ARTIGO

Positividade tóxica

Por Ayne Salviano | 18/07/2023 | Tempo de leitura: 2 min

Você deve conviver com pessoas que, para todo tipo de situação difícil da vida, elas dizem as mesmas frases: “tenha pensamentos positivos, tudo vai dar certo!”. Ou então, “seja resiliente, grato, só olhe para frente, o que passou, passou.”

Pois bem, o que parecem ser bons conselhos, na verdade são exemplos de positividade tóxica. A positividade tóxica é essa ideia de que todos devem ter pensamentos positivos, em todas as situações, acima de tudo, desprezando e desvalorizando qualquer outro tipo de emoção.

Dessa forma, os sentimentos considerados “negativos” devem ser abandonados, “engolidos”, não demonstrados. Como se o fato de uma pessoa estar triste atraísse mais tristeza ou se ela estivesse indignada com alguma injustiça fosse prejudicial a ela.

Na verdade, esse positivismo em excesso, que afasta as pessoas de vivenciarem outras emoções é, sim, muito prejudicial para a saúde emocional dos indivíduos. Quem é inteligente emocionalmente e preserva a saúde mental reconhece a importância das emoções negativas que são, sim, motores de crescimento pessoal.

Negar o luto, a decepção ou a indignação, por exemplo, não permite a evolução das pessoas. Na vida real, as Polianas são tóxicas. Para quem não conhece, Poliana é o nome de uma personagem da obra de Eleanor H. Porter.

Ela é uma órfã, criada por uma tia malvada, mas que para cada ação ruim da parente, a menina, depois moça e depois mulher, encontra uma justificativa para minimizar seu sofrimento.

Claro que perdoar não é um problema. Mas o perdão deve nascer da compreensão e superação dos fatos. Não é o caso dos livros de Poliana. Neles, ela perdoa porque é “boazinha”, “resiliente”, “grata”, “gentil”. O que faz o leitor pensar que quem não se parece com Poliana é mau ou ingrato.

Ser uma pessoa grata é bom. Ser resiliente, gentil, positivo, é bom. O que não é bom é ter que ser assim o tempo todo. Porque há momentos de dor e sofrimento que precisam ser vivenciados para serem compreendidos e, depois, superados.

O grupo Paralamas do Sucesso traduziu isso na música “Ska”: “a vida não é filme, você não entendeu, ninguém foi ao seu quarto quando escureceu, sabendo o que passava no seu coração, se o que você fazia era certo ou não. E a mocinha se perdeu olhando o sol se pôr, que final romântico morrer de amor, relembrando na janela tudo que viveu, fingindo não ver os erros que cometeu.”

É isso, não dá para fingir os erros que cometemos ou aqueles que os outros cometem conosco e nos deixam tristes. Não dá para fingir felicidade plena “instagramável”. Se a vida é dor e sofrimento com alguns momentos de felicidades, como ensinou o filósofo Arthur Schopenhauer, é importante conhecer todas as nossas emoções e afastar a positividade tóxica.

Ayne Regina Gonçalves Salviano é jornalista. Mestre em Comunicação e Semiótica. Gestora educacional.

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