Malavolta Jr. |
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‘Os mortos são nossos melhores vizinhos’, afirma Ronaldo Dias dos Santos, que mora ao lado do Cemitério São Benedito |
Para muitos, pensar em morar perto de um cemitério é assustador, mas quem, de fato, já mora ao lado de um está acostumado com a ideia e a coisa que menos o incomoda são os mortos.
A vizinhança relata as vantagens e desvantagens de morar perto de um cemitério e a resposta mais comum foi que os mortos são os melhores vizinhos do mundo.
Eles garantem que esses vizinhos não abusam, não pedem nada emprestado e, o melhor, não fazem barulho algum. Já por outro lado, existem também as desvantagens como, por exemplo, os bichos, a falta de fiscalização e de limpeza, o uso indevido do cemitério para drogas, a desvalorização do terreno, além de ter que presenciar o sofrimento alheio.
Maria Antonia Alves é professora e mora com a mãe e em frente ao Cemitério Memorial Bauru, de esquina com o Cemitério da Saudade. Maria fala que sua rua é bastante movimentada devido ao velório do memorial, que, por dia, realiza pelo menos uma cerimônia. Para ela, a construção do memorial valorizou sua rua e aumentou a segurança.
Contudo, para Maria, o mais inconveniente é o velório, pois as pessoas estão muito tristes e sempre as ouve chorar.
Uma história de arrepiar
Maria conta que sua mãe e sua tia há alguns anos vivenciaram uma experiência “diferente”. “Elas estavam chegando em casa, descendo a rua na frente do cemitério quando viram uma senhora entrando em casa. Aí minha tia falou: ‘chegou uma visita na sua casa’ e minha mãe respondeu: ‘quem será que é?’ Mas quando chegaram em casa, não encontraram ninguém”, relata a professora, que garante não ter medo dos mortos.
Magda Minello vive sozinha e diz não ter medo dos mortos e sim dos vivos. “Moro desde criança perto de cemitério, não vejo nenhum problema. O ruim de morar aqui são os bichos, como baratas e gatos”.
Magda e Iraci Navarro Passos são vizinhas há quase 20 anos do Cemitério da Saudade e dizem que a vizinhança ultimamente anda bem tranquila. “O que a gente sabe é que antigamente pulavam dentro do cemitério para usar drogas, mas hoje não ouço mais falar disso”, afirma Magda.
No entanto o aumento de gatos na rua cresce constantemente. “Tem noite que até perco o sono, de tanto que os gatos ficam gemendo no telhado”.
Sua amiga Iraci conta que os gatos não invadem sua casa porque tem cachorro e que o aumento se deve a uma mulher que vai alimentá-los diariamente em frente ao cemitério. “Acredito até que tem gente que traz gatos pra ela cuidar.”
Morador viu corpos fora dos túmulos
Fato que não foi explicado até hoje teria ficado no passado; atualmente, a rotina é mais tranquila
Sentado em uma cadeira de praia, seo João Rufino não se intimida com a vista e faz palavras-cruzadas em frente ao Cemitério Redentor, onde mora há 45 anos. “Pra mim é tranquilo morar aqui, os inconvenientes ficaram para o passado”. Os inconvenientes do passado que seo Rufino se refere são corpos encontrados fora dos túmulos, o que até hoje não se foi explicado.
No Cemitério do Redentor, um tempo atrás, ouve uma infestação de escorpiões que, segundo moradores, saía do cemitério devido a falta de limpeza e estrutura do local. Para Valdete Azarias, que mora no local há 20 anos, a sujeira é que traz todos os bichos. “Ultimamente, víamos escorpiões e baratas de tonelada que sai tudo do cemitério, além do mau cheiro que sentimos de vez em quando”.
Morada de vivo?
Valdete conta que o que mais o chocou foi ver seu irmão morando dentro do cemitério vivo. “Ele não batia muito bem, tinha problemas com álcool e chegou a morar em uma cova por um tempo. Levou quadros, TV, roupas. Não conseguíamos tirar ele de lá, coitado!” Seu irmão hoje já falecido encontra-se onde escolheu como sua última morada quando ainda era vivo.
Ronaldo Dias dos Santos mora há cinco anos em frente ao Cemitério São Benedito e diz não ter nenhum preconceito em relação a morar do lado do cemitério. “A nossa linha de pensamento é baseada no que a Bíblia diz, que os mortos não fazem nenhum mal, e que temos de ter medo dos vivos. Esses são nossos melhores vizinhos”.
