Ciências

Identificação pelos dentes e boca! Por Alberto Consolaro


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Quando pessoas perdem a memória e bandidos mentem seus nomes, usa-se as marcas digitais para identificá-los. Para obtermos documentos, deixa-se as digitais e cria-se um banco de dados, ou de dedos, da população. Caso contrário, o cidadão não terá carteira de identidade e demais documentos, mais em especial o CPF, que tem a ver com a economia, impostos, obrigações e dinheiro. Cidadão só existe com CPF e ressalte-se que o C é de contribuinte e não de cidadão!

As pessoas mortas, em alguns dias, perdem as impressões digitais, pois os tecidos moles se decompõem. No reconhecimento de corpos, detalhes podem ser fundamentais como pequenos defeitos, pinos, parafusos e próteses. Mas, nem sempre isto é possível e uma outra forma segura de se identificar uma pessoa, morta ou viva, se dá pela caracterização da arcada dentária, dos dentes individualmente e das características relacionadas à boca como o formato das rugosidades palatinas, gengiva e detalhes ósseos.

O prontuário odontológico de uma pessoa "deveria" ser guardado por ela a vida toda e, nele estariam as fotografias, radiografias, tomografias e registros de todos os procedimentos feitos pelos profissionais. O osso demora muitos meses para se decompor e depois de um a três anos, têm-se apenas algumas partes residuais do corpo inteiro, junto com anéis, brincos, próteses e outros apetrechos. Este tempo varia e depende das condições em que foram depositados.

Os dentes, entretanto, demoram décadas e até séculos para se decomporem. Por isto que radiografias, tomografias, modelos 3D das arcadas dentárias, restaurações, tratamento de canal, próteses dentárias, implantes e aparelhos ortodônticos podem identificar um corpo morto muito tempo depois.

COMO ASSIM

Nas tragédias com mortos soterrados, como a de Brumadinho, algumas pessoas questionam como os profissionais da odontologia legal ou forense contribuem nesta identificação dos corpos soterrados. Se requer, junto a família, os prontuários e ou fichários do suposto desaparecido com as anotações do cirurgião-dentista, indicando os procedimentos e tratamentos realizados em cada consulta, confirmando-se nas radiografias, tomografias, modelos e fotografias.

Mas, sempre tem o "mas", e se a pessoa nunca fez tratamento odontológico, nunca teve cárie ou doença periodontal, como dentes e maxilares são úteis na identificação pelas bocas e arcadas dentárias? Na boca tem-se 32 dentes permanentes e 20, decíduos. A forma, o tamanho e a posição destes dentes nunca serão iguais entre as pessoas. A quantidade de raízes, o formato da coroa e o alinhamento entre os dentes são particulares de cada um. Nem sempre as pessoas têm os 32 dentes permanentes, pois 25% das pessoas nascem faltando um ou mais dentes na boca, o que se chama de anodontia parcial, um tipo de agenesia dentária.

Mesmo que nenhum tratamento tenha sido feito, o número, a forma, o tamanho e a organização dos dentes nas arcadas indicará precisamente se aquele crânio e mandíbula pertencem àquela pessoa. Se pode identificar também pelo tamanho, forma e relação entre os maxilares como a oclusão, morfologia da articulação temporomandibular e outras sinais como toros palatino e mandibular e sinais de fraturas ou cirurgias e exodontias realizadas.

ÚNICOS

Se as digitais foram perdidas, os maxilares e os dentes podem identificar a pessoa, mas se a cabeça ou parte dela não foram localizadas, o terceiro item que identificará a pessoa será o DNA presente em todas as células, exceto nas hemácias. No DNA, estão os 25 mil genes que são as informações que levaram à formação daquele corpo. Eles foram escolhidos da mistura de 50 mil genes do óvulo e do espermatozoide, em combinação única para cada pessoa, mas que se assemelha entres parentes e persiste mesmo após a morte das células.

A tríade usada na identificação de pessoas nos sugere que olhemos ao nosso redor e digamos: eu e todos os que me cercam somos únicos e especiais! Talvez até estejamos catalogados em algum lugar. Não se esqueça, tal qual as digitais das mãos que te acariciam e o DNA lhe dado no momento sublime do amor, a boca que tu beijas, também é única neste mundo de Deus!

Alberto Consolaro é professor titular da USP - Bauru. Escreve todos os sábados no JC. 

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