesmo ramo, a poucos metros de seu ponto comercial.

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País é o 2º em importações bauruenses


Não são apenas os imigrantes chineses que invadiram a cidade de Bauru. De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, de janeiro a março de 2011, os produtos chineses ficaram em segundo lugar entre os mais importados na cidade, ficando atrás apenas da Alemanha e superando os Estados Unidos e países vizinhos, como a Argentina. No entanto, o mesmo não acontece no sentindo inverso, pois a China não está sequer na lista dos 30 países para os quais Bauru mais exporta.

Ainda pelo comércio da região Central, não há qualquer dificuldade em adquirir produtos fabricados em indústrias chinesas. A lista parece não ter fim: são utensílios domésticos, eletrônicos, brinquedos, guarda-chuvas, roupas, bolsas, calçados, bijuterias etc. Jociane Sales é gerente de uma loja de variedades e confirma a presença maciça de mercadorias de origem chinesa e a alta procura por esses produtos. "A diferença nos preços chega a 30%. Não tem como não fazerem sucesso", aponta.

No entanto, há consumidores que apresentam restrições ao adquirir produtos de origem chinesa. "Já comprei algumas ferramentas, mas não valeu a pena, porque custa mais barato mas a durabilidade é menor. Usei duas vezes e já não dava mais", conta o aposentado José Carlos Mathias de Oliveira.

O diretor da regional de Bauru do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), Domingo Malandrino, afirma, porém, que a tendência de importação de mercadorias chinesas de baixa qualidade tem sido revertida nos últimos anos.

"Em razão de questões tributárias e de legislação trabalhista mais flexível na China, muitas empresas multinacionais têm se instalado por lá e os chineses estão tendo acesso a essas tecnologias."

Enquanto importa produtos industrializados, grande parte da exportação do Brasil para a China está relacionada a commodities, como produtos agrícolas e minerais. De acordo com o coordenador do grupo de Comércio Exterior do Ciesp, Andrey Valério, o País deve manter relações comerciais estreitas com a China, mas deve rever algumas políticas.

"A visita da presidente é muito importante. Ela foi para vender tecnologia brasileira, como é o caso dos aviões. Esse é o caminho: não temos que exportar soja, pois é mais vantajoso exportar a soja processada ou o óleo de soja. O Brasil precisa pensar mais em si nas negociações, que o que todos os outros países fazem e não estão errados por isso." A importação de alguns produtos chineses, porém, já é regulada pelo governo brasileiro, como roupas e calçados.

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