Mas Ronaldo diz também que o local não está tão tranquilo quanto deveria, pois muitas pessoas usam o cemitério como ponto para consumo de drogas.
Em relação à segurança, ele comenta que não é muito vantajoso ter os mortos como vizinhos. “Assim, não tem ninguém para olhar. Com isso, os bandidos se aproveitam para roubar as residências da frente. Já entraram em casa três vezes”, afirma Ronaldo, que mesmo assim não pensa em se mudar de lá. Rosimaire Ferreira Menezes, que também é vizinha do Cemitério Redentor, reclama que os jovens usam o local como ponto de drogas. “Aqui vem muitos usuários de drogas, não tem nenhuma fiscalização”.
Lenda da Batista de Carvalho
Em outras épocas, o que causava arrepios, principalmente nas crianças da rua, eram as lendas. As histórias de assombração povoavam as mentes de quem vivia em uma das poucas ligações do local: ao lado da rua Primeiro de Agosto com o então distante Cemitério da Saudade, na parte alta da rua, ao final da Batista.
A rua Batista de Carvalho é conhecida por seu Calçadão, que reúne lojas e se destaca no centro comercial da cidade. O que muitos não sabem é que outros pontos desta famosa via, mais especificamente o trecho residencial entre as quadras 12 e 15, carregam lendas e maldições relacionadas à instalação do Cemitério da Saudade.
A lenda urbana diz que o prefeito que pavimentar as quadras da rua Batista de Carvalho que levam ao Cemitério da Saudade, morre antes de concluir o mandato. Até agora nenhum prefeito teve coragem de desafiar a maldição.
A lenda sobre o suposto temor em asfaltar a Batista entre a avenida Nações Unidas e o cemitério é citada pelo também historiador Irineu Azevedo Bastos. “Diz que o prefeito que tirar as pedras do caminho do cemitério é quem vai morrer”, comenta ele, filho do ex-mandatário Irineu Bastos, que também não asfaltou a Batista do “lado de cima” da Nações.
Apesar de ser jovem e saudável, o prefeito Rodrigo Agostinho prefere não desafiar a lenda urbana. Os moradores da rua Batista de Carvalho vão continuar sem asfalto por prazo indeterminado. A assessoria de imprensa da Prefeitura informa que não existe nenhuma previsão na Secretaria de Obras para recape do trecho em questão.
Portanto, os moradores dessas quadras da Batista de Carvalho vão ter que aguardar a passagem pelo Palácio das Cerejeiras de um prefeito cético a lendas e maldições. O que parece não ser o caso de Rodrigo Agostinho e dos demais prefeitos que administraram a cidade até agora.
Filho arrependido
Maria Correa da Silva Bincoleto, que mora em frente ao Cemitério Cristo Rei, não acha ruim o fato de ter defuntos como vizinhos e garante que o único perigo é a vizinhança viva. Há um ano e meio, ela conta que ouviu muitos gritos à noite. “A pessoa gritava ‘mãe me perdoa’. Mas eram gritos muito altos. Quando saí, vi umas meninas correndo de medo achando que era assombração. Meu vizinho também saiu da casa e fomos ver o que era. Um jovem tinha invadido o cemitério para pedir perdão à mãe morta. Ele deve ter sido ruim com ela em vida porque ele só pedia perdão e chorava muito. Acho que é um filho que tratou muito mal a mãe. Ele ficou umas 4 horas gritando. Dava dó”, relata Maria.
Já Telma Chaves de Oliveira, que mora em frente ao Cemitério São Bendito, diz que nunca ouviu histórias que a assustaram e acha bom ter vizinhos que não incomodam.
“Temos a calçada livre. Eles não reclamam, não falam mal de ninguém. O ruim mesmo são as baratas e as pessoas que entram para usar drogas”. Mas para sua família existem mais prós que contras, tanto é que sua filha está comprando a casa ao lado.
Telma garante que a procura é grande por um imóvel perto do cemitério, pois tem a vantagem de ser silencioso. No entanto, o conselheiro fiscal do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci-SP), Giasone Albuquerque Candia, garante que os imóveis perto do cemitério são desvalorizados, assim como os imóveis perto de bares.
Maldição teria começado em 1908
História diz que o prefeito que pavimentar o caminho que leva ao Cemitério da Saudade, morre antes de concluir o mandato
A maldição envolvendo o Cemitério da Saudade teria começado, de acordo com memorialistas, por volta do início do século passado, quando o empresário do ramo hoteleiro João Henrique Dix doou algumas terras de sua propriedade para o município. A doação foi feita para que pudesse ser construído um cemitério.
