| Ítalo Moraes |
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| Admirador de grafites, o bauruense Rodrigo Carvalho posa ao lado de arte sob o viaduto da avenida Duque de Caxias com a Nações Unidas, sentido bairro-Centro |
Atividade ligada às manifestações de ordem estética ou comunicativa, a arte se dá por meio de uso de linguagens diversas e é intrínseca à criatividade. Seja com desenhos, formas ou palavras, ela exprime emoções, sentimentos e provoca reflexão.
Nas últimas décadas, Bauru parece ter mergulhado de vez neste universo. Basta um pouco mais de atenção ao caminhar pelas ruas da cidade para notar a arte gravada em prédios e espaços públicos e até em fachadas de casas por alguns bairros.
São quase sempre expressões ou desenhos curiosos, alguns ligados à vida dos próprios moradores ou frequentadores do espaço, outros abstratos ou de relevância social.
O JC Nos Bairros traz alguns endereços com trabalhos do tipo e a história de alguns moradores e admiradores desta arte para saber quais os significados e propósitos das obras para eles.
ADMIRADOR
| Ítalo Moraes |
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| Nas andanças por Bauru, Rodrigo faz pausa para foto ao lado de grafite na avenida Cruzeiro do Sul |
Morador do Parque Vista Alegre, Rodrigo Carvalho, 34 anos, é fã declarado da arte em muros e fachadas, mas dificilmente encontra este tipo de arte em seu bairro. No ano passado, ele deu início a uma jornada pelas ruas da cidade em busca de grafites e encontrou vários pelas regiões do Centro, Jardim Brasil e em avenidas. Após quase um ano de andanças, Rodrigo já soma mais de 30 fotos em diferentes pontos da cidade.
"Quando ando pelas ruas costumo tentar olhar aquilo que muitas vezes não é percebido pelas pessoas normalmente, como o grafite. No Centro e nos bairros que concentram universitários é mais fácil encontrar", cita. "Na verdade, busco uma forma de tentar valorizar mais o trabalho dos artistas grafiteiros que, nos presenteiam, gratuitamente, com essas obras de arte e ainda embelezam a cidade", completa.
Para Rodrigo, que é jornalista e também poeta, a busca e a contemplação dos grafites funcionam como uma "válvula de escape" da correria e estresse do dia a dia. "A arte faz com que a gente se sinta livre, deixe o pensamento viajar para outros lugares e permite que voltemos a sonhar", conclui.
GRAFITE
A grafitagem foi identificada como uma prática extremamente distinta da pichação (ilegal) em lei federal sancionada pela Presidência da República em maio de 2011. No texto, ela foi descrita como arte “realizada com o objetivo de valorizar o patrimônio público ou privado mediante manifestação artística, desde que consentida pelo proprietário”. Já a pichação é crime e passível de multa.
Poesia e grafite contra pichações
| Marcele Tonelli |
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| Amante da natureza e dos beija-flores, o médico Oduvaldo Prado conta que a inspiração para a poesia do muro de sua casa veio dos ninhos que os pássaros mantém em sua garagem há anos |
Cansado das pichações que tomavam parte dos muros de sua casa, o pediatra Oduvaldo Prado, 66 anos, resolveu transformar o local em uma espécie de mural da poesia para tentar frear o vandalismo. Com textos da poetisa Cora Coralina e do poeta bauruense Mário Ramos Monteiro, ele diz ter conseguido findar de vez as pichações no muro dos fundos de sua casa, na quadra 12 da rua Xingu, no Jardim Brasil.
"Curiosamente, os pichadores respeitam a arte e não invadem o território alheio. Faz quase 20 anos que comecei a pintar as poesias e nunca mais este local foi pichado", comenta o morador. "Pelo contrário, já vi muita gente parar para ler e contemplar. São poesias de conteúdo simplório, mas que revelam grandes ensinamentos e pregam o amor à natureza", acrescenta Oduvaldo.
| Marcele Tonelli |
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| Seo Delmar Baptista dos Santos diz que grafitagem nos muros de sua residência cessaram com pichações desenfreadas |
A cada seis anos, em média, o local passa por nova pintura e as obras são renovadas. A poesia atual, fala sobre beija-flor, animal preferido de Oduvaldo, que ajuda a manter com zelo, na garagem de casa, ninhos dessa espécie de pássaro, que há anos mora por ali.
"Mas, antes do Mário Ramos, houve poesias de Cora Coralina. Os textos são retirados dos livros que eu ganhei das famílias destes poetas", detalha o morador.
GRAFITE
| Marcele Tonelli |
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| Fachada de casa imita pedras na quadra 26 da rua Aviador Gomes Ribeiro, na Vila Cardia |
Foi também com intuito de evitar pichações no muro de casa, que seo Delmar Baptista dos Santos, 83 anos, morador da confluência entre as ruas Saint Martin e Benjamin Constant, no Centro, resolveu abrir espaço para a grafitagem e autorizou alunos da Unesp a deixarem seus registros artísticos e criativos por lá.
"Nunca mais tive que gastar com tintas para cobrir pichação no muro. É incrível como respeitam a grafitagem. Eu não entendo muito bem o que os desenhos dizem, mas gosto e acho que é bonito e ajuda a embelezar a cidade", afirma seo Delmar.
