Mal se relacionam as pessoas! O primitivo drama trágico entre Caim e Abel ilustra bem a urgência de aprender como lidar de maneira equilibrada e saudável com o outro. Na perspicaz leitura bíblica, a mais grave consequência da presuntuosa desobediência de Adão e Eva foi o surgimento da rivalidade entre pessoas, inclusive entre parentes.
Desligadas de Deus, as pessoas perdem referências e inspiração. Alastram-se os desajustamentos, realidade constatável em todos os setores de convívio humano. A redenção da humanidade passa necessária e previsivelmente pela purificação e dignificação das formas de relacionamento entre as pessoas. Em sua missão redentora, Jesus Cristo entregou-se integralmente ao trabalho de curar, restaurar e redimir o relacionamento entre as pessoas.
O único mandamento, ou seja, a principal orientação enfaticamente deixada por Jesus, o amor incondicional ao próximo, já ilustra a grande verdade. Insistindo em relacionamentos universais respeitosos, como norma suprema, Jesus ataca o mal original pela raiz! Com o objetivo de não deixar espaço para leituras enviesadas e interpretações oportunistas, Cristo se coloca como modelo primeiro e referência inconfundível na observação do mandamento do amor fraterno.
É para amar como Ele ama, sem excluir ninguém, nem mesmo adversários. Não há espaço para paráfrases. Não cabem emendas para justificar exceções. A proposta é clara e desafiadora: o discípulo é chamado a reproduzir em seus relacionamentos o jeito de amar adotado pelo Mestre. O cristianismo, em sua essência, subleva e dignifica o relacionamento humano.
Emerge, curiosamente, uma das principais razões a explicar o difuso distanciamento religioso. É com lamentável frequência que se ouve fiéis praticantes contestando as ordenações do Mestre Jesus! Mesmo tendo conhecimento do seu claro ensinamento, frequentadores de sacramentos e de cultos resistem amar incondicionalmente seu próximo, recusam perdoar inimigos, se negam a fazer o bem a desafetos!
Selecionam quem merece ser tratado como próximo. Como se possível fosse crer na Palavra, que é Cristo vivo, e comungar o Cristo eucarístico, sem revestir-se dos mesmos sentimentos de Mestre de Nazaré. Com dolorosa propriedade, Jesus compara esses desnorteados discípulos a hipócritas, atores que fingem ser o que, na realidade, não são.
Na escola dos fariseus, os rabis escolhiam a quem tratar como próximo. Na escola do Rabi, a lição é fazer-se próximo, sempre e com todos. O atual turbulento convívio entre pessoas e nações demanda com urgência que os cristãos parem de representar. Liturgias e cultos não podem ser reduzidos a teatros. Não fica bem a ministros e fiéis celebrarem mascarados. Urge encarnar a liturgia que se celebra. Urge depurar relacionamentos. Urge, enfim, investir na genuína cultura da aproximação. O cristianismo é, afinal, a religião por excelência do trato respeitoso!
Padre Charles Borg é vigário-geral da Diocese de Araçatuba
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