Com a cara e a coragem, o bauruense Juliano Dip Lencioni, 37 anos, foi conquistando cada objetivo da carreira. Tanto que o comunicador, com um humor contagiante, se define como "um verdadeiro cara de pau", no bom sentido da palavra. Ele, que é jornalista e ator, funde as duas funções em prol de informar: atua na arte do jornalismo. Há seis anos, é repórter do Jornal da Band e apresenta um programa diário na Band News. Também fez reportagens para o extinto e famoso Custe o Que Custar (CQC), da mesma emissora, e teve passagens pela CBN, em São Paulo, e Rádio Vaticano, na Itália. E muito desse trajeto foi trilhado graças à experiência de quatro anos na 96FM, em Bauru, a primeira "escola prática" de jornalismo.
Boa parte do atrevimento e descontração vieram do teatro. Foram dois cursos quando criança e mais quatro anos de Teatro Veritas, dos alunos de artes cênicas do Unisagrado. Esta vaga, aliás, surgiu depois de muito pedir e perseverar. Prova disso é que ele era o único ator de outra graduação. Assim como no jornalismo, a carreira nos palcos floresceu e, hoje, ele coleciona ao menos 12 peças no currículo. "Me ajudou a trabalhar diferentes linguagens, trouxe informalidade e autenticidade para a locução".
Além da militância nas redes sociais, no Dia Internacional do orgulho LGBTQIA do ano passado, ao vivo na Band News, vestiu uma máscara de arco-íris e falou pela primeira vez no ar que tinha orgulho em ser homossexual. "Teve muita repercussão e, até hoje, me pergunto porque demorei tanto para fazer isso. A sociedade é muito careta", define.
Quando pode, vem a Bauru passar os finais de semana na companhia do pai Beethoven Lencioni, 68 anos, da mãe Eliane Dip Lencioni, 67 anos, do irmão Túlio Dip Lencioni, 32 anos, e de amigos. "Gosto dos reencontros. E, claro, da comida da minha mãe". Confira, a seguir os principais, trechos da entrevista concedida ao JC:
Jornal da Cidade - Sua primeira experiência no jornalismo foi na 96FM. Como foi?
Juliano Dip - Foi um divisor de águas, balizou muito a carreira, porque passei boa parte dela no rádio. Entrei como estagiário, fui contratado enquanto ainda cursava Jornalismo na USC (Unisagrado hoje). Na rádio, editei, produzi, apresentei... fiz tudo com uma equipe experiente. Aprendi muito. Nesse período, Bauru teve prefeito preso, cassado. Eu cobri coisas que muita gente não cobre em 20 anos de carreira.
JC - Da 96FM você foi parar na Itália, na Rádio Vaticano. Como isso aconteceu?
Juliano Dip - Eu queria tentar a vida em São Paulo, mas precisava aprimorar meu currículo. Nessa época, consegui contato por e-mail com o porta-voz do Papa Bento XVI. Me chamaram para fazer estágio. Depois, fui contratado. Aprendi muito, porque eram 40 idiomas diferentes nas redações. Convivia com chinês, indiano, japonês, russo e todos os países latinos. Foi uma troca muito grande. Depois de um ano na Itália, achei que era hora de voltar. Entreguei currículos e virei repórter do SBT, no retorno do Aqui Agora, em 2008. Trabalhei na madrugada paulistana e fiz coberturas intensas. O programa acabou, voltei a entregar currículos e consegui uma vaga na CBN.
JC - E como foi voltar para o rádio?
Juliano Dip - Fiquei feliz porque, em Bauru, uma das primeiras funções na 96FM era ouvir o Repórter CBN, das 5h30. Poucos anos depois, estava lá, trabalhando com pessoas como Heródoto Barbeiro. Foram sete anos de história. Fui mostrando serviço, entrei para a reportagem e, depois, ancoragem... minha experiência foi lá para cima. Passei a entrevistar políticos, presidente, governador, deputados, meu leque profissional foi aumentando, assim como minha linguagem. Amadureci.
JC - Em todos esses anos, você manteve, ao mesmo tempo, a carreira de ator. Quanto os palcos contribuíram com o jornalismo?
Juliano Dip - Me trouxe informalidade para a locução, autenticidade. Eu não sou um jornalista que fez sucesso por grandes furos, eu fiz sucesso por causa do meu jeito de trabalhar. É uma coisa de linguagem. Eu sempre fui muito descontraído, porque eu era desconstruído graças ao teatro. Ele tira de gente o medo do ridículo. E o jornalista normalmente é muito sério. Dá para você não ser tão sério sem perder o compromisso com o profissionalismo. O CQC é a prova disso.
JC - Por falar em CQC, essa foi uma experiência bastante singular. Como conseguiu a vaga?
Juliano Dip - Na época, o Dan Stulbach tinha começado a apresentar. Encontrei com ele no corredor da CBN, mandei um e-mail com meu material. Fiz um teste entrevistando deputados na Assembleia Legislativa. Um mês depois, estava contratado para fazer o quadro Proteste Já. Como sou ator, fiz coisas muito malucas, paguei muito mico. Mas, com o tempo, fiz reportagens muito importantes, como a do rompimento da barragem de Mariana (MG), em 2015. Quando o programa acabou, a emissora me chamou para o Jornal da Band, onde estou até hoje. E também tenho programa diário na Band News. Aqui, consegui fazer grandes coberturas, estar no lugar onde as coisas acontecem. E também trabalhei com grandes profissionais, como o Ricardo Boechat.
JC - E foi na Band News que você protagonizou um episódio no Dia do Orgulho LGBTQIA do ano passado que chamou atenção...
Juliano Dip - Eu vesti a máscara do arco-íris ao vivo e falei que tinha orgulho de ser LGBT. Foi muita repercussão e, até hoje, me pergunto porque demorei tanto para fazer isso. De alguma forma, a sociedade é muito careta, o jornalismo também. Eu já era gay assumido, mas tinha medo de misturar isso com a profissão. Mas, a Band me abriu os braços de uma forma muito grande, só abriu portas pra mim. Demorei para fazer isso porque, infelizmente, é um tabu, porém, deve ser tratado como algo natural da vida.