Femenagem é o termo utilizado no movimento feminista para demonstrar o reconhecimento a um ato ou trabalho desenvolvido por uma mulher. E quantos atos e trabalhos foram empreendidos por Marizabel em prol das mulheres! Marizabel Moreno Ghirardello deixou um legado de luta pelos direitos das mulheres. Mulher ativa, apesar das limitações que a saúde lhe impunha.
Disposta a trabalhar pela igualdade de gênero em todas as facetas em que a desigualdade se transfigura em nossa sociedade. Mas não só. Aliava a busca pelo conhecimento à capacitação constante.
Através da visita in loco de locais de atendimento humanizado às mulheres, engajamento em campanhas voltadas às questões de gênero, trabalho em favor de políticas públicas que reposicionassem a mulher na condição de sujeito de direitos, mobilizou inúmeros setores, públicos e privados, em nossa cidade.
Em reuniões intersetoriais de trabalho estava sempre atenta para ir além, como a perguntar "o que mais posso fazer"? Nesse compasso, trocamos experiências, ideias, informações, materiais de leitura e, principalmente, alento para continuar um árduo labor.
À frente do Conselho Municipal de Políticas para as Mulheres, Marizabel não mediu esforços para postular medidas para o enfrentamento à violência de gênero, doméstica e familiar contra as mulheres.
Para tanto, liderou a campanha de assinaturas para a implantação de atendimento contínuo da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM 24 horas).
Em data recente, visitou o Espaço Ruth Cardoso, da Secretaria Municipal da Mulher de Barueri, referência de atendimento à mulher no Estado de São Paulo, levando com ela outras tantas mulheres aguerridas e dispostas a conquistar aperfeiçoamento nos serviços em nossa cidade.
Nos cursos com temática de gênero na OAB esteve sempre presente, puxando a fila das perguntas mais desafiadoras de modo a insculpir a temática à prática.
Com sua atuação discreta, mas firme, figurou como peça principal na concretização da Oficina de Estudos realizada na Unesp/Bauru em novembro de 2019. Nessa oficina estiveram presentes, aproximadamente, 120 pessoas que trabalham direta ou indiretamente com a questão da violência de gênero.
Tratou-se de evento de grande magnitude, quiçá pioneiro em reunir toda a rede de prevenção e enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher com a participação da universidade.
Em um dia de imersão, nove grupos mistos trouxeram suas apreensões e dificuldades no desenvolvimento do trabalho com as mulheres em situação de violência. Dos grupos, afora a capacitação recíproca entre os mais variados setores, afloraram sugestões para sanar problemas e aperfeiçoar o atendimento às mulheres.
Preocupada com as notícias de dificuldade de acesso das mulheres para denunciar a violência aos órgãos oficiais durante a pandemia da Covid-19, transformou-se em entrevistadora no Instagram do Conselho Municipal de Política para as Mulheres e procurou compreender todas as nuances que poderiam explicar a subnotificação dos casos de violência doméstica e familiar, que exsurgiram no tórrido cenário de março de 2019 em diante.
Porque circulava com desenvoltura, ética e humildade em todos os meios, sempre encontrava portas abertas para empreender um novo desafio. Foi assim que solicitou uma pesquisa sobre a situação da violência doméstica em Bauru frente à pandemia da Covid-19 às professoras do Departamento de Comunicação da Unesp, as quais, sensíveis à problemática, desenvolveram-na como projeto de extensão.
Não arrefeceu nem mesmo quando acometida pelo vírus. Tão logo recuperou-se, atraiu para o Conselho uma nova bandeira de luta, a Campanha do Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica. Por seu intermédio, lá foram as bravas membras do Conselho Municipal contribuir para a adesão e sensibilização junto às farmácias de Bauru, a fim de que a campanha obtivesse a capilarização necessária a atingir todas as mulheres que encontrassem alguma dificuldade em obter ajuda junto aos órgãos oficiais.
Falar da Marizabel também é lembrar de um modelo de sororidade. Mulheres trabalham juntas, apoiando-se mutuamente, especialmente quando atuam por uma causa maior, que refoge a interesses individuais. É lembrar que conquistamos direitos porque outras mulheres enfrentaram inúmeros percalços e desafios antes de nós.
Somos um momento na história de subjugação das mulheres. Mulheres ainda hoje são desprezadas, humilhadas, violentadas e mortas pelo simples fato de serem mulheres.
Na sua finitude, esse momento há que ser preenchido com o desapego de vaidades e diferenças, para fortalecer uma luta que não acabará na nossa breve existência.
Gratidão, Marizabel, vamos manter sua chama acesa!
A autora é juíza de Direito - Coordenadora do Anexo da Violência Doméstica e Familiar de Bauru.