A pedra que não é pedra
Também com intuito de evitar pichação, moradores de uma casa na quadra 26 da rua Aviador Gomes Ribeiro, na Vila Cardia, optaram pela pintura artística da fachada do imóvel. "Meus pais viram outras casas assim e acharam interessante e criativo. Colocar pedras ficaria muito mais caro. Já se passaram quase dez anos. Os pichadores têm respeitado bem", diz Mateus Zanlindo, 31 anos.
Arte dá 'vida' a imóveis
| Marcele Tonelli |
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| Janela que virou olho: grafite personifica casa na quadra 11 da rua Xingu, no Jardim Brasil |
"Depois do grafite parece que a minha casa ganhou vida, ficou mais feliz e mais bonita", relata dona Maria Gomes da Silva, 90 anos, sobre o que para ela significou a transformação da fachada do imóvel em que mora há décadas na quadra 5 da rua Venezuela, Vila Independência. A arte foi presente do neto, Renato Magu, 37 anos.
Entre os desenhos nos muros está o de um índio, com mais de 2 metros de altura por 3 metros de extensão. As cores vibrantes do grafite deram nova perspectiva para a fachada simples da casa de madeira.
"Gosto muito de índio, porque eles são a cara do Brasil, mas estão desaparecendo. O desenho é bonito e chama a atenção, provoca quem passa por aqui", cita dona Maria.
Renato, que é coordenador da Casa do Hip Hop, entidade que incentiva a arte de rua na cidade, conta que presenteou sua avó com o trabalho de dois colegas grafiteiros, Raup e Crione, de Florianópolis, nas últimas semanas.
"Eles estavam em Bauru para um evento e foram recebidos com todo carinho por ela em casa. Por isso, decidi agradá-la e eles toparam", comenta Magu.
JANELA QUE VIRA OLHO
Assim como a casa de dona Maria, outros locais em Bauru parecem ganhar vida e outras perspectivas com o grafite. Entre os exemplos está o de um imóvel que, atualmente, abriga uma república de estudantes no Jardim Brasil. Um rosto gigante na parede da casa acabou transformando janelas em olhos.
BECO DO ROBIN?
| Marcele Tonelli |
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| Vinícius Bonifácio é morador de república de estudante da Unesp que divulga trabalho de grafiteiros no Centro |
Outro ponto conhecido de Bauru que proporciona a contemplação de grafites é na confluência entre as ruas Benjamin Constant e Saint Martin, no Centro. Há anos, o local tem sido reduto de arte em muros e fachadas, tanto que, nas redes sociais, já chegou a ser apelidado como "Beco do Robin", em alusão ao "Beco do Batman", famoso espaço de arte em grafite na Capital.
Estudante do quarto ano de artes visuais da Unesp, Vinícius Bonifácio, 22 anos, mora por lá e conta que o imóvel em que reside já foi república de pessoas ligadas ao grafite na cidade, por isso vivia grafitado.
"Há um ano, quando alugamos esta casa, o proprietário havia pintado os muros, mas há uns 15 dias, autorizamos os colegas a grafitarem a frente da casa de novo. Valorizamos a arte, um muro pintado não significa nada, já um muro grafitado provoca a reflexão e transforma o ambiente, deixa menos sisudo", afirma o estudante.
Um dos grafites no local, segundo Vinicius, exprime a ideia do futuro tecnológico. "Com a ponta dos dedos, o personagem parece transformar o universo", comenta.
Criatividade em muro vira até negócio
| Marcele Tonelli |
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| Lar de idosos na quadra 15 da rua Azarias Leite homenageia pacientes "da casa" como personagens animados nos muros |
Quem passa pela quadra 15 da rua Azarias Leite, na Vila Mesquita, dificilmente imagina o significado por trás dos personagens fofos grafitados no muro de um residencial de idosos.
Senhorinhas dançando e acompanhadas de animais e casais da terceira idade animados. São vários os desenhos grafitados na extensão dos muros que cercam o local.
"Os personagens são inspirados em alguns pacientes queridos que moram aqui. É uma forma de homenagem e de deixar a nossa fachada mais bonita, alegre e humana", conta a proprietária do espaço Rosângela Campos de Souza.
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| E.E. Luiz Zuiani, na quadra 34 da Aviador Gomes Ribeiro |
A arte foi feita pelo marido dela, Sérgio Paulo de Souza, que tem a grafitagem como hobby. Lá, ele acabou transformando o que era passatempo em negócio. "Muita gente repara no grafite, o residencial ficou conhecido por causa disso. A repercussão foi tanta que meu marido foi chamado para fazer o mesmo trabalho em uma casa geriátrica em Sorocaba", afirma Rosângela.
Grafite em escolas
Na última décadas, as escolas públicas do Estado passaram a incentivar o uso de grafites em suas fachadas e interior como forma de combater pichações. A E.E. Luiz Zuiani, na quadra 34 da Aviador Gomes Ribeiro, no Parque São Jorge, por exemplo, é uma das adeptas da iniciativa.
"Depois que a frente da escola foi grafitada nunca mais tivemos problemas com pichação. Os próprios alunos pedem o grafite, tanto que estamos tentando parceria para pintar nossa quadra externa e viabilizar a grafitagem", comenta Jussara Di Rolli, vice-diretora.




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