ARTIGO

Das famílias de margarina para as famílias tóxicas

29/08/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Nos anos 1980-1990, as propagandas de margarina costumavam mostrar o café da manhã de famílias consideradas perfeitas, todos lindos, saudáveis e sorridentes já nas primeiras horas do dia. Tanto que a expressão “família de propaganda de margarina” entrou no imaginário popular do brasileiro associada à ideia de felicidade plena.

Não faz muito tempo, essa imagem definitivamente ruiu. E as entrevistas recentes da atriz Larissa Manoela ao programa “Fantástico”, da Rede Globo, só escancararam ainda mais uma dura realidade: se há famílias felizes também há famílias tóxicas, aquelas que fazem mal, que fazem sofrer.

Para quem ainda não sabe, Larissa Manoela rompeu publicamente com os pais porque afirma estar sendo enganada, financeiramente, por eles, que cuidaram da sua carreira desde o início, quando ela era uma criança. Atualmente ela tem 22 anos.

Sem entrar no mérito dos diversos interesses que envolvem esse caso, o que a atriz fez acabou servindo de gatilho para a exposição de muitos outros casos de família - fora do padrão “propaganda de margarina” - que poderiam, isso sim, estar em programa televisivo sensacionalista de nome homônimo.

De acordo com dados da Ouvidora Nacional de Direitos Humanos, analisados em estudo produzido pelo comitê científico do Núcleo Ciência pela Infância (NCPI) e divulgados no final de maio desse ano, o Brasil registra 673 casos por dia de violência contra crianças de até 6 anos. Quase 85% dessas agressões são de pais, padrastos, madrastas ou avós, vide casos como os de Isabella Nardoni e o menino Henry.

Segundo o Ministério da Saúde, familiares são responsáveis por quase 70% dos casos de violência sexual contra crianças de 0 a 9 anos no Brasil. Entre as vítimas de 10 a 19 anos, os crimes são cometidos por pessoas próximas em quase 60% dos casos. Claro que esses números estão subnotificados porque a pior realidade é que a família tradicional brasileira acoberta o abusador, o violentador, o estuprador e não o entrega para a Justiça.

As estatísticas, por si só, já bastariam para mostrar que a maioria das famílias vivem em um ambiente de terror. Mas ainda é necessário contabilizar outros tipos de violência a que crianças e jovens estão expostos diariamente: bullying, agressão verbal, ameaças e até apoderamento de dinheiro de forma indevida pelos adultos.

Claro que não há apenas pais tóxicos. Também há filhos manipuladores, agressivos, que extorquem, furtam e roubam dinheiro dos pais; batem, espancam e matam – ou mandam matar – os genitores e irmãos.

Em um grupo específico, os idosos, o Ministério dos Direitos Humanos contabilizou mais de 33 mil denúncias de abusos e agressões, a grande maioria feita por membros da família. O Fundo de População das Nações Unidas já se manifestou pela urgência de proteger os cidadãos com mais de 60 anos no Brasil.

O que todos esses números comprovam é que a família tradicional brasileira está doente. Precisa de tratamento. E a cura pode vir pelas mãos da Justiça e seus vários braços: de assistência social, com auxílio de psicólogos, mas especialmente pela aplicação rápida das leis com punição exemplar para aqueles que não entenderem que o papel da família “é garantir a saúde, a segurança, a educação e o bem-estar geral dos indivíduos ensinando-lhes valores e comportamentos sociais apropriados”, de acordo com documento do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Ayne Regina Gonçalves Salviano é jornalista, mestre em Comunicação e Semiótica.

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