A inauguração foi realizada em 26 de julho de 1908, no entanto, antes desta data o empresário estaria bastante ansioso para que o local começasse a funcionar logo. No dia seguinte à inauguração, Dix se matou com um tiro no coração.
Muitos acreditam que o empresário teria se suicidado para ser o primeiro a ser enterrado no terreno que era dele, mas embora tenha deixado uma carta-testamento, os verdadeiros motivos jamais ficaram esclarecidos, alimentando a curiosidade dos bauruenses que visitam o cemitério.
A história se copia...
O roteiro se assemelha com “O Bem Amado” - primeira telenovela a cores exibida no Brasil, em 1973. Baseado na obra de Dias Gomes, “O Bem Amado” conta a história do prefeito Odorico Paraguaçu, que tem como meta prioritária em sua administração na cidade de Sucupira a inauguração de um cemitério. Por falta de defunto, o prefeito nunca consegue realizar sua meta.
Odorico arma situações para que alguém morra - inclusive importando um moribundo (Ernesto) que não morre e contratando Zeca Diabo, o matador responsável pela morte de seu antecessor.
Durante um tempo, ele se esforça para cumprir o trabalho para o qual foi contratado, mas todas as suas tentativas de providenciar o primeiro defunto para o cemitério fracassam.
No capítulo final, após descobrir que Odorico foi o responsável pela denúncia que o levou à cadeia, Zeca Diabo vai até o gabinete do prefeito e o mata com três tiros. O cemitério da cidade é, finalmente, inaugurado, e Odorico é o primeiro a ser enterrado.
A origem e significado de cemitério
A palavra cemitério vem do grego “koimetérion”, e do latim “coemeteriu”, era a designação, a princípio, do lugar onde se dorme, quarto, dormitório.
Foi com a influência do cristianismo que o termo tomou o sentido de campo de descanso após a morte. Cemitério também é conhecido como necrópole, carneiro, sepulcrário, campo-santo e vários eufemismos, como "cidade dos pés juntos" e "última morada".
Os cemitérios tiveram origem no fim do século XVII por medida sanitária de extrema necessidade, devido ao crescimento da população. Os sepultamentos passam a realizar-se em área aberta, nos chamados campos-santos ou cemitérios secularizados.
Naquele tempo era costume se enterrar os mortos nas igrejas. Mas isso apresentava graves inconvenientes sanitários, sobretudo nas cidades onde a população crescia e assim diminuía a oferta disponível de sepulturas.
As paredes das sepulturas das igrejas não apresentavam dimensões adequadas à vedação completa das catacumbas, o que deixava passar sempre o mau cheiro. As irmandades religiosas eram apontadas como as principais causadoras desse mal e os vizinhos das igrejas eram os que mais sofriam.
A simplicidade dos padrões tradicionais e primitivos continuou caracterizando a sepultura coletiva. Era e sempre foi o desejo dos mais abastados, distinguir-se através de uma marca perene, de um objeto de consagração, o túmulo, pela atração de comparar-se aos grandes personagens da História, como os soberanos, os faraós, os reis, os papas e os príncipes, que mereceram sepulcros diferenciados dos demais.
Raio-x dos cemitérios de Bauru
Cemitério da Saudade: Fundação 1908 - Jazigos: 5.679
Rua Hermínio Pinto nº 2-1 – Vila Cárdia
Tel: 3227-6988
Aberto todos os dias das 7h às 17h30
Cemitério Redentor: Fundação 1963 -
Jazigos: 5.131
Av. Eng. Hélio Pólice – qd. 06 – Jd. Cecap
Tel: 3203-6338
Aberto todos os dias das 7h às 17h30
Cemitério Cristo Rei: Fundação 1981 -
Jazigos: 2.501
Rua Nelson Tosoni Decarlis nº 2-91 –
Pq. Primavera
Tel: 3232-4600
Aberto todos os dias das 7h às 17h30
Cemitério São Benedito: Fundação 1949 - Jazigos: 2.585
Av. Castelo Branco qd. 08 – Independência
Tel: 3236-3357
Aberto todos os dias das 7h às 17h30
Cemitério São Pedro – Tibiriçá: Fundação 1928 - Jazigos 425
Rua Figueira de Mello – nº 5-0
Tel: 3279-1145
Aberto todos os dias das 7h às 17h30