Arquivo/Quioshi Goto |
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Isaias tinha Lula em seu rol de amigos desde a fundação do PT, nos anos 80 |
A educação, a coerência política e o idealismo estão em silêncio. Professor e eterno militante socialista, Isaias Milanezi Daibem morreu por volta do meio-dia de ontem, aos 73 anos. O corpo está sendo velado no Centro Terra Branca e o sepultamento acontecerá às 13h30 desta sexta-feira, no Cemitério da Saudade.
Isaias estava internado no Hospital da Unimed desde o dia 27 de setembro, quando foi submetido a uma cirurgia devido à constatação de uma diverticulite.
Ele deixa a esposa, a também professora Ana Maria Lombardi Daibem, e os filhos Daniel, Luciana, Célio, João Pedro e Mariana.
Segundo informações da família, o procedimento cirúrgico ocorreu com sucesso, mas alguns dias depois complicações no quadro de saúde levaram o professor à Unidade de Terapia Intensiva (UTI), onde permaneceu por 10 dias, até ontem.
Antes da internação, Isaias atuava como assessor técnico do Gabinete do prefeito Rodrigo Agostinho (PMDB). Foi eleito vereador pelo MDB em 1975. Na década seguinte, atuou como secretário municipal de Educação durante o primeiro governo de Tuga Angerami. Ocupou o cargo também na primeira gestão de Tidei de Lima.
A militância começou na Juventude Estudantil Católica (JEC) e depois seguiu na Juventude Universitária Católica (JUC). “Havia uma ‘espiritualidade na ação’, não era só rezar”, costumava dizer.
A filiação ao MDB, segundo Isaias relatou em entrevista ao Jornal da Cidade, foi um passado natural. A tendência aos ideais de esquerda, no entanto, foi cultivada quando trabalhava como ferroviário, onde atuou como aprendiz de radiotelegrafista, telegrafista e, posteriormente, professor no Centro de Formação Profissional Engenheiro Aurélio Ibiapina.
Trabalhando na ferrovia, conheceu vários militantes do Partido Comunista Brasileiro, o “Partidão”, que exerceram forte influência sobre sua formação, fundamental para a luta durante os anos de chumbo do regime militar.
Como esquerdista histórico, Daibem sonhava com o dia no qual a sociedade encontraria uma alternativa ao capitalismo que respondesse de forma mais completa aos seus anseios.
Este ideal o atraiu para o processo de fundação do PT, inspirado pela confiança transmitida pelo então líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva, que chegou a dormir na casa do professor Isaias em Bauru.
A vocação para a docência era perceptível e foi enaltecida por centenas manifestações de carinho nas redes sociais por ex-alunos de Daibem, que ministrou aulas de História, Educação Moral e Cívica, e Organização Social e Política Brasileira, em escolas particulares e da rede estadual de ensino.
Vocação da família
Amiga do professor, a companheira de profissão, Vera Casério conta que a Secretaria Municipal de Educação está de luto. “Era fantástico atuar com ele. Só na secretaria, trabalhamos por oito anos juntos. Um ser humano que sempre procurou ajudar as pessoas. Solidário e amigo dos amigos. Sempre muito ligado à Igreja, ele fazia o bem sem olhar a quem”.
A secretária de Educação lamenta que, em razão da internação, Isaias não pôde prestigiar a recente inauguração da escola municipal que recebeu o nome de Luiza Daibem, sua irmã, que morreu há cerca de cinco meses. “Escolhemos homenageá-la por ter sido uma professora tão querida na nossa rede”.
Classe política lamenta perda de homem ético
“Sua história de vida foi seu melhor discurso”. Companheiro e presidente do partido político em que Isaias esteve filiado nos seus últimos sete anos de vida, o vereador Paulo Eduardo de Souza define, com esta frase, as características atribuídas de forma unânime ao professor: a coerência e a ética na busca por seus ideais.
“Tinha um otimismo contagiante. Ele sabia ouvir e intervir no momento correto. É uma grande perda. Inesperada, pois não havia doença que pudesse antecipar esse desfecho”, lamenta Souza.
Também vereador, Roque Ferreira militou com Daibem na fundação do PT. Os dois se conheceram, no entanto, muitos anos antes, quando ferroviários. “Ele era uma dessas figuras raras, humanista por natureza. Também lamento muito pelas condições de sua morte. Ele estava bem de saúde e veio a óbito por uma infecção”.
O prefeito Rodrigo Agostinho diz que resumiria Isaias com a palavra “retidão”. “Um cara correto, sério e honesto. É até difícil de falar porque gostava muito dele. Ele gostava de se denominar servidor e, no meu Gabinete, cuidava do atendimento direto à população que ia até lá. Era muito querido em toda a prefeitura”.
Estela Almagro destaca a sede com que Daibem agia em torno dos seus ideais. “Era um dos que mais se animava com os projetos que ajudam e melhoram as vidas das pessoas. Estava empolgadíssimo para o sorteio das casas no sábado”.
De longa data
Companheiro de militância, Antonio Pedroso Junior diz que a morte de Isaias Daibem é uma perda irreparável. Amigos há 50 anos, sempre caminharam juntos no engajamento em movimentos sociais e na atuação em partidos políticos. “Atuamos juntos no antigo MDB, na mesma corrente, inclusive. Depois, ele foi para o PT e eu fiquei. Mas tenho orgulho de contar que eu o convenci a entrar no PSB”.
O amigo descreve Isaias como uma figura humana, emotiva e com sensibilidade acima do normal. “Ele foi um dos últimos baluartes do socialismo. Ele acreditava nisso de verdade. Era um velho com espírito de moleque”.
Antes de a voz embargar e preferir encerrar a ligação, Milton Dota relata que conheceu o professor em 1959. “Desde então, caminhamos juntos. Até hoje, no PSB. Lembro do congresso que participamos em São Paulo, nos dias que antecederam a posse do João Goulart. Tínhamos as mesmas ideias e nunca tivemos qualquer atrito. Sempre foi um companheiro humilde, sincero e solidário”.
João Rosan |
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Corpo de Isaias Daibem será sepultado hoje, às 13h30 |