Aurélio Alonso |
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Paleontólogo William Nava trabalha numa peça de arenito onde estão fósseis de ave primitiva |
A Bacia Bauru é uma imensa região que compreende a parte ocidental do Estado de São Paulo, noroeste do Paraná, leste do Mato Grosso do Sul, Triângulo Mineiro e no sul de Goiás, onde há um cemitério de fósseis de dinossauros com peças de mais de 70 milhões de anos do período Cretáceo. Nos últimos 24 anos, os maiores achados se concentraram na região de Marília, São José do Rio Preto e Presidente Prudente.
No município de Bauru não há achados de fósseis, embora o nome do município já serviu para denominar um gênero de paleocrocodilo que viveu na era dos dinossauros: o Baurusuchus, localzado há mais 60 anos, em 1945, em General Salgado, região de Rio Preto.
O coordenador do Museu de Paleontologia de Marília, William Roberto Nava, é quem identificou mais de 10 restos de fósseis de Titanossauros, entre ossos quase inteiros e semiarticulados, ou fragmentos e isolados. Esses grandes animais pré-históricos de 7 a 8 toneladas vagaram pelos imensos descampados do centro-oeste paulista na pré-história. Pelos achados a bacia é um cemitério de fósseis de dinossauros do período Cretáceo.
Na escala de tempo geológico é o período da era Mesozoica que está compreendido entre 145 milhões e 66 milhões de anos atrás, aproximadamente. O período Cretáceo sucede o período Jurássico.
O fóssil mais próximo de Bauru localizado foi em um barranco da rodovia SP-294 (Bauru-Marília), em Duartina: um úmero (osso dianteiro) de um Titanossauro que se encontra no Museu Municipal de Paleontologia de Marília. Depois houve uma descoberta, em 2006, em Pederneiras, de fragmentos de animais invertebrados (microfósseis) que viveram em lâmina d'água em antigos riachos no período dos dinossauros. Esses invertebrados estão grudados e petrificados em pedaço de arenito encontrado por Nava quando avistou em um barranco da rodovia Jaú-Bauru. Para vê-los é necessário uma lupa.
Marília já é uma importante região fossilífera desbravada por Nava nas duas últimas décadas. Ele descobriu fósseis articulados e semi-articulados, o que incentivou a criação do Museu de Paleontologia. A primeira descoberta remonta a 1993, quando ele localizou um fragmento de Titanossauro que contou com a ajuda para escavações do Museu de Monte Alto, mas o achado mais considerável são os fósseis de ossos com várias vértebras encontrados a 25 km ao norte da rodovia SP-333, em 2009. A retirada dos fósseis só foi ocorrer em 2010, quando Nava conseguiu uma parceria com as Universidades de Brasília e do Rio Grande do Sul. O Titanossauro teria em vida de 13 a 15 metros de comprimento.
De acordo com Nava, a repercussão dessa descoberta foi tão grande que influenciou o dramaturgo Walcyr Carrasco a incluir o tema sobre dinossauro na novela "Morde e Assopra" da Rede Globo. Ele tomou conhecimento pelos jornais e esteve por três vezes em Marília, cidade que já residiu, para conhecer o Museu de Paleontologia e saber da localização dos fósseis. A mais recente descoberta se refere a fósseis de aves primitivas que mobilizou a visita de pesquisadores do Museu de História Natural de Los Angeles (EUA).
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Na ‘caça’ aos dinossauros da região
Paleontológo William Nava nos últimos 24 anos conseguiu localizar fósseis de titanossauros nas regiões de Marília e de Presidente Prudente?
Aurélio Alonso |
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“Dino de Pompeia” é o apelido desse fragmento grande de Titanossauro |
Divulgação |
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Detalhe de uma escavação onde aparecem os ossos que estavam enterrados |
Valter Saia/Divulgação |
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William Nava faz a escavação para retirar fóssil de dinossauro num riacho em Álvaro de Carvalho |
Ao chegar ao prédio do Museu Municipal de Paleontologia de Marília numa manhã nublada, na primeira porta à esquerda de quem entra já se avista uma imensa pedra de arenito em cima de uma mesa com marcas em círculo feitas à mão de tinta azul e vermelha. Em pé, segurando uma espécie de caneta com uma ponta fina que perfura os pedaços dessa pedra está o paleontólogo William Roberto Nava que coordena o Museu, onde armazena fósseis de titanossauros e outros animais encontrados nas últimas duas décadas. Atualmente as instalações passam por reforma.
