INVESTIGAÇÃO

Afastado nesta quarta, policial é acusado de colaborar com hacker

Por Guilherme Renan | da Redação
| Tempo de leitura: 4 min
Guilherme Renan
Inquérito aponta que agente teria repassado informações sigilosas a hacker, que extorquiu investigado e autoridades
Inquérito aponta que agente teria repassado informações sigilosas a hacker, que extorquiu investigado e autoridades

A 10ª Corregedoria Auxiliar da Polícia Civil de Araçatuba, em conjunto com o Ministério Público, investiga um suposto esquema de vazamento de dados sigilosos que envolve um policial civil e o hacker Patrick César da Silva Brito, principal suspeito por diversos crimes de extorsão, invasão de dispositivos e fraudes eletrônicas.

Segundo o inquérito, o agente teria repassado informações obtidas em operações policiais ao hacker, que, por sua vez, as utilizou para extorquir vítimas, entre elas alvos da Operação Raio-X, que apura desvios de verbas da saúde.

O esquema

De acordo com o que foi apurado pela reportagem, documentos da Corregedoria da Polícia Civil e manifestação do Ministério Público, Patrick Brito, então foragido e residindo na Sérvia, invadiu, em setembro de 2021, contas digitais de um médico, investigado na Operação Raio-X, e deu início a uma série de chantagens. Ele teria exigido pagamentos em criptomoedas sob ameaça de divulgar informações sigilosas e imagens privadas do médico e seus familiares.

A investigação aponta que essas imagens foram extraídas do celular do médico, apreendido pela Polícia Civil. As fotos teriam sido capturadas em uma sala restrita da unidade SECCOLD da DEIC de Araçatuba, em julho de 2021. Na ocasião, apenas o policial acusado e um outro estavam no local. Pouco tempo depois, as imagens foram enviadas a Patrick via WhatsApp, já na Sérvia.

Além da invasão das contas do médico (como Facebook, e-mails e contas telefônicas), Patrick também teria tentado aplicar fraudes bancárias com documentos da vítima, inclusive criando perfis falsos em plataformas como Nubank e PayPal.

Envolvimento do policial

Conforme apurou a reportagem, ainda de acordo com a corregedoria, o policial é suspeito de ter fornecido diretamente ao hacker as imagens e dados sigilosos, violando o dever funcional de sigilo. Ele teve acesso ao celular do médico no momento da extração de dados com o software Cellebrite, o que teria possibilitado o vazamento do conteúdo.

Mensagens encontradas no celular da mãe de Patrick, incluem registros de conversas com o policial, supostamente apagadas automaticamente por meio de recurso de temporização — mecanismo usado para dificultar o rastreamento. A apuração ainda indica que o policial teria compartilhado informações sobre outros investigados, cujos dispositivos também foram apreendidos em operações anteriores.

Outras vítimas

Além do médico, Patrick Brito é investigado em outros inquéritos na região de Araçatuba. Ele é acusado de extorquir o ex-prefeito Dilador Borges Damasceno e sua esposa, além de ameaçar delegados e peritos ligados à Operação Raio-X. Diversos agentes da DEIC receberam mensagens ofensivas e ameaçadoras enviadas pelo hacker.

Patrick chegou a ser preso na Sérvia, onde permaneceu detido por cerca de um ano. Atualmente, responde em liberdade sob condições estabelecidas pela Justiça. Um mandado de prisão preventiva com difusão vermelha da Interpol foi expedido pelo Judiciário brasileiro.

Medidas adotadas

Diante da gravidade dos fatos, a Corregedoria solicitou o afastamento preventivo do policial, além do compartilhamento das provas com o Ministério Público e o Judiciário. A investigação tramita sob sigilo, conforme autorizado pela 1ª Vara Criminal de Araçatuba. A expectativa é de que os envolvidos sejam formalmente denunciados por crimes como extorsão, invasão de dispositivo informático, falsidade ideológica, fraude eletrônica e vazamento de dados sigilosos.

As autoridades reforçam que os crimes investigados comprometem não apenas as vítimas, mas também a integridade das instituições públicas e o sigilo de investigações de alto impacto como a Raio-X.

Versão da defesa

Em nota enviada à reportagem, o advogado Dr. Daniel Madeira, que representa o policial, manifestou surpresa com a decisão de afastamento preventivo de seu cliente. Leia a nota, na íntegra:

“A defesa do policial vem a público manifestar total surpresa com a decisão de afastamento preventivo, primeiramente em razão do lapso temporal de quase cinco anos dos fatos ora apurados, sem que houvesse qualquer apontamento de fato novo que justificasse tal medida, e sequer houve prejuízo no trabalho prestado até então. Em segundo lugar, pela total colaboração do policial, que constituiu advogado, sempre colaborou com a Justiça e se apresentou em todos os atos processuais, não promovendo qualquer tumulto à ordem processual, pública ou ao próprio ente público.

Foram concluídas as oitivas de testemunhas e a produção das provas periciais, logo, não há qualquer prejuízo para o andamento da investigação. Por fim, o policial considera a medida estranha por ter sido tomada pouco tempo após seu interrogatório, no qual apresentou diversas denúncias envolvendo autoridades policiais e agentes da Polícia Civil de Araçatuba com o hacker residente na Sérvia.

Não houve, até o momento, qualquer resposta quanto à apuração dessas denúncias. Assim, com o devido respeito à decisão, a defesa manifesta sua discordância dos fundamentos adotados e informa que tomará as medidas judiciais cabíveis.

A defesa também apela ao público para que não se profira qualquer juízo de valor antecipado, de modo a respeitar o contraditório, a ampla defesa e o princípio da presunção de inocência, elemento constitucional que, segundo a nota, está sendo desrespeitado.

Informa ainda que, após a publicação da decisão, a administração local da Polícia Civil ordenou equivocadamente que o policial entregasse suas armas, distintivo e colete providência que, segundo a defesa, não constava do termo de afastamento. Após apuração, foi reconhecido que não havia ordem para tal, sendo determinada a devolução dos itens”.

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