OPINIÃO

Qual o preço da mentira?

Por Ayne Regina Gonçalves Salviano | especial para a Folha da Região
| Tempo de leitura: 3 min

Por que grande parte dos humanos prefere acreditar em mentiras e viver suas vidas baseados nela? O historiador, filósofo, professor universitário e escritor israelense Yuval Noah Harari, considerado uma das mentes mais brilhantes do século 21, lista três razões para esse comportamento: a verdade é cara e, por vezes, complexa e dolorosa.

Para quem não o conhece, Harari é famoso por seus livros que exploram a história da humanidade, a evolução da sociedade e a relação entre humanos, tecnologia e meio ambiente.

Entre seus trabalhos estão “Sapiens: Uma Breve História da Humanidade”, que narra a história da humanidade desde o Homo sapiens até os dias atuais; “21 Lições para o Século 21”, que oferece refl exões sobre os desafi os e oportunidades desse tempo; e “Homo Deus: Uma Breve História do Amanhã”, que explora as implicações da inteligência artifi cial, da biotecnologia e da superinteligência na sociedade humana.

Os livros de Harari foram traduzidos para mais de 50 idiomas e venderam milhões de cópias em todo o mundo. Ele é reconhecido por sua abordagem interdisciplinar, que combina história, filosofia, ciência e tecnologia para entender a condição humana e o futuro da humanidade.

De acordo com Harari, as pessoas escolhem a mentira primeiramente porque a verdade é cara enquanto a mentira é barata. Quem deseja produzir um relato verdadeiro, precisa investir esforço, tempo e dinheiro em análises e pesquisas. A mentira, por sua vez, só precisa ser inventada.

Um exemplo é o jornalismo investigativo. Sabe-se que não basta “ouvir os dois lados” para chegar na verdade. A regra é clara: quanto mais pessoas ouvidas, mais próximo da verdade se chega.

Assim, apurar matérias complexas exige, das empresas de comunicação, uma quantia elevada para pagamento dos profissionais, deslocamentos, acomodações, alimentação, transportes. E quanto mais tempo a apuração durar, mais dinheiro é consumido. Daí o festival de notícias mal apuradas diariamente que levam à desinformação da população.

É o mesmo raciocínio para apurações policiais complexas. Não são raras as notícias de operações que duraram meses apenas internamente, no setor de inteligência das polícias. Bancar essas investigações é oneroso, entretanto é, também, o único caminho para que a melhor justiça seja feita.

No entanto, quando uma sociedade escolhe viver na mentira, trabalhos sérios como os de jornalistas profissionais ou policiais honestos começam a perder o valor e as pessoas passam a acreditar na mentira barata escrita porque qualquer um, viralizada nos grupos de mensagens e nas redes sociais.

O segundo motivo é que a verdade é complicada enquanto a ficção pode ser tão simples. Harari compara com o caso de John Snow, médico inglês considerado um dos pais da epidemiologia moderna, conhecido por sua investigação sobre a fonte de uma epidemia de cólera em Londres, em 1854.

Snow quis investigar as causas da cólera. Ele tinha que explicar todo o processo da pandemia, que envolvia um pequeno micróbio no esgoto que entrava na água potável e depois no corpo das pessoas. Muito complicado para pessoas simples. É muito mais fácil acreditar que bruxas ou demônios lançam feitiços e castigos sobre os humanos, histórias simples assim disseminadas por lideranças, inclusive religiosas.

Por fim, ainda de acordo com Harari, as pessoas preferem a mentira porque a verdade tende a ser dolorosa. A verdade sobre nós, seja pessoal ou coletiva, pode ser desagradável enquanto a ficção pode ser atraente. A pergunta é: qual preço a humanidade pagará por desprezar a verdade dos fatos e continuar preferindo as mentiras?

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