Quando ouvíamos dizer que pessoas atiravam nas águas dos rios gatinhos recém-nascidos para que morressem afogados, ficávamos revoltados e o futuro da alma humana já se assinalava deveras preocupante. Hoje, diante do lúgubre fato de uma mulher colocar o filho, ainda com vida, unido ao cordão umbilical, em um saco plástico e o atirar no leito da rodovia para ser esmagado, nos confirma alarmante e assustadora verdade: estamos criando monstros!
Para o ser humano chegar a ponto de matar o filho que acabou de vir ao mundo de forma tão desumana e cruel, só podemos constatar que a humanidade caminha galopante em busca da barbárie.
E qual é o motivo de tanta truculência? A grande verdade é que estamos criando monstros quando desamparamos a infância através de diversas formas de repúdio: falta de carinho, de tempo, de zelo, de contato físico, de colo e principalmente falta de amor. Nada disso o dinheiro pode adquirir. Nenhuma atitude de ternura pode ser quitada com cartão de crédito. Os sentimentos primam por valores incomensuráveis e personalíssimos.
Deixamos de amar nossos filhos, deixamos de abraçá-los, beijá-los, tudo por falta de tempo. Depositamos nossas crianças em dispendiosos e moderníssimos holocaustos desde a mais tenra idade e abandonamos a responsabilidade de educar através de bons exemplos, consentimos a falta de carinho e o desamparo em momentos imprescindíveis. Abdicamos dos limites tão necessários na difícil arte da construção do homem. A distância entre pais e filhos se alonga tão drasticamente que, tal e qual a pipa e o menino, quando a linha se parte, nunca mais se reencontram. A pipa segue à deriva pelo espaço, sem rumo e sem possibilidade de resgate.
Estamos patrocinando, em nome dos tempos modernos, a fabricação de monstros que agridem, trucidam, ofendem, sangram, mutilam e tranquilamente adormecem no silêncio da solidão entre muitos. Tudo se converteu em banalidade: a vida, o respeito, o crime, a violência, a agressão e o direito. Tudo é consentido e anistiado. Tudo é permitido sem punição. E a violência cresce e se intumesce, cria raízes no coração do homem que, modernamente regado pela seiva da agressividade, eclode em floradas do mal de onde abrolham frutos acres, venenosos e mortais.
E o ambiente corrompido se amplia e o caos social se estabelece. Por mais que a ciência descubra novos rumos através da tecnologia, jamais poderá reconstruir o coração e a alma do homem. Cabe à família reconhecer que o lar é a rede onde balança feliz a infância do homem!
Valderez de Mello, pedagoga, psicopedagoga, advogada, escritora. Autora dos livros: Flores sobre o Rochedo, A Velha Adormecida e Trama e Urdidura