Opinião

Equívocos do Setembro Amarelo


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Não adianta nada você ser um pai/mãe tóxicos e, em setembro, se mostrar preocupado com a saúde mental do seu filho ou filha.
Não adianta você ser um patrão abusivo, que não respeita as leis trabalhistas, é intimidador, violento, obrigando extensas jornadas com metas impossíveis de serem atingidas e, em setembro, pendurar um laço amarelo na roupa de cada funcionário para fazer marketing. 
Não adianta nada você ser um político que não busca diminuir as desigualdades sociais nem apoia os profissionais da Saúde, mas em setembro faz discurso preocupado com os altos índices de suicídio da população. 
Os números do autoextermínio são alarmantes e merecem muita atenção. De acordo com a OMS - Organização Mundial da Saúde, aproximadamente 800 mil pessoas cometem suicídio por ano no mundo, ou seja, uma pessoa se mata a cada 40 segundos. 
No Brasil, dados da Abramede – Associação Brasileira de Medicina de Emergência apontam que cerca de 14 mil pessoas praticam o autocídio por ano no país e mais de 30 brasileiros são internados, por dia, por tentativa de tirar a própria vida.
Por causa dessa triste realidade, o Setembro Amarelo deveria ser um momento especial de estudos, divulgação de conhecimento e de prevenção, que se estenderia pelo ano todo. Entretanto, para muitos brasileiros, essa campanha é só uma falácia ou serve apenas de mote para ações de publicidade.
De acordo com especialistas, não há uma preocupação genuína em prevenir o suicídio. Nada mais preocupante do que isso, transformar um mês de conscientização em um período de desinformação. 
Pelo menos, foi isso que apontou o V Congresso Brasileiro de Prevenção do Suicídio, ocorrido no mês passado em Brasília. Pelo uso inadequado da data, o Setembro Amarelo está se tornando um período de propagação de dados incorretos que só prejudicam a causa.
Entre as informações erradas está a de que 90% dos casos de autocídio são decorrentes de transtornos mentais. Não são. O suicídio é resultado de um intenso sofrimento que, segundo a OMS, tem múltiplos fatores, como os problemas de saúde mental, mas também a depressão ou o abuso de álcool ou outras drogas. 
Muitas dessas mortes ocorrem em momentos de crise, como o fim de um relacionamento, problemas financeiros, dor crônica ou algum tipo de doença. Da mesma forma, outras situações podem levar ao suicídio, como conflitos, desastres, violência, perdas afetivas ou sensação de isolamento. 
As maiores taxas desse tipo de morte estão entre alguns grupos que enfrentam discriminação, como refugiados, migrantes, indígenas, homossexuais e transgêneros. 
Outro equívoco é pensar que 9 em cada 10 suicídios poderiam ser evitados. Essa é uma concepção muito reducionista, de acordo com os estudiosos. Dessa forma, bastaria um tratamento médico para resolver o problema, mas sabe-se que não é isto. Pessoas medicadas cometem suicídio e a prevenção está muito longe de fazer uma previsão ou ter o poder de impedir o ato. 
Outro problema gerado nas campanhas não embasadas do Setembro Amarelo é fazer as pessoas acreditarem que se elas ficarem atentas aos sinais, os suicídios podem ser evitados. Contudo, nem todos os sinais são visíveis. E mesmo uma pessoa dando sinais, ela pode encerrar a própria vida.   
Usar frases moralistas do tipo “Valorize sua vida” ou “Sua vida tem jeito” é outra forma equivocada de tratar o problema. Para os especialistas, isso reduz o cuidado com a saúde mental a um empreendimento individual e a uma questão meramente motivacional.
Outro erro é acreditar que a prevenção ao suicídio é assunto técnico e não envolve política. Envolve sim. Diz respeito a defesa de um determinado modelo de vida e de saúde. Não existe prevenção ao suicídio com desigualdade social e sem defesa dos direitos humanos.
Quer ajudar na prevenção ao suicídio no Setembro Amarelo e em todos os outros meses do ano? Busque conhecimento e só divulgue informações de pessoas e entidades com experiência no assunto.

Ayne Regina Gonçalves Salviano é jornalista, especialista em Metodologia Didática, mestre em Comunicação e Semiótica, com MBA Internacional em Gestão.

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