Esse material que vem sendo manuseado por Nava nesta semana trata-se de ossinhos de aves primitivas encontradas em Presidente Prudente que atraiu recentemente dois pesquisadores do Museu de História Natural de Los Angeles (EUA). Similares só há na Mongólia. (Leia texto nesta página)
O trabalho é meticuloso. Ele precisa retirar o arenito para remover os fragmentos, que são o que restaram das aves que viveram na pré-história.
Nessa mistura de laboratório improvisado com imensos fragmentos de fósseis nas mesas é onde diariamente Nava trabalha. Ele nos últimos 24 anos é responsável pelas maiores descobertas do que foi a pré-história no oeste paulista.
Ex-bancário por 17 anos, William não lembra nada da figura do burocrata e nem da ficção científica de arqueólogo e pesquisadores de dinossauros cultuados pelo cinema americano. Ele até brinca que o trabalho de paleontologia é árduo e não tem nada daquilo visto nas telas. "Mas acaba ajudando a divulgar", completa.
Quando está em campo para escavações é obrigatório envergar um chapéu à la Indiana Jones, mas é para proteger-se do sol escaldante.
O Museu de Marília surgiu da necessidade de ter um lugar para armazenar os fósseis que foram sendo localizados nas duas últimas décadas.
Nava é bem paciente. No meio da entrevista, surge na porta do Museu um idoso perguntando sobre a biblioteca que funciona no mesmo prédio e passa por reforma. Ele conversa calmamente, relembra o interlocutor já de idade avançada que o conhece dos tempos de banco. Depois de interromper a entrevista, retorna para explicar as descobertas em Marília e Presidente Prudente.
O primeiro achado uma escápula (fragmento de osso) de um Titanossauro foi encontrado em 1993. É o marco inicial para a carreira de Nava de paleontólogo amador que tem formação em História na Unesp em Assis e em Jornalismo na Unimar.
A paleontologia é uma "paixão" de criança. "Sempre gostei da história dos dinossauros", emenda. É desse sonho de achar algo interessante que acabou virando o coordenador do Museu e o maior "caçador" de fragmentos dos grandes e pequenos animais da pré-história.
Nava conta, por exemplo, que não existe uma técnica ou equipamento sofisticados para chegar ao que restou desses animais. Os dinossauros viveram na terra há mais de 70 milhões de anos. Quando eles vagavam o homem ainda não existia na terra. O desaparecimento da espécie é atribuída a queda de um asteroide na região do Novo México, que tinha cerca de 14 km de diâmetro. Esse impacto levantou uma nuvem de poeira que tapou o sol e por isso morreram muitos animais e plantas.
A área que compreende a Bacia Bauru (onde se localiza todo o oeste paulista e invade mais estados) teve predomínio de dinossauros da espécie titanossauros e de crocodilianos, que viveram entre 65 e 140 milhões de anos atrás. Isso é possível já deduzir com base nos registros fósseis e nos estudos geológicos.
Nava cita por exemplo que o aparecimento de fósseis está concentrado mais nessa região que vai de Marília, São José do Rio Preto, Presidente Prudente e arredores de Bauru. Já mais ao Sul do Estado, região de Ourinhos e Norte do Paraná, tem uma formação geológica diferente. A formação geológica foi influenciada por muitas atividades de vulcanismo. A cor vermelha da terra, muito fértil, evidencia isso, porque a lava deve ter derretido os fósseis, conta Nava.
As localidades fossilíferas mais conhecidas do Estado são de Presidente Prudente, Álvares Machado, Pirapozinho, Monte Alto e Araçatuba. A região de Marília revelou-se recentemente com enorme potencial graças as escavações de Nava.
Fóssil em Duartina
A região de Marília já é considerada com enorme potencial fossilífero. Os primeiros achados de vertebrados nesta região se devem aos esforços do paleontólogo William Nova. No município de Bauru não existe até o momento localização de fósseis, embora o nome da cidade serviu para batizar várias espécies encontradas. Isso ocorreu porque a Bacia chama-se Bauru, uma área enorme que atinge cinco estados. O achado mais perto foi em Duartina, em fevereiro de 2001, um úmero de Titanossauro num afloramento na rocha na rodovia SP-294 (Bauru-Marília), próxima da serra que faz divisa com o município de Gália.
Nava conta que muitos dos achados são observações visuais. "O que se procura são rochas expostas ou erosões, nessa região tem bastante. Essa observação que faz descobrir o fóssil. É um trabalho de muita paciência e cuidado. Para eu achar um fóssil, paro na beira da estrada e fico olhando a rocha. Até que vejo um sinal. A última etapa é escavar", revela.
