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A história de Thomas Midgley Jr.

Paulo Cesar Razuk
| Tempo de leitura: 3 min

Em várias ocasiões, para descontrair o ambiente "térmica e matematicamente carregado", contava aos meus alunos a história do engenheiro Thomas Midgley Jr. O mundo teria sido um lugar mais seguro se ele tivesse seguido essa carreira, mas,em vez disso, Midgleydesenvolveu um interesse especial pela Química In-dustrial. Em 1921, trabalhando para a General Motors, em Dayton, Ohio, investigou um composto químico denominado chumbo tetraetila e descobriu que ele reduzia substancialmente a "batida de pino" do motor, por retardar a queima do combustível durante a fase de compressão ou por seu poder antidetonante. Até poucos anos atrás o chumbo podia ser encontrado em todo tipo de produto de consumo. Os alimentos vinham em latas fechadas com solda de chumbo. A água costumava ser armazenada em tanques revestidos de chumbo. Na forma de arseniato de chumbo, era borrifado nas frutas como pesticida. O chumbo fazia parte até dos tubos de pasta de dente. Dificilmente um produto deixava de trazer um pouco de chumbo para a vida dos consumidores, no entanto, nada o tornou mais familiar do que seu acréscimo à gasolina.

O chumbo é uma neurotoxina muito nociva; absorvido em excesso pode danificar irreparavelmente o cérebro e o sistema nervoso central. Entre os muitos sintomas, associados à superexposição ao chumbo, estão: cegueira, insônia, insuficiência renal, câncer, paralisias e convulsões. Por outro lado, ele era fácil de extrair e manusear e constrangedoramente lucrativo de produzir em escala industrial.

Ainda hoje muitos países usam o chumbo tetraetila em sua matriz de combustíveis. O Brasil o eliminou totalmente em 1992, mas desde 1989 perto de 99% do petróleo refinado no País já não usava esse aditivo. Como o chumbo fica para sempre, quem teve vida ativa em grandes centros urbanos, carrega perto de seiscentas vezes mais chumbo no sangue do que a população anterior à década de 20. Infelizmente, a quantidade de chumbo na atmosfera continua aumentando, sem nenhum impedimento legal, como resultado da mineração, da fundição e de outras atividades industriais.

Entusiasmado com o sucesso da gasolina com chumbo, Midgley voltou-se para outro problema tecnológico da época. Os refrigeradores na década de 20 costumavam ser terrivelmente arriscados, porque usavam gases perigosos que às vezes vazavam. Midgley resolveu criar um gás que fosse estável, não inflamável, não corrosivo e seguro de respirar. Como que misteriosamente predestinado a criar coisas nefastas, ele inventou os clorofluorcarbonos, ou CFCs.

Nunca um produto industrial foi adotado com tanta rapidez e com resultados tão desastrosos. Os CFCs entraram em produção no início da década de 30 e encontraram mil aplicações: de ares-condicionados e geladeiras a sprays de desodorantes; até que se descobrisse, meio século depois, que estavam devorando o ozônio da estratosfera.

Se distribuído uniformemente lá em cima, o ozônio formaria uma camada com apenas uns dois milímetros, mas, suficiente para absorver a perigosa radiação ultravioleta emanada do Sol. Só que os CFCs perduram por um longo tempo ? cerca de um século em média ? causando destruição enquanto isso: segundo Wayne Biddle (A fieldguidetotheinvisible ? NY ?Henry Holt), um quilo de CFC consegue capturar e aniquilar setenta mil quilos de ozônio atmosférico. Os CFCs têm outra característica perigosa: uma única molécula de CFC é mil vezes mais eficiente em exacerbar o efeito estufa do que uma molécula de dióxido de carbono. Em suma, segundo o citado autor, apesar dos clorofluorcarbonos se revelarem uma das piores invenções do século XX, ele continua sendo produzido ? perto de 27 mil toneladas por ano ? principalmente por multinacionais norte-americanas em várias partes do mundo.

O Brasil já reduziu em 95% o uso dos CFCs e espera congelar, até 2013, o crescimento doseu substituto: oshidroclorofluorcarbonos (HCFCs), que também comprometem a camada de ozônio, propondo bani-los totalmente até 2030. Midgley não soube disso tudo, porque morreu muito antes e sua morte foi memoravelmente incomum: após sofrer de paralisia, ele inventou um dispositivo envolvendo uma série de roldanas motorizadas que, automaticamente, o levantariam e o virariam na cama. Em 1944, quando a máquina entrou em operação, ele ficou embaraçado nas cordas... morreu estrangulado.


O autor, Paulo Cesar Razuk, é professor e engenheiro

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