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O objeto mais triste do mundo é o caixão de criança

Vitor Oshiro
| Tempo de leitura: 2 min

Não tenho dúvida. Posso afirmar com a mais absoluta certeza e sem medo de errar: o objeto mais triste do mundo é o caixão de criança. Como pode caber uma tristeza tão gigante em algo tão pequenino?

Talvez seja porque simbolize uma ruptura brutal e irracional com todo o ciclo natural da vida. Interrompe sonhos que ainda não foram sonhados de uma forma tão precoce e deixa todos aqui sem explicações.

Até mesmo a palavra não faz sentido. "Caixão". Fica evidente que o vocábulo aumentativo foi criado só para pessoas de mais idade. Duvido que o criador do termo pensou em utilizar um dia a variação "caixãozinho". Não! Simplesmente porque não faz sentido uma criança morrer.

Nesta semana, uma bebê de Bauru de apenas 23 dias morreu. Segundo a família, a pequena Piettra lutou bravamente contra esse maldito coronavírus. "A dor da perda de um filho é a pior dor que existe", disse a mãe. Foi impossível não lembrar do Miguel, filho dos meus primos Natália e Edgar. Ele nasceu prematuro e ficou poucas horas por aqui. Foi na despedida dele que vi, pela primeira vez, o objeto mais triste do mundo.

Lembro que, na época, escrevi sobre o Céu das Crianças. Trata-se de um lugarzinho lá em cima reservado só para elas, onde gente de mais idade não entra. Em meio às nuvens de algodão-doce, é uma correria danada. O som que mais se ouve é aquela risada gostosa da molecada.

Toda essa algazarra é, vez ou outra, interrompida por um tico de saudade. Saudade daqueles que ficaram. Apesar do pouco tempo de convivência por aqui, os pequenos sabem o quanto foram - e ainda são - amados neste plano.

Então, os guris "desrespeitam as regras" (coisa de criança, né?) e tentam mandar um "oi". São nesses momentos que os pais acabam, do nada, se lembrando dos pimpolhos no meio do trabalho, entre uma garfada e outra no almoço ou mesmo em sonho. "Oi, estou bem! Fique bem por aí também!".

É isso. Apesar do objeto mais triste do mundo, as crianças que partiram não querem nossa tristeza por aqui. Assim, não rezo por elas. Eu apenas peço. Peço para nos ajudem a aceitar o que, por vezes, parece inaceitável. Podem voltar a brincar à vontade por aí, Miguel e Piettra...

O autor é editor do JC, jornalista da TV USP Bauru e especialista em Linguagem, Cultura e Mídia.

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