Juiz de Fora - Passava das 11h15 da manhã de ontem quando o caminhão do corpo de bombeiros de Minas Gerais chegou à Praça Henrique Haldfeld, no centro de Juiz de Fora, trazendo o corpo do ex-presidente Itamar Franco.
As cerca de 400 pessoas que se aglomeravam em frente à Câmara Municipal começaram uma longa salva de palmas. Homenageavam o ex-prefeito da cidade, ex-governador do Estado, senador eleito em quatro ocasiões e ex-presidente da República morto na manhã de anteontem, aos 81 anos, vítima de um acidente vascular cerebral (AVC), decorrente de complicações no tratamento de uma leucemia.
O caixão que levava Itamar estava coberto com as bandeiras do País e de Minas Gerais.
O caminhão dos bombeiros seguiu em cortejo pelas principais ruas da cidade antes de parar na Câmara Municipal. O velório começou com um período de 10 minutos reservado à família.
Cerca de uma hora após o início do velório, uma nova salva de palmas foi iniciada pelas pessoas que aguardavam na fila para se despedir de Itamar. O motivo era a chegada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele veio acompanhado do vice-presidente, Michel Temer (PMDB), do ministro de Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, do também ex-presidente, José Sarney (PMDB-AP), e de mais 11 senadores.
Entre os senadores, estava o ex-presidente Fernando Collor de Mello (PTB-AL), cujo impeachment, em setembro de 1992, possibilitou que Itamar assumisse o comando da Nação. As palmas para Lula foram substituídas pelas vaias a Collor. Até gritos de "pega ladrão" vieram das pessoas que estavam na fila.
Durante pelo menos 20 minutos, os principais protagonistas do impeachment ficaram reunidos no local onde o corpo de Itamar era velado. Além de Collor, também estavam ali o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que na época presidia a União Nacional dos Estudantes (UNE), e o senador Pedro Simon (PMDB-RS), um dos líderes do movimento pró-impeachment de Collor no Congresso Nacional.
Emocionados, filhas e assessores mais próximos choram a morte
Por volta das 14h, foi a vez do presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), chegar ao velório para homenagear Itamar Franco. Lamentou a morte do senador e ex-presidente e fez uma longa reflexão sobre a relação de seu partido com Itamar Franco,
O PT não aceitou participar do governo de união nacional proposto por Itamar após o impeachment e se posicionou contra o Plano Real, em 1994.
Após a saída dos políticos, o velório passou a receber maior número de populares e amigos pessoais do ex-presidente.
Um dos que estavam mais emocionados era o então ministro-chefe da Casa Civil do governo Itamar, Henrique Hargreaves.
Acusado de participar de desvios durante a CPI do Orçamento, em 1993, Hargreaves foi afastado pelo então presidente. Quando se esclareceu que ele não estava envolvido em irregularidades, Itamar o renomeou no ministério.
No fim da tarde de ontem, uma cerimônia ecumênica emocionou os parentes do ex-presidente que estavam no velório. Georgiana e Fabiana, filhas de Itamar, choraram muito durante a missa e foram confortadas por parentes. As duas filhas não deram declarações.
O corpo do ex-presidente segue na manhã de hoje para Belo Horizonte, onde será cremado. Está prevista a presença da presidente Dilma Rousseff.
Mais de 15 mil pessoas passam pelo velório só no primeiro dia
Adão de Assis Ferreira, 47 anos, foi o primeiro a chegar na fila para o velório do corpo do senador e ex-presidente Itamar Franco. Não fazia questão da primazia, queria apenas se despedir do político que lhe deu seu primeiro tênis quando ainda era criança. Adão tinha 10 anos quando Itamar elegeu-se para o Senado pela primeira vez. Era apenas uma criança, mas vivia correndo com as bandeiras do então candidato e ex-prefeito de Juiz de Fora.
"Simpatizei por ele depois de um showmício. Pegava suas bandeiras e fazia campanha sem nem conhecê-lo", diz Adão. "Um dia, no palanque, pedi para ele um par de tênis. Nunca tinha ganhado nenhum. E ele me deu. Fico muito emocionado. Era um homem que eu admirava muito", afirmou.
Duas senhoras que saíram do Rio de Janeiro para participar do velório também se sentiam muito gratas a Itamar. O ex-presidente não havia lhes dado presentes, mas devolvido seus empregos.
A auditora Sarah Land, 69, e a economista Lídice Meirelles, 67, fazem parte do contingente de mais de 450 mil servidores demitidos do governo federal durante a gestão de Fernando Collor de Mello. Apresentaram-se no velório como representantes dos anistiados da Lei 8.878 de 1994 - legislação surgida a partir de medida provisória assinada pelo então presidente Itamar.
"Vim do Rio especialmente para ver essa alma santa. Ele é como um parente, um paizão que nós perdemos", disse, entre lágrimas, Sarah. "Um homem muito íntegro em suas posições e que foi rápido para nos ajudar", atestou Lídice. Mesmo com a iniciativa de Itamar, as duas levaram 20 anos para ser reintegradas ao serviço público.
O aposentado Walter Assis, 55, veio apoiado numa bengala para se despedir de Itamar. Ele participou de obras realizadas pelo então prefeito de Juiz de Fora, no fim dos anos 60 e no início dos 70. "Participei da construção da rede de tubulação de água daqui da cidade quando ele era prefeito. Ele foi um grande administrador. Prefeito, governador e presidente da República. Um político que vai deixar saudades. Algo muito raro hoje em dia", afirmou. Mais de 15 mil pessoas haviam passado pela Câmara Municipal até o fim da tarde de ontem, segundo a Polícia Militar. A previsão era que esse número dobrasse, uma vez que o velório ficaria aberto durante a madrugada.