Muitas das descobertas são nas margens de rodovias. Geralmente, quando há alterações de traçado de rodovia e durante as escavações se deparam com restos de fósseis (pedra petrificada). Conforme relato de Nava em seu blog, os primeiros fósseis achados na região foram citados pelo professor-doutor Sergio Mezzalira (1966) e se referem as restos ósseos não determinados achados a 6 km de Padre Nóbrega, na estrada municipal que vai até Rosália, região norte de Marília. De acordo com o paleontólogo, esses restos teriam sido encontrados por trabalhadores que abriram o trecho da estrada durante os anos 1940.
Depois de 50 anos, em 1993, Nava ao fazer investigações no leito rochoso da mesma estrada, a 9 km adiante, descobriu fragmentos da pélvis, pedaços de costelas e centro de vértebra caudal identificados como sendo de Titanossauro. Também havia neste local restos ósseos de moluscos bivalves fossilizados.
Aves primitivas
A descoberta mais recente são rochas com ossinhos de aves do período Cretáceo. Esse estudo será importante para se juntar na interpretação de como se processou a fossilização dos pequenos invertebrados e auxiliar no entendimento da evolução da aves.
Em outubro deste ano, uma equipe composta por Luis Chiappe e José Soller (Museu de História Natural de Los Angeles) e da Augustin Martinelli (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) estiveram no Museu Municipal de Paleontologia de Marília. William Nava explica que as aves primitivas tinham penas, mas tem diferença dos répteis voadores da época. "A comunidade científica está convicta que os pequenos dinossauros carnívoros possuíam plumagem, não voavam e eram dotados de dentes afiados para caçar. Com a ocorrência da queda do meteorito na terra, surgem novos nichos ecológicos. Esses dinossauros carnívoros se adaptam e se transformam nas aves de hoje", explica o paleontólogo. O material é raro e só existe semelhante na Mongólia e na China.
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Região tem vestígios da pré-história
As camadas mais recentes da Bacia Bauru, depositadas durante o período Cretáceo superior, tem idades que variam entre 92 e 65 milhões de anos
Fotos: Aurélio Alonso |
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Museu Municipal de Paleontologia está localizado no Centro de Marília |
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William Nava mostra o mapa onde se localiza a Bacia Bauru que compreende 5 Estados |
O Estado de São Paulo tem vários achados de restos de dinossauros. A região do centro-oeste pertence à Bacia Bauru que abrange os São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraná e Goiás, com uma extensão de aproximadamente 370 mil km2, sendo constituída por depósitos continentais de sedimentos predominantemente arenosos. Só São Paulo a área tem cerca de 100 mil km2, localizado no oeste paulista.
De acordo com estudos de William Nava, a região de Marília situa-se num planalto recortado por erosões que criaram escarpas rochosas ao longo de milhões de anos, algumas com centenas de metros de profundidade, formando paisagens semelhantes a minicanyons.
É nesses afloramentos de rocha onde foram encontrados fósseis, principalmente em rodovias, como a Bauru-Marília e mesmo vicinais. Mas, em Presidente Prudente, Nava cita que o sitio paleontológico recém-descoberto fica dentro da malha urbana, perto de um conjunto habitacional. Recentemente foi solicitado à prefeitura para fechar a área, após constatação que o terreno não é particular.
Desde a chegada da Estrada de Ferro Sorocaba àquela região foram encontrados os primeiros fósseis há 100 anos. "É uma região que ficou famosa desde então", conta Nava.
Outras regiões do Estado tem descobertas, como em Araraquara que foram encontradas pegadas de um ornitópodo, a Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) guarda uma coleção com peças de pegadas fósseis de animais pré-históricos, em Monte Alto, na região de Ribeirão Preto, foi encontrado por um comerciante por acaso um osso de titanossauro. Há localização de uma espinha de peixe do período pré-histórico durante abertura de um poço profundo em Piratininga.
No livro "Flora, Fauna e Ambiente", de autoria de Wilson Uieda e Lucia Maria Paleari publicado em 2004, resultado de dois encontros realizados em Botucatu, eles destacam que não são comuns referências a fósseis nas áreas da Formação Marília, havendo, entretanto, a menção de reservas vegetais em Garça, peixes em Piratininga, ossos de dinossauros e outros répteis um pouco ao nordeste de Marília, bem como a presença de moluscos fósseis e coprólitos (fezes fósseis). "Entretanto, em outras unidades do Grupo Bauru do oeste do Estado de São Paulo como a formação Adamantina de Monte Alto ou a Formação Marília do Triangulo Mineiro há mais de 150 localidades fossilíferas já localizadas", consta em trecho da publicaçao.
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