CRÔNICA

Poda Pecadora

Especial para a Folha da Região
| Tempo de leitura: 3 min
Arquivo Pessoal

Foi destaque na capa desta FR, na edição de domingo (21/07/24), e, com riqueza de detalhes, na matéria interna assinada pela repórter Maryla Buzati: “Igreja Paraíso corta árvores do entorno e gera polêmica nas redes”. Deu para entender o título da reportagem, mas, na verdade, não foi propriamente a igreja que “cortou” as saudosas árvores. A ação ocorreu por iniciativa do Padre Rodney Mendes, pároco da Paróquia Imaculado Coração de Maria, conhecida carinhosamente pelos moradores do local como Igreja Paraiso, por se situar no bairro do mesmo nome. O corte – não foi poda – foi pedido sob a justificativa de que fiéis idosos e frequentadores daquela igreja estariam “tropeçando nas raízes e às vezes caindo”(sic).

Com o requerimento, dirigido à SMMAS – Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Sustentabilidade, foi “acostado” (ôpa!) um Laudo de Caracterização de Vegetação para a supressão de 18 frondosas e saudáveis árvores de várias espécies – uma delas nativa. Por nativa entenda-se espécime que já habitava essas plagas (aargh) antes até dos originários Kaingangs. Entre outros “argumentos”, o pedido destacou a existência de uma praça e um parque nas redondezas para compensar...

Dita “supressão” não passa, porém, de eufemismo para matança indiscriminada daquele conjunto arbóreo, que formava um “túnel verde” no entorno da igreja e a protegia do calor africano que, em pleno verão, sempre assola a cidade. O pedido rapidamente foi deferido e cumprido pela Municipalidade. Claro que existia e existem alternativas urbanas mais simples e eficazes à supressão como, por exemplo, o alargamento da calçada do entorno da igreja e substituição inteligente da sinalização pública. Demais problemas técnicos que fossem resolvidos tecnicamente.

Incrível imaginar que ninguém se manifestou a tempo de impedir o corte radical que matou árvores plenas de saúde e exuberância. Os fiéis, enquanto rezavam, não perceberam a chegada de caminhões, serras elétricas e mutirão de funcionários que “cumpriam ordens”. Os vizinhos estavam ocupados com outros afazeres e não deram importância ao evento. Os passantes passavam, olhavam, sequer se indignavam e seguiam adiante. Nem para o Bispo alguém reclamou... Só a ONG Clube da Árvore, quando tomou conhecimento, foi prontamente à luta. Mas a batalha já estava perdida.

O caso lembra o poema atribuído a Vladimir Maiakóvski, que, na verdade, é de autoria do brasileiríssimo Eduardo Alves da Costa, intitulado, aí sim, de “No Caminho com Maiakóvski”, por ele feito nos anos de chumbo de 1970. Logo de cara o poeta solta o verbo anunciando o que viria pela frente: “Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada.” E por aí vai, até o evidente fim causado pela ausência! A citação pode ser lugar comum, eu sei. Mas, fazer o que?

Para quem não conhece e tiver curiosidade de ler ou reler o significativo poema, basta abrir o link http://www.pensador.com/autor e, em seguida digitar o nome do poeta e o título do poema. De preferência, comprar o livro! Eduardo, nascido em Niterói/RJ, em 1936, além de poeta, foi jornalista e fez Direito na... Universidade Mackenzie. Tem 88 anos e está firme na poesia. Nunca imaginou que seu famoso poema seria associado à pecadora matança de árvores na distante Araçatuba. 

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